Levou oito meses, mas foi quando estava finalmente passando para o ranque Platina que Kira fez o primeiro contato de verdade com a sua essência espiritual. Em sua mente, ela se encontrava num campo lindo, florido e à beira-mar de um lado e a outra metade deste campo coberto por uma neve do mais puro branco, além de ter árvores perenifólias com alguns seres típicos daquele clima frio. Curiosamente o campo à beira-mar estava de dia enquanto o campo de inverno estava de noite.
— Oi. — disse Kira, incerta do que dizer à única pessoa fora ela naquele lugar contrastante.
— Oi, jovem Kira. Seja bem-vinda ao seu mundo interno. — a filha da lua cumprimentou. Ela vestia-se com o lindíssimo quimono em tons frios e com seus cabelos presos em um complexo penteado, presos com tiaras e prendedores de gelo translúcido. Sua aparência ainda era de uma jovem mulher, aparentando ser ligeiramente mais velha que Ayame.
— Você sabe o meu nome. — disse Kira, meio cabisbaixa. — Mas eu não sei o seu.
— Meu nome é _________. — a filha da lua respondeu com um som igual ao estalar de um pingente de gelo. — Também sou conhecida por _______.
O segundo nome tinha um som de ventos frios do ápice do inverno.
— Desculpe, mas não entendi. — disse Kira, sentando-se ao lado da mulher. A filha da lua a imitou, trazendo consigo sua aura mais fria. — Podem dizer o que for das bestas espirituais do seu tipo, mas eu não sinto frio de você. Sinto melancolia e solidão.
O comentário de Kira pareceu tocar as profundezas mais ocultas daquele coração de gelo. Ouvindo o que ela disse, a mulher deixou uma lágrima do tamanho de uma pérola, feita de gelo, cair em seu colo, logo seguida de algumas dezenas.
— Em todos os meus milênios de vida eu nunca vi ninguém marcado por aquela mulher com um coração tão puro quanto o seu Kira. — disse a filha da lua. — Ninguém entendia meus sentimentos. Meus medos. E acima disso, meus desejos...
— Por que você estava presa naquela caverna?
— Eu era uma pessoa perversa em meus tempos de juventude. Esta região que vocês conhecem pelas belas praias, na verdade, era bem no centro da região Leste. Por minha futilidade e desejos materiais, eu trazia invernos cruéis quando os camponeses que viviam em meu território não me davam ofertas generosas ou boas o suficiente. — o olhar da mulher era de tristeza e arrependimento. — Até mesmo o homem que se declarou a mim voltou-se contra, num estratagema feito para tentar matar-me. Enfureci-me e deixei o meu território num inverno eterno. Pelo menos até a chegada de uma poderosíssima cultivadora que era uma mortal naqueles tempos imemoriáveis.
A filha da lua encarou a lua cheia do céu estrelado que iluminava o campo de inverno, como se soubesse que a Mestra Garça da Lua a observava.
— Lutamos bravamente uma contra a outra. Eu invocando a natureza e o inverno às minhas ordens e ela usando as energias naturais e o verão contra mim. — num gesto simples, a mulher puxou a sua manga esquerda do quimono para cima, revelando uma cicatriz que ia do antebraço até o ombro. — Esta cicatriz é a marca eterna do golpe que me enfraqueceu e permitiu àquela mulher selar-me no fundo da minha morada. Usando seus poderes, ela moldou a terra ao meu redor, encerrando-me num complexo de cavernas, além de elevar o terreno e confinar-me num platô. Tudo por querer ser mortal e humana, sendo que nasci apenas com a aparência humana.
Kira, sem nem mesmo pensar direito, abraçou com muita ternura a filha da lua invernal, passando a ela as emoções que transbordavam de sua mente. A mulher, recebendo tamanho gesto de amor, abraçou-a de volta até ser levada pelos ventos frios daquele campo nevado.
Procurando pela essência espiritual, Kira achou um baú simples de madeira no lugar onde a mulher se encontrava. Dentro havia uma pequena tabuleta e algumas pérolas. Quando Kira pegou a tabuleta em mãos, viu duas coisas distintas nas duas faces ali.
Na face da frente, uma mensagem para ela:
Jovem Kira... Após sentir como você é, sua bondade e seu poder oculto, deixo estas pérolas de gelo eterno para você. Use-as para desenvolver seu elemento gelo e crescer ainda mais seu cultivo. Na outra face desta tabuleta você encontrará o meu nome.
Na face oposta, havia duas palavras escritas: Fen Ming.
Despertando de seu cultivo, Kira viu que sobre suas pernas estava uma caixa. Dentro desta pequena caixa, vinte pérolas, translúcidas como cristais e frias como o gelo do inverno. Eram as Pérolas do Gelo Eterno.
— Bom. — disse a Mestra Garça da Lua. — Tu conquistaste a confiança da consciência de tua besta. E como prova desta confiança, Fen Ming deu a ti esta vintena de Pérolas do Gelo Eterno.
— Como elas funcionam Mestra?
— Se tu espalhares estas pérolas ao teu redor quando cultivares, elas converterão todo e qualquer ki em ki do elemento gelo, facilitando o teu aprendizado e domínio do mesmo. — a mestra explicou com calma. — Mas em teu estado atual, recomento fazer com apenas cinco pérolas no máximo: energia de um elemento em quantidades exorbitantes pode fazer o teu corpo sofrer os efeitos físicos do mesmo elemento. No teu caso, podes entrar em um quadro de hipotermia ou até mesmo morrer congelada.
Levando o aviso de sua mestra a sério, Kira treinou diligentemente pelos próximos três anos, ultrapassando o ranque Ouro Branco e alcançando o ranque Platina nível oito na data próxima ao retorno de Long Feng.
Enquanto treinava sua mente, Kira também fortificava seu corpo e suas artes marciais: a têmpera de seu corpo era mais delicada pela complexidade dos elementos que ela tentava dominar. Fora o fato que cinco Pérolas do Gelo Eterno levavam um ano inteiro para serem refinada dentro do dantian de seu corpo. Suas artes marciais foram refinadas com o aprendizado do uso do gunsen e da lança de Bishamon, nomeados pela Mestra Garça da Lua como Lança da Serpente dos Mares e Leque dos Ventos de Inverno, respectivamente.
A Mestra Garça da Lua ensinou Kira primeiramente as artes baseadas no uso do leque. Treinou por meses a fio com o uso de um leque simples de madeira e papel de seda. Quando Kira aprendeu e memorizou as bases da Dança dos Leques, foi dada a autorização para treinar com um gunsen normal. Em seguida, infundiria o seu ki e sua energia espiritual na arma, até estabilizar os elementos água e gelo. Então, quando usou pela primeira vez o Leque dos Ventos de Inverno, a arma era como uma velha conhecida. Fen Ming sentia que a ligação entre as duas cresceu, manifestando seus poderes ainda mais fortemente pelas duas armas.
O seu grande desafio foi dominar a lança de Bishamon. A arma, muito mais ofensiva que o gunsen, era como a manifestação da faceta mais destrutiva de Fen Ming. Quando começou a treinar com esta arma, Kira sentiu uma pequena angústia dentro dela, onde aquela faceta mais agressiva de Fen Ming se mostrava: não era a bela imagem dos níveos dias invernais nem dos lagos espelhados, mas sim das cruéis e destrutivas nevascas e avalanches que varriam com a vida dos mais fracos à sua frente.
Foram necessários mais de dezoito meses para que Kira dominasse minimamente bem a Lança da Serpente dos Mares.
Ao fim do último dia de seu treinamento com a lança e o leque, uma ave veio entregar-lhe uma mensagem. Nela, escrita com uma caligrafia muito bela e familiar, dizia que Long Feng retornaria em uma semana.
Feliz, Kira descansou a semana que se passou calmamente, aguardando a chegada de Long Feng na mansão do lorde de Nakatari com sua Irmã Sênior Ayame e sua mais nova amizade: Rin.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Renascer de Um Herói
FantasyNo continente de Wei, um das grandes nações que dominam a maior península do continente é o Império das Cinco Bestas Divinas Huang Long. Nele, as leis marciais ditam a política: artistas marciais e espiritualistas se destacam com seus poderes e habi...