33 - As Cartas

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- O que será que falta acontecer nesta casa, meu pai? – Resmunga Carmem, trazendo da cozinha um bolo queimado que acabara de desenformar.

- Do que você está falando minha irmã?

- Tentei fazer um bolo para dar uma animada no café da manhã e acabei me perdendo em pensamentos e deixei passar do tempo no forno e virou isso. – Responde Carmem, colocando a travessa com o bolo queimado sobre a mesa onde Francisca e Jorge estavam sentados já tomando seu café da manhã.

- Não te preocupa com isso, minha irmã. Senta e toma teu café da manhã.

- Obrigado Francisca. Mas, sinceramente, não estou com um pingo de fome.

- Tu sabes que ficar sem comer não vai ajudar em nada. Muito pelo contrário, só pode te trazer problemas. – Fala Jorge, pegando um pedaço do bolo queimando e experimentando. – E além do mais, mesmo queimado, ficou gostoso.

- Só tu mesmo, meu cunhado. – Fala Carmem, tentando rir em meio à tristeza que ainda sentia pela morte do pai. – Falando em nos alimentar, onde está o Pedro? Ele não vai tomar café antes de sair para o trabalho?

- Já saiu. – Fala Francisca. – Disse que estava sem fome.

- E ele falou alguma coisa? Viu ou ouviu alguma coisa?

- Como assim, minha irmã?

- Ah... sei lá. Já faz uns dias que o papai morreu. Será que ele já fez a passagem ou será que ainda está por aqui?

- Não acredito que estás com medo do papai, Carmem!

- Não é medo. Digamos que seja precaução. Eu não iria me sentir tranquila dando de cara com o papai na andando no corredor quando saísse do meu quarto.

- Só para te lembrar, cunhada. O Martins já não andava mais.

- E desde quando fantasma precisa andar?

- Vocês dois querem ter um pouco de respeito pelo papai, por favor? – Fala Francisca irritada, sem acreditar na conversa que estava presenciando. – Não fez nem uma semana que ele morreu. E o mínimo que eu espero de vocês é um pouco de respeito pelo meu pai.

- Calma, Chica. Ele também era meu pai. E eu não o estou desrespeitando. Só estou preocupada com as coisas estranhas que estão acontecendo já há algum tempo nesta família.

- Desculpa, Carmem. Me desculpa. Eu não estou nada bem.

- Tô falando que estás muito estranha desde a morte do teu pai. E é óbvio que não é só por causa do falecimento dele.

- Eu sei, Jorge. – Responde Francisca – Não foi a morte do papai que me deixou preocupada, assim. Na verdade, claro que a morte dele mexeu comigo.

- Mexeu com todos nós, minha irmã.

- Eu sei, eu sei...

- Então fala, minha mulher. O que é que está te atormentando tanto?

Carmem olha para Francisca que a olha e baixa a cabeça. Carmem larga o pedaço do bolo que estava em sua mão no prato no pratinho à sua frente, tira o resto dos poucos farelos do bolo que estavam em seus dedos e empurra o pequeno prato. Entrelaça os dedos, olha para Jorge e olha novamente para Francisca.

- Eu sei o que está acontecendo.

Sem levantar os olhos da mesa, Francisca responde.

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