55 - Olhos azuis (✓)

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"Não existe vergonha em ter medo, meu pai disse-me, o que importa é como o encaramos."

Jon Snow

***

Jon desceu às pressas e encontrou Davos e um grupo de homens que voltava dos vilarejos. Entraram correndo, exaustos e feridos, contando os horrores que viram do lado de fora. O ar estava pesado e algo eriçava os pelos dos animais.

— A maior parte dos mortos está espalhada pelo continente, — explicou Davos — mas um grupo grande foi visto se aproximando ao leste.

— Quantos?

— Uns dez mil, pelo menos. Se tomarem os vilarejos mais próximos, vão dobrar de tamanho.

Jon sabia que precisava detê-los antes que isso acontecesse, então correu para reunir os soldados. Em algumas horas, cerca de quinze mil o esperavam em frente aos portões de Winterfell com tochas nas mãos, prontos para enfrentar o breu total.

— E os dothrakis e imaculados? — Perguntou Davos, esperançoso.

— Sem as ordens de Daenerys eles não vão a lugar nenhum.

— Não vai avisá-la?

Jon pensou.

— Não.

Ansiosos, os homens partiram em total silêncio, apenas ouvindo o bufar dos cavalos. Após um longo trajeto, eles chegaram a uma estrada em que havia um conjunto de casas totalmente lacradas. Enquanto passavam em frente às janelas, ouviam o choro das crianças amedrontadas e as súplicas que as mulheres faziam aos deuses.

— Isso é suicídio. — Chiava Gendry, observando a quietude e sentindo seu próprio cavalo se recusando a prosseguir.

Quando alcançaram o segundo vilarejo, Arya sentiu os pelos da nuca se arrepiarem e ela estremeceu de pavor.

— As casas estão abertas. — Sussurrou ela, vendo todas as portas e janelas escancaradas sem nenhuma única vela para iluminar os interiores.

Gendry e Arya avançaram com cautela, vendo um cacho de coisas penduradas na parede de uma das casas, como se fossem cocos em um coqueiro. Quando se aproximaram, sentiram cheiro de sangue e estrume. O estômago de Gendry se contorceu ao ver que eram cabeças amarradas umas às outras. Uma família de pelo menos sete pessoas havia sido degolada. Mas antes que pudessem pensar, Tormund atiçou fogo nelas.

— Não percam tempo. — O selvagem avisou — Cabeças ainda podem gritar.

Eles continuaram andando até chegar a campo aberto. Em determinado ponto, Jon temeu que estivessem perdidos. Para qualquer direção que olhassem, só viam neblina.

— Me esperem aqui. — Ele parou as tropas e desceu do cavalo.

Ele deu alguns passos à frente e depois parou apreensivo. Um pouco à distância havia dois pequenos pés descalços na neve, pequeninos e arroxeados. Conforme Jon foi se aproximando, foi enxergando o restante do corpo cinzento da criança. O par de olhos azuis eram brilhantes como duas pedras de safira. O menino não devia ter mais de cinco anos, com cabelos negros e bochechas que um dia deveriam ter sido rosadas.

— Mate-o. — Gritou uma voz em seu cérebro — Não é mais humano. Mate-o!

Jon levantou a espada, mas ficou detido naquelas feições inocentes. Nunca em sua vida havia matado uma criancinha. Então o menino abriu a boca e, encarando-o, soltou o grito mais alto e agudo que ele já ouviu. Em metade de um segundo, tomado de um impulso de horror, Jon decepou a cabeça do garoto com a espada, cessando o barulho, mas não foi rápido o suficiente. Mortos surgiram de todos os cantos com seus olhos azuis arregalados.

Todos os soldados empunharam suas espadas de vidro de dragão e partiram para o ataque, mas os mortos revidaram com ferocidade. Jon os notou muito mais cruéis do que antes. Eles se juntavam sob os soldados que caíam no chão e o retalhavam vivos, furavam seus olhos e rasgavam suas barrigas para puxar as vísceras para fora. 

Os gritos de dor e agonia pareciam atiçar os mortos ainda mais. Era como se a Longa Noite os tornasse ainda mais malignos. Os cavalos mais bravos correram assustados e alguns dos homens mais corajosos sentiam a urina descer pelas pernas ao serem atacados. Não era qualquer guerra, era algo demoníaco e alcançava o mais alto grau de desespero humano.

Os homens foram se encolhendo e se protegendo mutuamente, pois o exército dos mortos aumentava a cada segundo, como se brotassem do chão. Depois do que pareceu quase uma hora de batalha, as perdas eram incalculáveis e a vitória ainda não parecia possível. Quando um barulho soou ao longe, todos se viraram apreensivos, mas o alívio desceu sobre eles ao ver as foices, as tranças e os sinos soando. Os garanhões passaram depressa e seus cavaleiros pulavam das celas para retalhar os mortos.

— Os dothrakis! — Sorriu Gendry, desesperadamente feliz — Como eles vieram?

— À cavalo? — Zombou Tormund, finalmente conseguindo respirar melhor.

— Mas vieram pelo Jon?

— Claro que não. — Apontou ele — Vieram por ela.

Daenerys estava à distância, montada em um cavalo branco ao lado de Jorah e alguns de seus companheiros de sangue. Estava imponente e altiva, diferente do que todos se lembravam nos últimos dias. Havia refeito as tranças, se vestido outra vez como a Rainha que conheciam e, apesar de ainda estar abatida, havia algo diferente nela.

Os homens lutaram contra o grupo de mortos, agora com força redobrada. Houve muito sangue e muita morte, mas os Outros não eram páreos para a quantidade de soldados que se reuniu ali.

Após a batalha terminar, Jon se aproximou e Daenerys ergueu as sobrancelhas de forma acusatória.

— Estou pensando se devo perdoá-lo. — Disse ela — Não me prometeu que faríamos isso juntos?

***


Nota: A Grande Guerra será bem diferente da série, ela não vai se resumir a algumas horas de ataque a Winterfell. A Longa Noite terá um pouco de destaque, como nesse capítulo foi mostrado. Quero estender um pouquinho essa parte, mostrando um pouco de horror e dando tempo para que os personagens finalizem seus arcos.

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