Cap. 104 - Refinamento e encanto

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Escondido sob a cabine de uma pequena embarcação, um homem atormentado copiosamente pranteava. Ademais, para seu maior dissabor, a razão de sua lamúria bem de perto o observava.

Aliviado pelo insulamento em que aquele cais se encontrava, Wen Ning desfez-se de sua incômoda indumentária de feno, lavou seu borrado e suado rosto na água fria e saltou da extensa plataforma de madeira para a pequena embarcação atracada.

Surpreendido pelo barulho - mas não ao avistar o seu autor - Bai Renshu arrancou suas ataduras, soltou suas caóticas madeixas, ocultou o seu sofrido cenho atrás de sua cortina de cabelos desalinhados e fez calar as suas lágrimas.

Sentando-se ao lado dele, no mesmo banco, Wen Ning pousou sua mão direita sobre o joelho esquerdo de Bai Renshu e suavemente perguntou:

- Foi por isso que você me pediu para contar até três mil? Para que antes de me escoltar, você tivesse tempo para chorar?

Recebendo apenas o silêncio como resposta, Wen Ning acariciou a região que havia tocado e sinceramente arrependido, lhe falou:

- Renshu, eu sinto muito...

Esquivando-se do toque, Bai Renshu deslocou-se o mais longe que aquele pequeno espaço lhe permitia. Espremido na extremidade da cabine, com seu rosto ainda oculto por cabelos, questionou:

- Sente muito pelo que, exatamente? Por ter mentido para quem só lhe disse a verdade ou pela deliberada intenção de fazer sofrer aquele que nunca, nem por um segundo, alguma vez quis o seu mal?

Decepcionado consigo mesmo, Wen Ning emitiu um longo suspiro e respondeu:

- Pelos dois. Eu me senti ferido e queria que você se sentisse da mesma maneira, mas você tem razão, pois pelo menos no seu caso, nunca houve a intenção de ferir. De verdade, Renshu, eu sinto muito... Eu agi muito mal, me desculpa.

Após limpar seus olhos vermelhos e inchados, Bai Renshu ajeitou os seus cabelos para trás, mirou Wen Ning com um sorriso amigável e respondeu:

- Eu desculpo. Pra mim você é tão importante quanto o ar que eu respiro, eu sempre vou te desculpar.

Reagindo com o mesmo sorriso, o aliviado General o agradeceu. Tornando a deslocar-se para próximo dele, Bai Renshu o mirou com seu esperançoso semblante e arriscou perguntar:

- Mas e você? Consegue me perdoar pelas decisões que eu tomei?

Wen Ning emitiu um suspiro conformado e respondeu:

- Sua vida, suas escolhas. Não há realmente o que perdoar... Entretanto, eu espero que compreenda que aceitar o seu livre-arbítrio, não significa concordar com as suas decisões, e que apesar de eu ter dito aquilo num momento de raiva, eu falei muito sério sobre a impossibilidade de termos um relacionamento romântico.

De cabeça baixa e o coração partido, Bai Renshu respondeu numa voz fraca e amuada:

- Desse "apesar" eu já desconfiava...

A fim de animá-lo, Wen Ning afastou dele os cabelos que haviam lhe caído sobre o rosto e lhe falou:

- Então desconfie, também, que no quesito "amizade" você não é o único a querer fazer isso acontecer.

Mudando completamente de fisionomia, Bai Renshu reergueu sua cabeça em um misto de entusiasmo e incredulidade.

- É sério, Ning? Tipo... sério mesmo? Mesmo MESMO?

Wen Ning assentiu.

Levando as mãos ao peito, Bai Renshu respirou aliviado e desabafou:

- Nossa, Ning... NOSSA! Puta que pariu, nossa... Você não faz ideia de como é bom ouvir isso! Caralho, eu tô muito, muito, MUITO aliviado! Eu estava com um medo tão fodido que você me descartasse daqui sete dias, que não me atrevia nem a tentar imaginar a merda que isso ia dar!

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