29 de janeiro de 2012 - Sou gay

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(Quinn)

Abri os olhos sem muita vontade. Tinha acordado há algum tempo, mas mantive meus olhos cerrados num tolo desejo de fingir que estava sozinha. Senti a mão de Sam percorrendo meu dorso. Ele sabia que estava acordada e não tive mais como fingir. Virei para o lado e o vi com um sorriso bobo no rosto.

"Bom dia."

"Dia." Minha voz saiu rouca.

"Como se sente?"

"Dolorida." Disse sem pensar e provoquei reação de culpa em meu namorado. "Oh, não foi por causa disso." Apressei-me em explicar. "É consequência dos treinos da semana. As competições estaduais das cheerios estão chegando e a treinadora está cuspindo fogo."

Isso era a mais pura verdade. Os treinos das cheerios da semana haviam sido tão duros que me peguei questionando várias vezes se valia à pena passar por tudo aquilo para garantir a bolsa de estudo que me tiraria de Lima. Era estressante de acordar às cinco e meia da manhã para treinar, depois estudar, e no meio tempo controlar um bando de meninas vaidosas que me esfaqueariam pelas costas num piscar de olhos. Foi um erro mal calculado trair Santana e tirá-la da capitania logo no início do ano. Aprendi a duras penas o quanto perder uma aliada como ela foi delicado. Seria mais sábio garantir a volta ao esquadrão e permanecer como a segunda no comando por um tempo. Santana ia acabar cometendo um erro que custaria a liderança por ser impulsiva e emocional. Ela não sabia ser como eu: fria e calculista quando preciso. Mas lado Fabray falou mais alto e tive de derrubá-la logo.

A quase surra que levei no corredor da escola numa briga com Santana deixou muito claro que tinha perdido o meu braço direito. Ainda contava com uma ajuda tímida de Brittany, mas só porque ela sempre teve espírito de grupo. Muito mais do que eu e Santana, que sempre gostamos de nos rivalizar, apesar da aliança. Mas eu sabia que isto estava prestes a também se romper. Depois da morte de Hiram Berry-Lopez, Santana perdeu todo o tesão de estar nas cheerios, se é que ela um dia já teve algum, e Brittany estava determinada a apoiá-la em tudo que fosse preciso. Achava que seria questão de tempo para Santana desistir de vez. Todas as meninas tinham essa impressão, menos a treinadora Sylvester, porque ela também estava menos e menos interessada na equipe e no trabalho. Era complicado segurar toda essa barra. Se eu não fosse uma bitch de mão cheia, o ambiente dentro das cheerios ficaria insustentável.

Fora as cheerios, continuava a fazer bicos para garantir algum dinheiro para as minhas despesas pessoais. A pensão que minha mãe ganhava era pouca e minha mãe colocou a casa a venda para ter um suspiro. Tínhamos o dinheiro para pagar água, luz, telefone, gás, internet e mercado. Sobrava pouco para os pequenos luxos. Aliás, desses pequenos luxos, o único que minha mãe fazia questão de manter era o vinho. Como não podia mais comprar os vinhos caros com a grana do meu pai, passou a se contentar com os mais baratos. E um dos mais em conta da cidade, ironicamente, era fabricado na vinícola dos tios de Rachel e Santana. Mamãe começou a costurar também. Fazia reparos e conseguia tirar o suficiente para conseguir fechar as contas do mês. Ela costurava, fazia comida e, no fim do dia, tomava a (grande) taça de vinho barato.

Às vezes penso que a razão maior por eu ter voltado a ser uma tremenda bitch na escola foi essa necessidade de se sentir bem. De não ser a coitada que engravidou e depois ficou pobre. Daí a necessidade em permanecer no topo da pirâmide das cheerios. As meninas da sociedade sabiam da fragmentação do lar Fabray, por isso usava a minha força de capitã para mantê-las caladas e submissas.

O coral funcionava como um momento de lazer. Apesar de toda briga e das confusões semanais, a atividade era um respiro. As coreografias eram sempre leves, mas nem por isso menos elaboradas e bonitas. O clima era mais descontraído. Às vezes podia cantar meus demônios em metáforas musicais e era gratificante observar os colegas fazerem o mesmo. E tinha Rachel cada vez mais em forma tanto fisicamente quanto vocalmente. Era a parte que mais gostava, em especial porque consegui me aproximar dela e a gente começava a desenvolver uma boa amizade. Uma pena que Hiram precisou morrer para que eu criasse coragem de tentar fazer parte da vida de Rachel de forma positiva, sem me importar com o que a minha família ou os garotos populares fossem pensar de mim.

Saga Berry-Lopez e Fabray (história 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora