Cotidiano Conturbado

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O dia seguinte foi um pouco agitado desde que Feng saiu da cama. Primeiro foi a presença da guarda da cidade. Desta vez, diferente da pequena rusga com o encrenqueiro Rou, quem atendeu ao chamado do Bom Sonhar foi um homem meio suspeito. Tinha os traços que pareciam misturar uma raposa com um humano. Até seus olhos, tipicamente puxados, pareciam transmitir uma aura de cobiça e desconfiança. Depois do relato tomado (mentalmente) pelo homem, Feng se sentiu ainda mais desconfortável. Aquele homem não era de confiança.

— Senhora Lin, como se chamava aquele outro membro da guarda que nos atendeu da última vez? — perguntou Feng.

— Aquele era o sargento Wei. — a senhora respondeu. — Está pensando em contar a ele?

— Sim. Mas insisto que nem a senhora, nem a senhorita Kira contem a mais ninguém. Estou receoso com o que pode acontecer...

Desde que fora incriminado (falsamente) pelo assassinato do pai e do mestre, Long Feng não tinha muita fé na corporação da guarda da cidade.

— De qualquer forma, amanhã à tarde irei até o mercado de peixes ver com o senhor Li sobre o acordo. — Feng comentou por alto. — Até lá a senhora precisa de algo?

— Não. Temos um bom estoque de peixes-sebo e o Li avisou ontem que viria uma boa quantidade daqui a um dias. Pedi a Kira para colocar uma placa pouco antes do almoço. Você pode ajudar no salão ou na recepção.

— Se não se importar, fico com a recepção hoje. — disse Feng, indo para o local e cobrindo o turno da manhã.

Enquanto a manhã corria, Feng tentava se distrair com seus pensamentos, que estavam quase todos pensando na sua aquisição do leilão. Estava até alegre com os itens conquistados e o montante obtido. Este ar de alegria e satisfação dele era tamanho que contagiava os clientes que chegavam à casa, levando-o ao salão para fazer alguma refeição com uma boa vontade que chegavam até a pedir alguns pratos mais elaborados e caros. O dia veio e logo Feng foi fazer seu almoço, notando que Kira, meio avoada naquela manhã, resolveu fazer só agora a placa, uns minutos para o movimento começar.

— A senhorita está escrevendo errado. — Feng comentou sem segundas intenções.

— Como?

— O nome do peixe. — respondeu enquanto riscava o chão de areia com um graveto. — A senhorita usa os ideogramas de faca e água quando o correto é lâmina e rio.

— Faz você, então. — Kira retrucou meio emburrada com o comentário dele.

Ele molhou o pincel na tinta, pegou uma placa de madeira limpa e agilmente, na sua caligrafia excepcional, escreveu "Novo Prato! A iguaria do Leste: Adaga D'água! Venham Provar!". Achou que a chamada para provarem era um toque interessante. O novo toque de criatividade era uma boa chamada. Por cortesia, colocou a placa na entrada e, numa inspiração vinda do nada, chamou os clientes na rua:

— Venham, venham! Temos um novo prato! Nosso peixe adaga d'água, a iguaria do Oeste, está sendo servido oficialmente no cardápio a partir de hoje! Venham, venham!

Alguns passantes ficaram curiosos e entraram enquanto outros não davam nem metade da atenção, imaginando ser uma jogada do garoto e do Bom Sonhar. A casa, pelo horário, ficou logo cheia, precisando organizar uma fila e correr para atender a todos — até mesmo Kira e Long Feng foram atender, levando e buscando pratos.

Depois do alvoroço do almoço, Feng foi liberado e resolveu pelo menos descansar no quarto. Aproveitando o descanso dado, Long Feng sentou-se no meio de seu quarto arejado, cheirando levemente a maresia, e começou a cultivar. Estava profundamente concentrado, pensando nas palavras do cântico, enquanto descansava as mãos sobre os joelhos e ficava com as costas eretas.

Renascer de Um HeróiOnde histórias criam vida. Descubra agora