Arranjos e Travessuras

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Indo ao cômodo onde serviram o almoço, o trio encontrou um casal sentado à mesa desfrutando de um chá refrescante e todo um acompanhamento pedido pelos três — havia ali comida e bebida o suficiente para aquelas cinco pessoas.

— Ah, Ayame, Rin! — exclamou o homem. — Boa tarde, minhas sobrinhas.

— Boa tarde, Tio, Tia. — elas cumprimentaram de volta. — Este é o Long Feng de quem o senhor nosso Pai tanto fala.

— Boa tarde, Lorde Patriarca, Senhora Grã-Anciã. — Feng cumprimentou numa leve reverência. — Eu até faria uma reverência mais respeitosa, mas os ferimentos ainda não sararam por completo.

Observando as ações de Long Feng, a mulher ali apenas deu um leve sorriso.

— Não é preciso tanta formalidade, rapaz. Não estamos lidando com meu irmão. — o homem devolveu. — Sou Okusame Yoshimitsu, Patriarca do Clã Ondas Celestiais e líder da família Okusame. E esta é a Grã-Anciã da família e minha irmã mais nova, Okusame Sawako.

— Prazer em conhecê-los.

— Sentem-se, jovens. — disse a Grã-Anciã. — Vamos aproveitar este delicioso chá com petiscos.

Por alguns instantes, apenas o tilintar da louça do chá era ouvindo, assim como o som do beber do chá e mastigar dos acompanhamentos.

— Se eu puder ser obtuso com o Patriarca e a Grã-Anciã, não acho que ambos vieram aqui para desfrutar um chá e conversar com as Jovens Damas. — disse Feng, mantendo a educação, mesmo com o comentário mordaz.

— Gostei da sua intuição garoto! — o Patriarca rugiu animado. O garoto tinha uma pequena noção de onde o Lorde Mestre tinha este hábito. — Viemos aqui falar com vocês três.

A resposta do Patriarca pegou os três de surpresa: falar com Long Feng era algo que todos queriam, mas conversar com ele na presença das filhas do Lorde Mestre? Quem faria isto? E por quê?

— Serei direta — a Grã-Anciã começou —, amanhã será o julgamento do criador de barreiras. Ele está preso nas celas da mansão sob a engenhosa proteção que você fez Long Feng. — ela se arrumou na cadeira, ficando mais ereta. — Mas o problema é quanto à presença dos que estavam no dia: você, meu irmão e seu braço direito estarão presentes. As minhas sobrinhas e sua amiga não poderão estar presentes, apenas os guardiões delas.

— E deixe-me adivinhar, os Anciões que agem pelas costas da Grã-Anciã e do Patriarca estão abusando das normas e leis do clã para tentar ganhar algo a favor deles. — Feng falou meio irritado com a atitude destes anciões, lembrando e muito a segunda esposa de seu falecido pai.

— Você está certo. Eles têm medo que um deles seja "descoberto" ou "falsamente acusado" de tentar pegar o assento de Patriarca ou Grão-Ancião. — o Patriarca confirmou. — Com os poderes tão dispersos, a coesão do clã pode entrar em colapso.

Aquilo que as duas pessoas mais poderosas no clã estavam fazendo era uma traição aos olhos de uns e um pedido desesperado de ajuda perante os olhos de outros. Long Feng só comia e bebia enquanto lhe dirigiam a palavra.

— Tenho meus meios... — Feng falou calmamente, arrancando máscaras de curiosidade e algum receio dos quatro. — Posso fazer um covarde como ele cantar como as aves primaveris. É só deixar que eu cuide dos velhos enrugados.

O meio sorriso dado por Long Feng pareceu dar um misto de segurança e um pouquinho de medo pelos dois mais velhos: se o que seu irmão dizia for verdade, então não havia o que temer deste jovem.

— O que eu preciso é apenas esta simples erva típica do Oeste. — ele explicou meio vagamente. — Ela é conhecida como Bruma Crepuscular. Se for para disfarçar, instrua ao seu servo ser boa para enjoos. O que não é uma mentira, já que é mesmo.

Todos ali entenderam: havia mais algum emprego da erva que não fosse só alívio de enjoos. Algo que Long Feng faria seria muito mais interessante de se ver.

— Uns três ramos devem servir. — instruiu, retirando um exemplar seco do seu anel. — Mas eu preciso in natura. Seca, ela servirá somente para um chá contra enjoos.

— Algo a mais? — perguntou a Grã-Anciã, pragmática. A mulher era alguém que colocava a família antes dos interesses particulares. Tanto que já rejeitara alguns bons pretendentes, mesmo que sua aparência ainda fosse de uns dez anos mais jovem.

— Sim. Lágrima de Cristal. A senhora Grã-Anciã sabe o que é?

— Sim, mas é um produto alquímico tão simples... Tem algo em específico para este?

— Apenas o mais limpo e mais recente. Não terá a necessidade de ser recém-colhido.

— Se você ouviu o que o jovem disse, faça o que foi pedido e traga à sua presença até o pôr-do-sol. — a Grã-Anciã falou para o forro do teto. — Acho que seria interessante se você levasse a erva seca.

Um borrão preto pousou delicadamente na mesa, saindo com uma velocidade absurda até mesmo para os olhos treinados de Long Feng conseguirem acompanhar.

— O guardião da senhora Grã-Anciã, eu imagino. — disse Feng, sem sequer ter levado um susto.

— De fato. Eu me surpreendi que o jovem Long Feng estivesse acostumado com eles.

— Pessoas estranhas a me vigiar nesta residência... — ele comentou como se falasse do clima. — Notei no primeiro dia aqui.

Os arranjos foram feitos e perto do ocaso, um pacote fora deixado no quarto de Long Feng quando suas visitas se despediram e ele foi ao seu quarto. Era um fardo de papel bem feito. Abriu e viu um maço fresco da erva, assim como cinco garrafinhas de cristal, com um líquido translúcido que brilhava ligeiramente azulado.

Expandindo seus sentidos e levantando as defesas criadas com os talismãs, Long Feng removeu os itens que precisava de seu bracelete e começou a criar as poções que queria. Antes de dormir, preparou uma em especial, para si, e foi dormir.

Era a primeira vez que dormia sentindo-se travesso.

Renascer de Um HeróiOnde histórias criam vida. Descubra agora