60 - A travessia da morte (✓)

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"A noite é escura e cheia de horrores."

Melisandre

***

O que o Corvo de Três Olhos havia previsto, logo se tornou verdade. Ninguém, em qualquer parte daquele mundo, escapou do frio e da escuridão dos Outros.

A Longa Noite tomou conta dos pântanos do Gargalo, mas Meera Reed sabia que os mortos nunca encontrariam Atalaia da Água Cinzenta. O castelo, como disse a Bran certa vez, não era para ser encontrado, pois se movia.

A escuridão desceu pelas populosas e ricas Terras Fluviais, onde o que sobrou dos descendentes dos Frey se escondiam, assustados com o frio e a neblina. Passou então pelo Vale, onde Robin Arryn, confinado com seus servos nas alturas, no castelo do Ninho da Águia, não tinha com o que se preocupar, assim como todos os que viviam nos casarões mais altos e nas ilhas ao redor de Westeros.

Já ao sul, no castelo de Monte Chifre, na Campina, Randyll Tarly preparava seu exército. O pai de Sam não confiava na Rainha Targaryen, assim como vários outros lordes do sul. Havia apoiado os ataques com fogo na capital, mas eles não vinham dando resultado e imaginava que Tyrion e Daenerys já soubessem que ele estava envolvido. Sentia que seria atacado, mas não sabia por quem até ver os monstros da noite com os próprios olhos.

Um pouco distante dali, em Jardim de Cima, Ollena Tyrell se fechava em seu lar. Não tinha idade para ser tola e desacreditar das ameaças que ouviu sobre mortos que caminhavam. Seus exércitos estavam preparados, como Daenerys ordenara. Enquanto isso, em Dorne, Ellaria e as Serpentes de Areia se recolhiam no palácio dos Jardins de Água. Nunca, em seus anos de vida, as filhas bastardas de Oberyn Martell haviam visto o frio e a escuridão encurralar o povo daquela maneira. O cheiro de sangue enchia o ar.

O continente estava completamente tomado pelo horror. Os exércitos que estavam lutando no Norte detinham o avanço dos mortos, mas os vagantes brancos se infiltravam, quase invisíveis pelas florestas e estradas desertas desde a queda da Muralha. As histórias já estavam sendo contadas outra vez pelo povo, como foi há milhares de anos.

***

Morando no sul, Tyrion nunca havia sentido tanto frio na vida. Acordou sob uma pilha de cobertores e foi abrir as janelas, mas deu de cara com a escuridão. Pensou, por fim, ter dormido menos do que imaginava, então se vestiu e desceu as escadarias mesmo assim, dando de cara com Bronn.

— Chegou um corvo. — O mercenário puxou o papel amassado e sujo de dentro do bolso — Yara e Theon estão vindo para buscar Missandei a pedido da Rainha Dragão.

Tyrion o encarou com desagrado, mas pegou o papel da mão dele e começou a ler tranquilamente. O mercenário não sabia o que era privacidade.

— Me lembre de pagar algumas aulas de boas maneiras a você.

— Já têm muita coisa pra me pagar, sabia? — Bronn se sentou bem à vontade em uma poltrona enquanto Tyrion enchia o primeiro cálice do dia com uma bebida forte e amarga. — Diga, porque a Rainha está fazendo isso?

— Ela não confia mais em mim. — Respondeu Tyrion, sem emoção — Por isso enviou um corvo para eles pedindo que levassem Missandei para longe daqui.

— E com razão, você está tramando contra ela.

— Estou? — Tyrion lançou um olhar esperto a Bronn — Me acha tolo?

— Acho que você é um Lannister. A sua cabeça nem deveria estar em cima do pescoço.

Tyrion o ignorou. 

— Já preparou o que lhe pedi?

— Sim. A cidade está preparada. O que decidiu sobre Ellaria? Vamos matá-la?

— Não. — Respondeu Tyrion — Nós não. Isso não seria muito inteligente.

— E então?

— Daenerys me pediu para matar minha própria irmã. — Tyrion caminhou até a janela e olhou para o céu escuro — Eu não pedirei nada demais, apenas que mate Ellaria quando retornar do Norte.

Bronn não gostou daquele plano.

— E se ela não quiser? Sabe que não está em condições de exigir nada dela, não é?

— Eu ainda tenho Missandei... — Tyrion sentiu o peito doer ao pensar nisso, mas era a única carta que restava. Não queria feri-la, mas se pudesse usar sua vida, usaria.

— Acha que ela trocará a vida de uma aliada forte como Ellaria por uma escrava?

— Conheço um pouco Daenerys. — Respondeu Tyrion — As pessoas que a acompanham são mais que servos, são importantes para ela.

— Como você deve ter sido um dia. — Lembrou Bronn.

Tyrion não respondeu. Sentia-se anestesiado. Era difícil se afetar depois de matar a mulher que amou, de matar o próprio pai, de ver seu irmão querido ser queimado vivo pela Rainha que trouxe para Westeros e, no fim ter, estrangulado sua única irmã. Sua família havia acabado e pouco restava de caráter nele.

— Ellaria e Olenna são aliadas de Daenerys e mataram meus sobrinhos. — Disse Tyrion, amargo — Joffrey mereceu, mas Myrcella não. Porém, existe algo que vai além do sofrimento e é o orgulho. Se não faço nada diante dessas mortes, o que isso faz de mim?

Bronn ergueu as sobrancelhas.

— Alguém vivo, eu acho! Mesmo que Daenerys aceite matar Ellaria para salvar Missandei, o que acha que ela fará com você depois? Te encher de beijos?

— Estamos trabalhando com a hipótese de Daenerys sobreviver. Varys tem me enviado corvos em que se mostra preocupado com a saúde da Rainha. Mesmo grávida e um tanto doente, ela não tem deixado de montar no lombo de Drogon para combater os mortos que avançam sobre o Norte. É uma garota imprudente.

— Uma Rainha Dragão com um herdeiro dragão na barriga me parece uma coisa muito perigosa.

— Ela deve estar muito mais feroz, mas não é nada incomum mulheres morrerem no parto e ela não tem feito muito para repousar e manter a saúde. — Tyrion não estava feliz com isso, apenas narrava os fatos. Daenerys não estava bem e ele não acreditava que essa história fosse ter um final dos contos infantis — Porém, caso sobreviva, estou certo de que ela virá por Missandei.

— Se ela morrer, você se livra da punição dela, mas também de sua proteção, lembre-se disso.

Tyrion começou a observar a neblina, ignorando Bronn. Estava estranhando que não houvesse estrelas no céu, estranhando o frio e a agitação dos servos no Palácio. Ouviu o barulho ao longe e era o povo que choramingava pelas ruas. Teve a sensação terrível de que algo maligno caminhava lá fora.

***

Nota: Dei uma caminhada pelo continente para mostrar a vocês a Longa Noite tomando Westeros. É como uma cortina de fumaça negra descendo o mapa a partir do Norte, passando pelo centro até o Sul. Dorne é a última parada, ou seja, se chegou lá é porque lascou tudo. Deixei um mapa aí para vocês visualizarem o que narrei.

Ah, caso alguém tenha se esquecido, os Tarly não morreram (irmão e pai do Sam), pois não houve confronto com a Dany como na série. Olenna e Ellaria também estão vivas, pois a Dany não seguiu os planos do Tyrion, não deu sequer um segundo para a Cersei pensar e então não houve nem tempo para que ela matasse suas aliadas.

Final alternativo para GOT (concluída)Onde histórias criam vida. Descubra agora