Wen Ning o observava com perplexidade, mas Bai Renshu continuava insistentemente na mesma posição. Estava claro que o cultivador não desistiria até que recebesse alguma resposta.
Saindo de seu estado de torpor, o General se arrastou ajoelhado até a beira do ofurô, ficando submerso apenas da cintura para baixo. Ele se curvou na direção do cultivador e o segurou pelos braços para que ele se reerguesse.
— É claro que você não precisa me implorar, Bai Renshu... eu confio sim, em você - disse o Wen, ainda se sentindo um tanto atônito.Bai Renshu não se levantou. Ao invés disso, segurou amigavelmente as mãos que tentaram reerguê-lo e olhou no fundo dos olhos de Wen Ning.
— Confia o suficiente para me contar o que te magoou tanto pra você querer ir embora desse jeito? - perguntou o Bai, na voz mais branda que podia.Wen Ning tornou-se muito vermelho e sentiu-se incapaz de sustentar aquela troca de olhares, mas não se desvencilhou de suas mãos.
— Eu achei que você me odiasse porque eu tinha te abraçado dormindo... - respondeu o Wen, fitando o chão enquanto falava em um tom bastante inseguro e pueril.Bai Renshu ergueu suas sobrancelhas em uma expressão surpresa. Apesar de achar a preocupação de Wen Ning absurda, ele não conseguiu evitar de também achá-la fofa.
— Pra que eu te deixaria entrar e fazer o que quisesse na minha casa se eu te odiasse? - ele perguntou abismado.— Pra me provocar, provavelmente... - respondeu o Wen, em um tom apático e conformado.
Bai Renshu deu uma breve risada e depois disse:
— Bom... isso também! Mas por todos esses anos, desde que minha mãe morreu, apenas duas pessoas podem afirmar que tiveram o privilégio de entrar aqui dentro. E você é uma delas.Sentindo-se um pouco incomodado com o comentário, Wen Ning prestou mais atenção na primeira parte da frase do que na segunda.
"Quem será essa outra pessoa? " - pensou o Wen, deixando escapar uma expressão insatisfeita.Bai Renshu permanecia segurando as mãos de Wen Ning de forma suave, tentando lhe passar confiança. Julgando, pelo semblante do outro, que ele ainda não se sentia satisfeito com a resposta, o Bai continuou:
— Wen Ning, esta casa é o meu templo e o meu coração. Ela é a lembrança mais palpável e pura da pessoa que eu amei e também a única prova de que eu já fui feliz um dia. É algo muito sagrado e importante pra mim, então eu não o deixaria entrar apenas por um mero capricho. Se fosse desse modo, eu não teria motivo para impedir as outras pessoas.Wen Ning engoliu em seco.
"Já foi feliz um dia? Isso significa que agora ele sempre se sente infeliz?" – refletiu o general, sentindo o seu coração apertar.Wen Ning entrelaçou seus dedos nos dele e passou a acariciar suavemente as mãos de Bai Renshu com seus polegares para consolá-lo. Ele apontou com a cabeça para uma montanha de roupas e outras bugigangas que estavam jogadas pelo quarto e, na tentativa de fazê-lo sorrir, disse em tom de brincadeira:
— Um coração bem bagunçado, você quis dizer!Bai Renshu olhou de relance para as mãos entrelaçadas dos dois, deu um suspiro consternado e admitiu:
— Você não imagina o quanto...Wen Ning o olhou de forma indagativa e Bai Renshu se apressou em desviar daquele assunto antes que o General o questionasse. Ele então continuou:
— Além disso, eu não teria motivo para odiar ser abraçado por um amigo.Com o semblante espantado e maravilhado, Wen Ning apertou as mãos dele de maneira ansiosa.
— Você está falando sério?Com essa reação, Bai Renshu finalmente sorriu.
— Oras! Não foi você que me pediu para que eu aceitasse a sua amizade? Não me diga que já está arrependido! - disse fazendo beicinho.Wen Ning voltou a olha-lo nos olhos com um sorriso muito largo e contente.
— É claro que não! - ele respondeu, animado. — Eu fico muito feliz que você tenha me aceitado como amigo. Eu sei que, no fundo, você não é feliz agindo do modo que age, por isso eu espero te ajudar a se sentir melhor, de todo o meu coração!Ao ouvi-lo pronunciar essa sentença, Bai Renshu tornou-se pálido e imediatamente soltou as mãos do General. Sua dor de cabeça, que nunca o houvera abandonado, agora o torturava com ainda mais intensidade.
"Ah, Wen Ning... Acho que você estava certo, no fim das contas. A tal pessoa sensível capaz de me enxergar além do que eu demonstro e de me oferecer sentimentos puros não apenas existe, como infelizmente esteve bem na minha frente esse tempo todo. Você só se esqueceu de considerar que sou indigno o bastante para ter apenas a vil intenção de levá-lo para a cama" - pensou ele amargurado, sentindo uma raiva cada vez maior de si mesmo.O cultivador evitou, a todo custo, levar suas mãos à cabeça ou transparecer que estava sentindo dor para que Wen Ning não ficasse assustado. Apesar disso, Bai Renshu não conseguiu esconder sua palidez e nem o seu olhar transtornado.
— Renshu? - chamou Wen Ning, assim que notou que havia algo errado.
"Ele parece tão triste e perturbado... E porque ficou tão calado? Será que é porque ele falou de sua falecida mãe e tocou naquele assunto sobre ser infeliz?" - pensou o Wen.O cultivador parecia tão absorto em seus pensamentos, que sequer ouviu o seu chamado. Portanto Wen Ning disse um pouco mais alto:
— Bai Renshu! Você está bem?O cultivador levou um pequeno susto e forçou-se a dar um sorriso feliz.
— Oi? Ah... Sim, sim, eu estou ótimo!Wen Ning sabia muito bem distinguir seus sorrisos falsos dos genuínos, portanto não se convenceu.
"Seus sorrisos sinceros são muito mais bonitos" – Wen Ning pensou.
— Você tem certeza? - ele insistiu, preocupado.Bai Renshu lançou ao outro um sorriso de malícia e tentou se desviar daquela pergunta com um flerte:
— A noite está abafada, então provavelmente só estou com um pouco de calor. Talvez eu deva tirar as minhas roupas e entrar aí com você...Wen Ning não sentiu-se envergonhado desta vez. Primeiro porque estava preocupado, e segundo porque aquela mudança forçada de comportamento lhe pareceu mais lamentável do que galanteadora.
"Ele realmente parece o oposto do que está tentando aparentar" - pensou o Wen, entristecido em vê-lo desse jeito.
Pensando em uma forma de tentar confortá-lo, Wen Ning disse:
— Renshu, já que você disse que somos amigos e que você não se importa... será que e-eu po-pode-de-ria...
Wen Ning achou melhor se calar, ou então perderia a coragem. Permitindo-se a agir por impulso antes que sua insegurança lhe travasse por completo, o General puxou Bai Renshu para perto de si e lhe deu um reconfortante e carinhoso abraço.Bai Renshu arregalou seus olhos com o mesmo terror de alguém que acabara de ter seu corpo atravessado por uma espada e empurrou Wen Ning para longe.
O General, que estava ajoelhado, caiu sentado no fundo da banheira e depois ergueu-se ajoelhado de novo.
— Bai Renshu? - ele o chamou com cautela, voltando a se arrastar de joelhos dentro da água.O cultivador não respondeu.
— Renshu?? - ele tornou a chama-lo, dessa vez um pouco mais apreensivo ao vê-lo curvado enquanto se aproximava da beirada.
Wen Ning não obteve resposta e ouviu apenas uma respiração ofegante.
— Renshu! Renshu!! Vc está bem? O que há com você, Renshu??? - disse o desesperado General, enquanto se agarrava às bordas da banheira e assitia o outro com as mãos e os joelhos apoiados no chão, cuspindo um bocado de sangue.
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O Legado da Carne
FanficDois anos após tornar-se independente de Wei Wuxian, seu antigo mestre, o ainda temido e odiado "General Fantasma" tornou-se um andarilho solitário que vagava o mundo eliminando monstros e sobrevivendo humildemente de pequenas recompensas. Enquanto...