Enquanto eu e Ian andávamos em direção à escola dele, eu me questionava que talvez não fosse tão sensato assim falar diretamente com os pais daquilo que chamavam de crianças, mas que na minha conceção eram monstros. Pensei que seria mais coerente falar com a diretoria e caso isso não surtisse efeito, aí sim eu poderia partir para os responsáveis daqueles pirralhos.
Eu estava levando Ian diretamente em sua sala e quando ele estava prestes a entrar, eu o barrei:
- Diga para mim, quem são eles?
Ian abaixou a cabeça e cochichou no meu ouvido:
- Aquele de cabelo loiro e roupa social. - ele não estava brincando; a criança realmente estava vestida de social. Ao invés de raiva passei a sentir dó do garoto. - Aquele ruivo, ali na janela. - também localizei. - E aquele menino alto, sentado na mesa da professora. - ele parecia muito um daqueles garotos que tenta sempre atazanar a vida de alguém para parecer engraçado. Os três pareciam na verdade. Pareciam também o tipo de criança que se os pais pudessem, os deixariam o dia inteiro na escola.
- O que faço se eles mexerem comigo? - Ian me perguntou, ainda receoso e com os olhos mornos.
- Se eles vierem falar besteira de novo, só ignore. Se você não demonstrar emoção alguma, eles não vão achar tão engraçado assim mexer com você. - ele assentiu, compreendendo. - Porém se eles tentarem bater em você, tente a todo custo evitar o confronto.
- Até porque não sei lutar.
- Isso.
- Mas e se eles me baterem?
- Não deixe eles te baterem. Se não tiver como evitar, chute bem no meio das pernas. Com toda a força que tiver e corra até um adulto. Você me entendeu? - ele assentiu. - Ótimo.
- Obrigada, Liv. - ele me abraçou rapidamente e partiu para a sala.
No meu caminho para a sala da diretora, encontrei uma garotinha encostada na parede e ela estava péssima. O rosto dela não estava nada bem:
- Olá? Você está bem? - não pude ignorar aquilo.
- Estou, é só que... É só que... - ela fungava sem parar.
- Tudo bem. Pode me falar, o que foi? - me aproximei mais dela e percebi que algo estava faltando. A perna dela estava faltando.
- Eu, eu... Não consigo achar minha prótese. - os olhos dela se encheram de lágrimas.
- Eu ajudo você. - ofereci apoio para que ela pudesse se locomover. - Mas como é que você foi perder uma prótese?
- O Billy pegou. - ergui a sobrancelha. - Ela é nova e não estou completamente habituada com ela, então as vezes tenho que tirar um pouco para parar de doer. - assenti. - Ele a pegou e escondeu.
- Tem alguma ideia de onde possa estar?
- Aquela é a unica lata de lixo que não procurei. - ela apontou uma lata bem longe.
Chegamos lá com certa dificuldade, mas conseguimos. Ajudei a garota a se apoiar na parede e enfiei a mão na lata. E não é que estava lá mesmo?
- Meu Deus. - ela soltou; isso devido a prótese estar toda suja.
- Não se preocupa, vou limpar pra você. - a ajudei a caminhar até o banheiri feminino, onde comecei a pegar papéis toalha. - Quem é esse Billy? - perguntei como quem não queria nada.
- É um idiota do terceiro ano que arruma confusão com todo mundo. É alto e loiro. - contando com o fato que só havia um terceiro ano e que aquela era a mesma descrição do garoto que Ian me apontara, eu achava ser a mesma pessoa.
- Entendi. Ele sempre faz essas coisas com você? - eu disse, umedecendo um pouco o papel.
- Sim. E ele gosta de zoar o Ian também. Que é da sala dele. - meus olhos cresceram:
- Ah é? Há quanto tempo?
- Ele sempre implicava com ele, mas Ian nunca levou a sério. Até ontem. - eu parei de limpar e me concentrei só nela:
- Por quê?
- Porque ele falou da tia Ruby. - meu coração bateu mais alto. E quando eu digo alto, era realmente isso que eu queria dizer mesmo, porque eu pude escutar as batidas seguintes. - A mãe do Ian. Eu achei muito cruel.
- Entendi. - finalmente consegui deixar a prótese em um estado aceitável. - Prontinho.
- Muito obrigada...
- Olivia.
- Muito obrigada, Olivia. - eu assenti, com um sorrriso fechado.
- Escuta, esse Billy, ele só implica com vocês dois, ou com mais alguém também?
- Com todo mundo. Mas ninguém fala nada porque quando reclamamos, a situação fica pior. - como é que três tocos de amarrar bode podiam pregar tanto terror assim?
- E ele é sozinho?
- Não. Tem o Tony e o Denis.
- Hum. Entendi. E qual é o seu nome?
- Maya. - ela ofereceu a mão que eu apertei e após ela terminar de fixar a prótese, saímos do banheiro.
- Foi um prazer, Maya.
- O prazer foi meu. - ela caminhou com certa dificuldade pelo corredor.
Se aquilo não havia sido um sinal dos céus para mim, eu realmente não sabia o que poderia ser.
Caminhei até a sala da diretoria.
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EAT ME
DiversosComo é desenvolver uma doença que não pode ser vista fisicamente? Como é saber que está doente e ao mesmo tempo não ter ciência disso? Como é achar que isso está sendo algo bom quando está destruindo o seu corpo? E o seu psicológico? Como é estar t...