Velhos amigos

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Point of view Zeca

- Augustine, sente-se por favor. - Disse assim que adentramos a sala. - A que devo a honra? - Olhei para aquela mulher, meus olhos não estavam mais acostumados com sua presença.

- Soube que a fazenda anda de vento em popa. - Sorri.

- E posso saber quem é seu informante? - Toda de preto, como gostava de andar e sentia confortável apenas assim. O que dava o charme de Augustine.

- Assim que coloquei meus pés no Texas, a primeira coisa a saber foi sobre sua fazenda. - Se escorou na poltrona, cruzando às pernas lentamente e me fitando séria. - Essa cidade não muda, Zeca.

- Não mesmo. - Me levantei e fui até a mesa onde ficava às bebidas. - E posso saber onde estava todos esses anos? - A olhei por cima do ombro, notei um sorriso meio triste.

- Nova York por um tempo, agora estou morando na cidade vizinha. - Acenei em positivo. Servi um shot em dois copos.

- Às coisas andam de vento em popa na fazenda mas eu não estou. - Virei e fui até ela entregar o copo. - Não está tomando remédio, né? - Ela semicerrou os olhos.

- Me chamando de velha, homem? - Dei de ombros, ela pegou o copo e virou todo, no final fazendo uma careta.

- Sua alma continua a mesma, Augustine. - A mesma sorriu. Peguei o copo e levei de volta a mesa, fazendo o mesmo gesto com a minha bebida.

- O que está acontecendo? - Servi mais um e voltei ao meu lugar.

- Vou fazer a partilha dos meus bens. - Augustine franziu a sobrancelha.

- Por que? - Indagou.

- Quero comprar um barco e viajar o mundo. - Ela riu.

- Velho tem cada sonho. - Soltei uma gargalhada alta.

- E sua filha? Nunca mais soube? - O seu semblante mudou e a mesma se levantou, caminhando até a janela.

- Está em Nova York. - Ouvi seu murmúrio. - Às vezes vou até onde ela está, só para ver seu rosto e mesmo que seja raro ela sorrir, eu a conheço e sei quando não é um dia bom.

- Um anjo. - Falei e ouvi sua gargalhada alta.

- Eu queria saber porque às pessoas me chamam tanto de anjo? Se soubessem. - Foi a minha vez de gargalhar.

- Talvez, minha cara porque você teve que aturar um cafajeste. Você conviveu com a perca de uma filha e por final, dentro dessa casa entregou Miranda para o casal rico. - Ela confirmou.

- Eu estava lá quando enterrou, Myra.

- É uma dor que não tem fim, Zeca. Pode passar anos e eu posso me habituar mas continuo com um buraco enorme no peito. - Me levantei e fui ao seu encontro. O sol do Texas estava forte, mesmo sendo outono, o calor ainda habitava.

- Casei pela sexta vez. - Augustine olhou para mim e começou a rir sem parar.

- Não estou achando graça, Augustine Colleman. - Falei rindo também.

- Sou a anos apaixonada por a mesma mulher e você casado pela sexta vez.

- Mentira? - Me afastei um pouco dela. - Sabia, você tem cara. - Parou de rir e arqueou uma sobrancelha.

- Cara de que?

- De que gosta de mulher, ué. - Ela se aproximou de mim.

- Amor não tem cara, Zeca. - Sorri.

- Amor não tem cara, Augustine. - Respirei fundo. - Quer dar uma volta na fazenda? - Ela confirmou. - Eu era apaixonado por ti, mulher.

- Cala a boca, eu sou anos mais velha que você. - Ofereci meu braço para ela que de imediato se apoiou.

Dez Invernos (Mirandy - Intersexual)Onde histórias criam vida. Descubra agora