64 - Um Pequenino Grão de Areia

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Antonio abre a porta da entrada do apartamento e Andreia, que estava sentada ao lado do sofá onde está Davi com Rosilda sentada ao seu lado. Ela se levanta rapidamente e vai ao encontro dele.

- Que bom que você chegou. Eu preciso muito falar contigo.

- Aconteceu alguma coisa com o Davi?

- Aconteceu. Ou melhor, está acontecendo. – Responde Andreia com um misto de alegria e euforia. – Eu tenho medo de que eu pudesse estar imaginando coisas, mas a Rosilda também acha que é verdade.

- Eu vi, seu Antonio. – Fala Rosilda batendo os dedos da mão direita contra o peito, emocionada.

- Vocês duas estão começando a me assustar. – Fala Antonio enquanto é puxado para o sofá por Andreia.

- Calma. Não precisa se assustar. Eu só quero que você olhe e me diga o que percebe.

- Andreia, o que foi que aconteceu? – Responde Antonio colocando a pasta no assento da cadeira da mesa de jantar e o paletó no encosto.

- Calma. Senta aqui ao lado dele. – Fala Andreia mostrando a poltrona onde estava sentada há pouco. Antonio se senta lentamente, apoiando as mãos nos braços da poltrona enquanto fica olhando para Andreia. – Agora não olha pra mim. Olha para o nosso filho.

- O que tem ele?

- Presta atenção nos olhos dele.

Antonio olha com atenção para os olhos de Davi que parecem estar fitando um ponto infinito na parede da sala.

- Estão como sempre estiveram Andreia.

- Calma. Fica prestando atenção.

Antonio volta a se fixar nos olhos do filho que continua imóvel, sem ao menos piscar.

- Um pequenino grão de areia, que era um pobre sonhador... – Andreia começa a cantar.

- Eu não acredito que você fez isso comigo. Você sabe que não consigo mais escutar essa música. - Antonio se vira pra Andreia e fala, já se levantando da poltrona.

- Calma seu Antonio. – Fala Rosilda, aflita.

- Confia em mim. – Diz Andreia. - Fica mais um pouco e presta atenção nos olhos do Davi.

- Eu não consigo ouvir essa música. Era a música que eu cantava pra ele.

- Eu sei. Por isso que eu preciso que você preste atenção. Por favor!

Antonio volta a se sentar lentamente na poltrona, afrouxa um pouco a gravata, abre o colarinho, respira fundo e volta a fixar sua atenção nos olhos de Davi.

- Olhando o céu viu uma estrela... – Segue Andreia cantando. – E imaginou coisas de amor...

Subitamente os olhos de Davi piscam e olham em direção à Andreia. Antonio vira o rosto, como se para confirmar para onde Davi estava olhando.

- Você viu? Você viu? – Pergunta Andreia aflita.

- Vi. – Reponde Antonio intrigado. – Mas pode ter sido somente um reflexo sem nenhuma relação com a música. – Responde Antonio.

- Não é um reflexo involuntário, Antonio. Eu já repeti uma cinco vezes. Nosso filho está voltando. – Fala Andreia chorando.

- Calma, minha mulher! Quando você percebeu isso?

- Eu estava aqui na sala tomando conta do Davi enquanto a Rosilda estava na cozinha terminando o almoço com o rádio ligado, quando começou a tocar essa música e ele olhou em direção a porta da cozinha.

- Que horas, isso?

- Há meia hora, mais ou menos. Eu chamei a Rosilda pra confirmar porque eu achei que poderia estar vendo coisas.

- Você falou pra alguém?

- O papai não está em casa e eu quis falar primeiro pra você. Mas eu preferi que você visse pessoalmente.

- Muda de lugar. – Fala Antonio. - Vai pro outro lado da sala e canta mais um pouco.

- Eu vou. Eu vou!

Andreia caminha para o lado da mesa de jantar. Antonio fica olhando para Davi que não acompanha o movimento da mãe.

- Ele não mexeu os olhos. – Constata Antonio.

- Eu ainda não cantei.

- Tem razão. Começa a cantar, então. – Responde Antonio tentando controlar o nervosismo.

Andreia respira fundo e volta a cantar.

- Passaram anos, muitos anos. Ela no céu e ele no mar. Dizem que nunca o pobrezinho...

- Nada! - Fala Antonio decepcionado. - Não aconteceu nada.

- ... pode com ela se encontrar.

Novamente Davi olha para a direção de onde Andreia cantava a música.

- Mexeu. Ele mexeu. Ele olhou pra tua direção. – Fala Antonio chorando.

- Eu sabia. - Andreia vai em direção à Davi, abraça-o e fala fazendo carinho nos cabelos do filho. - Nosso filho está aqui, Antonio. Ele quer voltar.


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