Capítulo Sessenta e Seis

150 10 18
                                    



O dia estava caindo, junto com uma chuva daquelas. Dormi um pouco quando cheguei do hospital, bloqueando os barulhos que Micael estava fazendo no quintal, com madeiras velhas. Me sentei ao seu lado quando o vi folhear um livro grosso, bastante entretido.

— O que está lendo? — Me apoiei em sua perna.

— Young and The Restless. — Colocou o marca texto na página onde estava, fechando um pouco para eu poder visualizar a capa.

— É sobre o que? — Me interessei.

— Um casal de amigos, ela transa com ele e engravida mas não pode contar à ninguém porque ele tem namorada! — Fiquei um pouco incrédula. — É uma trilogia, o final é sensacional.

— E como você sabe o final sendo que está lendo o primeiro? — Segurei meu riso.

— Porque eu soube da história. Fez muito sucesso na época! — Deixou o livro de lado, segurando o meu rosto. — Ela e o marido morreram com o gás do ar condicionado. Dá para acreditar? — Micael sorriu, gostando da ideia.

— Você está pensando em matar o seu pai com o gás do ar condicionado? — Levantei uma sobrancelha.

— Eu preciso pensar em uma boa solução. — Ficou em transe. — Não posso agir agora, ele pode aparecer à qualquer momento. Isso estragaria o plano!

— Você não acha que está sendo rude demais? — Nos encaramos. — Eu sei que ele é uma péssima pessoa e judia de mulheres, mas, ele é o seu pai! O homem que te deu a vida!

— O homem que matou a minha ex-namorada e quase estuprou a minha mulher. Você ainda sente dó desse filho da puta?

Micael se levantou, andando de um lado para o outro.

— Eu acho ridículo você querer matar o seu pai. — Me levantei com um pouco de dificuldade, sentia o meu corpo pesado, quase parecido com gripe. — Eu sei que ele é o seu pai mas... Isso não faz sentido algum!

— Tudo bem, então, vou deixá-lo vivo para fazer mais mulheres de refém e ter um trabalho escravo, onde precisam dar a boceta para não morrer num cubículo. — Micael buscou um maço de cigarro.

— Você vai fumar? De novo?

— Eu não fumei ainda. — Tinha um cigarro entre os lábios. — Quer um? — Me ofereceu.

— Deveríamos parar de fumar. — Alisei o balcão de mármore, vendo Micael acender o cigarro no cooktop.

— Eu não acho. — Tragou a fumaça. — Fumar é a solução de todos os meus problemas! Se eu tenho um problema? Eu fumo! Se eu brigo com você? Eu fumo! Se alguém me irrita como Tina? Eu fumo!

— Você e a Tina nunca vão se acertar?

— Entenda Sophia, eu odeio a Tina. — Tragou a fumaça novamente, me observando. — E agora que ela está praticamente todos os dias aqui, isso me irrita bem mais.

— Ela vai casar com o Francis.

— Para o inferno ela e Francis. Eu não ligo para mais nada! — Deu de ombros. — Só acho que deveríamos diminuir as visitas dela aqui em casa.

Achei o cúmulo! Tina era o meu porto seguro mesmo estando longe em alguns momentos.

— Você não entendeu que ela e o Francis vão se casar?

— Eu já disse que não ligo, Sophia. — Apagou o cigarro mediano no mármore, aquilo me irritou um pouco. — Vou tomar um banho, você vem?

— Não, obrigada. — Desviei o meu olhar quando Micael subiu às escadas, sem dizer nada.

Não havia conseguido dormir direito naquela noite. Me virei praticamente em todos os minutos, observando o relógio que tínhamos em nosso criado mudo. Micael tinha os braços enlaçados em meu ombro, me deixando mais irritada por estar um pouco quente, e o ar condicionado não estar dando conta.

Quando o sol nasceu, eu já estava de pé, banho tomado e roupa no corpo. Micael se assustou quando me viu ajustar a roupa em frente ao espelho, passando um perfume.

— Onde você vai tão cedo? — Bocejou. Tinha os cabelos bagunçados do jeito que eu gostava.

— Preciso ir em casa.

— Essa é a sua casa!

— Na casa da minha mãe. — Rolei os olhos. — Ela precisa da minha ajuda para algumas massas.

— Você vem para o jantar?

— Sim, eu vou chegar cedo. — Dei um beijinho rápido em seus lábios.

— Não quer que eu te leve? — Se ofereceu.

— Eu sei me virar sozinha. — Sorri doce à Micael, dando às costas e descendo.

Antes de chamar um táxi, consegui tomar um bom café que me enjoou cinco minutos depois. Durante o caminho, pedi que o taxista passasse em menos buracos com uma velocidade reduzida. Fora o trajeto, onde passamos em uma rua com cheiro de esgoto. Simplesmente Bordéus...

Estava em frente ao hospital com o coração pulando pela boca. Conversei com a recepcionista que me encaminhou para o médico do dia anterior, bonzinho e compreensivo.

— Sophia, como passou a noite? — Fechou a porta quando passei, me viu sentar na poltrona em frente à sua mesa.

— Não consegui dormir. — Encarei um envelope branco, em cima da mesa. — Esse é o resultado?

— Sim, o resultado está aqui! — Sentou-se e colocou a mão em cima, me deixando mais aflita. — Está pronta?

— Acho que sim. — Sorri nervosa, esfregando as minhas mãos como se estivesse cometendo um crime.

E estava cometendo um crime, sob os olhos de Micael que mal sabia a metade da história!

— Parabéns! Você está grávida! — Me mostrou o exame completo, onde não entendi nada.

Estava grávida! Grávida! Meus olhos se encheram de lágrimas com um misto de sensações sem fim. Estava feliz, com medo, pressionada, leve, sem explicações para o que aconteceria à seguir.

— Está feliz? Era o que você queria?

Não consegui responder, meu aceno de cabeça deixou o médico satisfeito. Ele guardou o resultado novamente no envelope.

— Era, era sim. — Respirei fundo, secando as minhas lágrimas.

— Você precisa tomar todos os procedimentos agora. Precisa procurar um obstetra e seguir com o pré-natal. — Aaaaaah.

— Pré-natal? — Fiquei um pouco em transe. — Obstetra?

— Você já ouviu falar. Ou não?

— Sim, eu já ouvi falar sim. — Fiquei cabisbaixa. — O senhor poderia me indicar algum?

— Essa lista deve ser essencial para você!

O médico tirou uma folha da segunda gaveta, com nomes em negrito e ao lado números de telefones. Por sua explicação, esses seriam os melhores obstetras de Bordéus com preços exuberantes até preços acessíveis. Guardei em minha bolsa, junto com o exame.

— Obrigado por ter me ajudado. — Agradeci o médico quando estava indo embora.

— É sempre bom ajudar o próximo, Sophia. Qualquer coisa que se sentir estranha, pode voltar aqui! — Sorriu leve, me acompanhando até à porta.

— Até mais. — Trocamos sorrisos até eu conseguir sair do hospital.

Sete Pecados Onde histórias criam vida. Descubra agora