Eu mandara mensagem para Tonya e para Norman me encontrarem no portão da escola depois da aula pois eu queria falar com eles.
Eu queria dividir com eles o que acontecera há algumas noites atrás, pois eu sentia que eles ficariam tão felizes quanto eu.
Juntei minhas coisas e assim que o sinal soou, fui em direção ao armário para guardar minhas coisas e os encontrar.
Entretanto, antes que eu pudesse concluir o meu objetivo, encontrei Clarisse com alguns curativos no rosto. Me senti um pouco mal pelo estado dela, pois ela havia perdido um pouco da compostura que sempre tivera, mas resolvi a encarar nos olhos e demonstrar firmeza.
Eu não provaria ser a vítima que ela tinha mencionado anteriormente.
- Oi, Clarisse. - ela me deu um olhar que provava o seu mais puro desafeto e continuou guardando suas coisas. - Sei que você não quer me ouvir, mas preciso dizer algo.
- O que você quer, Olivia? - ela fechou o armário com um tranco.
- Quero me desculpar. - vi os olhos dela retraírem, como se algo de muito errado estivesse acontecendo. - Pelo que fiz no último dia.
- Que tipo de piada, você acha que está contando? - ela cruzou os braços e se aproximou com um tom invasivo. - Eu não preciso da droga das suas desculpas ou da sua pena. Vai se lascar, sua aberração.
Ela saiu andando sem me dar chance e esbarrou no meu ombro com força.
Assim que ela sumiu, eu neguei com a cabeça, ajeitando minha mochila nos ombros.
- Eu sou uma idiota mesmo. - neguei com a cabeça.
- Não, você não é. - ouvi e me virei para a voz que vinha detrás de mim.
- Will? - fiquei surpresa. Já fazia um tempo que eu não o via por aí.
- Você não é idiota. Clarisse que é. - eu acariciei meu braço, me sentindo vulnerável. - Ela se comporta como uma criança mimada onde as coisas precisam ser sempre do jeito dela.
- Deixa pra lá. - desconsiderei.
- Queria me desculpar. De novo. - ele disse como se tivesse tentando lidar com um peso. - Eu não sabia direito como lidar com tudo o que aconteceu; foi muita coisa para...
- Processar. - eu entendia. Perfeitamente. - Não tem porque se desculpar, Will. Foi um choque para todo mundo. - adiantei. - Sua reação não foi algo tão incoerente assim no final das contas.
- Foi um pouco de covardia. Não me senti muito bem. Por isso vim falar com você. - eu assenti. - Só queria que soubesse que sei que você tem muitas pessoas legais com você, mas que se precisar, pode falar comigo.
- Obrigada, Will. - sorri e foi algo bem natural. Espontâneo. De ambas as partes.
- Ok, o que é que você estava fazendo tanto suspense assim para nos contar? - Tonya perguntou assim que alcançamos a casa dela.
- Isso pode parecer um pouco esquisito mas eu preciso dizer algo. - anunciei.
- O que foi amor? - Norman perguntou com um olhar receoso.
- Eu... - na minha cabeça aquilo soou mil vezes mais fácil. - Eu tenho... - respirei fundo para ver se me dava estímulo. - Eu...
- Fala logo, criatura! - Tonya estava quase colocando um ovo.
- Eu tenho anorexia! - eu praticamente gritei e até Joshua que estava na cozinha me deu uma encarada.
Tonya ficou com um olhar completamente confuso e Norman abriu um sorriso. Acho que ele compreendia o que eu tentara fazer:
- Ok. Eu não entendi nada. O que aconteceu aqui?
- Ela conseguiu admitir, Tonya. Ela finalmente conseguiu encarar o problema.
- Na verdade, não sei muito bem se encarei, mas há uns dias atrás, eu conversei com meu pai e percebi que eu havia associado as coisas com facilidade, então eu venho praticando sozinha. Não sabia se ia conseguir falar com vocês.
- Me desculpa por ser uma lontra e não notar. - Tonya veio me abraçar. - Eu estou orgulhosa de você, Olivia.
- Obrigada.
- Sou só eu, ou vocês também acham que isso merece uma comemoração? - Joshua perguntou, se juntando a nós.
- Ah, com toda a certeza merece. - ela incentivou o irmão.
- Eu acho que vocês tem que parar de me mimar tanto. - eu disse.
- Cada progresso deve ser comemorado, Ollie. - Norman citou, concordando com eles.
- Vou buscar uma coisa perfeita para essa ocasião. - Tonya se levantou toda animada e saiu antes que eu pudesse protestar.
- O que ela foi fazer? - dirigi a pergunta a Joshua, que simplesmente me respondeu com um dar de ombros bem casual de sua parte.
- As coisas estão saindo melhores do que eu estava prevendo. Deus é muito bom, Forbes. - Norman segurou a minha mão e me encarou com aquele brilho nos olhos que sempre o acompanhava de alguma forma.
- Para mim as coisas parecem lentas. - fui sincera. - Cada detalhe parece um passo muito grande para as minhas pernas, sabe? - ele assentiu. - Mas no final, eu descubro que posso ir adiante, por mais difícil que isso possa parecer.
- Com o tempo, as coisas vão ir se encaixando. Você vai ver. - ele sorriu de canto, me encorajando.
- Pronto! - Tonya voltou, mais animada do que Ian quando saía da escola; ela veio saltitando, segurando algumas embalagens nas mãos.
- O que é isso? - perguntei de cara.
- A minha vizinha está vendendo cheescakes. Ela começou a fazê-los há pouco tempo, mas eles são uma delícia! - ela disse fechando os olhos na última parte, para sinalizar.
Minha amiga havia trazido três doces e eu achei aquilo perfeito, porque eu não estava a fim de prová-lo. Naquele momento, não me pareceu nenhum pouco atraente.
Não foi como o dia dos amendoins. Apesar de ela estar fazendo aquilo com uma ótima intenção e com um sentimento maravilhosamente colorido dentro de si, eu não sentia que podia comer aquilo.
- Mas ela só tinha três. Infelizmente. - ela se atentou, quando colocou os doces em cima da mesa.
Eles eram de morango. E eram muito bonitos. Estavam bem montados. Eu tinha que admitir que a pessoa que os fizera era extremamente detalhista.
- Você e Joshua comem um cada um e o meu, eu divido com a Ollie, se ela quiser. - Norman veio com a ideia e eu agradeci a Deus - pela bilionésima vez - pelo namorado que eu tinha.
Era incrível como Norman sempre conseguia ler o ambiente e me ler. Ele sempre conseguia entender o contexto e os sinais de tudo que estava acontecendo e ele tentava sempre combinar isso com o sentimento das pessoas. Ele tentava assimilar a melhor opção para não desagradar ninguém; para não decepcionar.
- Gente, desculpa - eu encarei o doce e encarei o rosto rosado da minha melhor amiga. - Mas acho que vou passar. Eu comi um pouco no almoço, então...
- Sem problemas! Não precisa forçar. - Tonya sorriu de forma educada.
Eu sabia do medo que ela sentiu. De ter me constrangido, me chateado. De ter causado qualquer impacto negativo que pudesse influenciar no meu processo. Entretanto, a sensibilidade dela era tão grande em relação aquilo que não tinha como eu interpretar aquilo errado. O modo como ela me tratava, tentando manter as coisas o mais próximo do normal, era tudo o que eu precisava e era o que verdadeiramente me motivava a tentar meus pequenos sucessos.
Naquele momento, eu encarei ela, encarei Joshua e encarei o meu namorado. Como eu me sentia grata por eles; como eu me sentia bem por ter pessoas como eles, mesmo quando as coisas não saiam exatamente como eu queria.
Encarei o doce mais uma vez. Havia um grande morango brilhante bem no topo do doce.
Antes de pensar duas vezes, abri a embalagem e peguei o morango.
- Ollie, não precisa...
- Não tudo bem - sorri para ela. - Estamos comemorando, não é? - eu estava tentando firmar aquilo mais para mim mesma. - Tudo bem.
Mordi o morango e fui inundada pelo amargo da fruta.
Num primeiro momento, foi surpreendente. Fazia tanto tempo que eu não comia morangos; eu nem me lembrava qual tinha sido a última vez. Eu tinha esquecido que era meio azedinho, mas foi uma boa surpresa.
Senti até vontade de gargalhar.
- E aí? - Norman questionou.
- Tá azedo para caramba. - respondi rindo.
- Deixa eu ver? - ele veio e deu uma mordida na fruta. Na hora, o rosto dele se contorceu, como se ele estivesse chupando um limão. - Meu Deus!
Comi o pedaço restante do morango.
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EAT ME
AcakComo é desenvolver uma doença que não pode ser vista fisicamente? Como é saber que está doente e ao mesmo tempo não ter ciência disso? Como é achar que isso está sendo algo bom quando está destruindo o seu corpo? E o seu psicológico? Como é estar t...