Olhos Maldosos

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Como qualquer romance clichê, essa história poderia se iniciar na cama, com o despertador tocando e eu demorando para levantar, reclamando do sono e de ser o primeiro dia de aula na escola nova.

Sim, eu poderia iniciar toda a minha linha de pensamento dessa forma, mas acontece que não sou um desses personagens clichês. O despertador até pode me incomodar, mas trato sempre de acordar antes dele tocar. Também não estou me descabelando por ser o primeiro dia de aula na escola nova e não ter meu melhor amigo aqui.

Em toda a minha vida só tive um grande amigo. Aquele famoso amigo gay que todos os gays tem. O seu nome é Edward, um garoto bem animado e saltitante. Sempre formamos uma boa dupla, com eu sendo o pé dele na realidade e ele sendo a pipa voada, sempre viaja do por aí e atraindo a atenção de todos com seu jeito. Não ter o Ed aqui no começo do ano, certamente dificultou mais minha adaptação, mas não é nada que não possa lidar.

Afinal, é só o primeiro dia de aula.

Desço a curta escada que me leva a cozinha, vendo meu pai cuidando das panquecas. Daniel Dallas é um já calvo, mas que não perdeu seu porte atlético e ainda faz bastante sucesso com as mulheres.

Ele se separou de minha mãe quando eu era pequeno, ficando com a minha guarda e com a do meu irmão Zayn. Zayn é o que eu chamaria de "valentão" que não é um valentão. Ele tem toda a pinta de um cara que faz bullying, mas nunca o fez, pelo menos não fez com ninguém de fora. Comigo a coisa é diferente. Ele se afastou no momento em que me descobri gay.

Esqueço esse detalhe. Zayn não é nada para se pensar numa hora dessas da manhã.

- Bom dia pai, dormiu bem? - Pergunto pondo um grande pedaço de torrada na boca.

Ele não se vira na minha direção, pois está mexendo numa frigideira com ovos mexidos que estão prestes a queimar. Ele nunca foi de cozinhar...

- Bom dia meu filho! Dormi muito bem, mas agora estou preocupado com um possível incêndio aqui... Talvez você fique sem comer ovos hoje. - Atestou indicando a panela.

- Sem problemas, qualquer coisa eu como algo no caminho ou na escola.

- Ok. - desligou a panela, jogando-a na pia da cozinha para esfriar. - Preparado para sua escola nova?

Ele me perguntou com os braços apoiados na mesa.

- É uma experiência que eu poderia facilmente evitar, mas que pode ser uma experiência muito boa para mim. Escola nova significa ampliar meus horizontes.

- Sempre gostei desse seu jeito otimista de ver as coisas, filhão. - Tocou meu ombro.

Meu pai sabe que sou gay e tem orgulho de mim. O dia que eu me assumi não foi difícil, eu simplesmente falei a verdade e ele disse que já imaginava.

- É sempre bom ser otimista pai. Me leva no meu primeiro dia? - Pergunto me levantando e pegando uma fatia de melancia para comer no caminho.

Ele concordou, nós saímos de casa e entramos no carro. Logo estávamos a caminho da escola. A quantidade de tempo que levaria para ir a pé, foi apenas menos da metade de carro. Assim que ele parou, deixei um beijo no rosto do meu pai e me despedi.

- Até pai! Vem me buscar?

- Hoje não dá, filhão. Vou trabalhar bastante hoje e vai ter que ir a pé ou pegar um táxi. Quer dinheiro?

- Tenho o da mesada aqui. - Digo mostrando a notas de dinheiro enroladas e as coloco no bolso. Sempre tive uma mente de economia, a mesada eu só gasto quando quero muito alguma coisa ou quando é necessário.

Paro em frente a escola, vendo a legião de alunos caminhando, conversando e bagunçando. Identifico todos os grupinhos, divididos por gostos e estilos diferentes. Acredito eu que vou me encaixar no grupo com o máximo de gays possível. Não sou daqueles que só anda com pessoas iguais a mim, mas é mais fácil me adaptar a tudo com pessoas iguais a mim.

Também evito o risco de me aproximar de algum hétero homofóbico.

Lugares cheios são bons na minha opinião. Gosto do movimento, do caos. Assim que estou alcançando a diretoria, me encontro contra algo duro e vou direto para ao chão. Minha bunda dói e posso sentir minha coluna se comprimindo. Ergo meu olhar, encontrando um garoto com os cabelos escuros e bagunçados. Uma pele branca, olhos da mesma cor dos cabelos e bem alto. Pelo aperto da camisa em seus braços, só posso imaginar que é bem musculoso.

- Olha por onde anda seu merdinha! - Esbraveja, olhando de cima para baixo em minha direção.

- Sinto muito, mas talvez se você tivesse um pouco mais atenção e educação... - Sou interrompido quando ele me ergue com seu olhos maldosos e um sorriso de canto.

- É mesmo... Já estou percebendo uma coisa. Você é a porra de um veadinho. - ele riu e só então percebi alguns colegas dele atrás. - Olha aqui pessoal, ele é uma bichinha!

Tá bom... Não vou dizer que não tenho tenho trejeitos pois eu tenho. Acho que ele percebeu por que eu fico gesticulando de mais com a mão e minha voz sobe algumas oitavas em certos momentos. Primeiro dia e já me encontro com um homofobico gostoso.

- A gola da minha camisa está rasgando. Pode me soltar? - Pergunto sentindo um pouco de medo pelo que ele pode me fazer.

- Quer que eu te solte? Quer? Tá bom!

Um soco muito bem dado em minha boca e já estou de volta ao chão. As pessoa ao redor riem ou ignoram aquela situação como se fosse corriqueiro. Uma bela merda!

Eu apenas encaro meu novo algoz, meu demônio com olhos maldosos se afastando, debochando de mim com seus lacaios.

Uma ótima forma de começar na escola nova.

















Apaixonado Pelo Valentão - ShameronOnde histórias criam vida. Descubra agora