Penúltimo Capítulo

178 8 10
                                    



Dois anos depois.

Eu não sabia o que realmente havia acontecido comigo. Meu corpo estava doendo quando abri os meus olhos, apertando, até me acostumar com a claridade. Um quarto de hospital apareceu, ao lado esquerdo, mamãe, que regava a flor que estava dentro de um jarro bonito. Do outro lado, uma enfermeira, que verificava alguns remédios em uma bancadinha improvisada.

Não sabia de fato o que estava acontecendo.

— Oi, querida! — Mamãe se aproximou, falando suavemente perto de mim, com medo de me assustar. — Como você está?

— Acho que... Bem. Eu não sei! — Fiquei sem entender. — Por que eu estou aqui? — Vi o acesso em minha mão.

— Vamos lá, é difícil te contar mas eu preciso te dizer. — Mamãe se preparou. — Você saiu da escola com as meninas, no dia da festa de Bordéus. Você se lembra?

Franzi meu cenho, ainda sem entender nada. O que de fato havia acontecido?

— Seu pai te deu ordens para não sair, mas você acabou saindo, indo para a festa de Bordéus, que aconteceu na praça. Tina me disse que se perdeu de você, enquanto você estava com Amélie, em um bar. — Me contou. — Parece que lá, você conheceu um moço, onde conversou com ele e até debateram um pouco. Depois disso, você saiu de lá descontrolada, com medo de ter se perdido das meninas e enfim, acabou tendo um acidente.

— Um... Acidente? — Fiz uma careta. — O que aconteceu comigo?

— Um carro atropelou você e... Você se desligou! Ficou em coma, por dois anos.

Minha ficha não havia caído, ainda. Fiquei em transe após mamãe dizer aquilo, me deixando desconfortável em cima daquela cama. Tive uma crise de pânico, vendo a enfermeira se aproximar de nós.

— Está tudo bem, Sophia! É normal você ter essa reação. — Ela mexeu em meu acesso, a agulha começou a doer no meu braço.

— Não, não, não, não. — Neguei diversas vezes. — Então nada disso aconteceu? O Borges não morreu? E o Alexander não vai estrear o filme do Micael? Enquanto Marjorie e o casamento da Tina com Francis?

Mamãe encarou a enfermeira com medo, negando com a cabeça. Passou a mão no rosto antes de se levantar, beijando a minha testa.

— E Charlotte, mamãe? — Segurei em suas mãos, fazendo a pergunta mais cruel de todas.

— Querida, quem é Charlotte? — Ficou sem entender.

Comecei a chorar, desesperada. Um frio na espinha tomou conta de mim.

— Tem uma pessoa que quer ver você! — Mamãe sorriu, me deixando sozinha, sem a enfermeira, que também saiu.

Micael passou pela porta. Estava diferente! Diferente do dia em que nos conhecemos, já que, eu havia ficado em coma e nada daquilo havia acontecido.

Estava com um buquê de flores nas mãos, me entregando.

— Oi. — Sorriu. — Como você está?

— Eu fiquei em coma. — Soltei. — Por dois anos! Dois anos!

— Foi um acidente muito cruel. Todo mundo na cidade comentou, pensamos que você não resistiria! — Puxou uma cadeira para se sentar. — Eu fiquei super culpado com o que aconteceu, naquele dia.

Fiquei apenas escutando.

— Ajudei sua mãe nas suas cirurgias e também, na sua internação. — Soltou. — Minha vida agora é em torno desse hospital, eu não saio daqui desde o dia que você entrou em coma. Eu fiquei vindo, por longos dois anos.

— Impossível. — Achei graça. — Eu só te vi uma vez.

— Eu gosto de você, Sophia. — Segurou a minha mão. — E aquele dia no bar...

— Nada daquilo aconteceu, então? Você nunca me bateu, nós nunca transamos, nunca nos casamos, o seu pai não é um mafioso e a sua mãe não é lésbica! — Comecei a chorar, de novo. — E nossa filha não existe, que inclusive, você escolheu o nome.

Micael arregalou os olhos, sem entender nada. Balbuciou algo mas não conseguiu terminar.

— Pera aí, você sonhou tudo isso enquanto estava em coma? Uou! — Se impressionou. — Realmente, isso é chocante.

— Não, isso é louco! Doentio! — Senti raiva. — Eu pensei que te conhecia mas vi que fiquei a minha vida toda entravada numa cama de hospital. Eu não acredito nisso! — Grunhi de raiva, secando as minhas lágrimas. — Só pode ser um pesadelo!

— Pera aí, você queria então que eu te batesse? — Micael fez uma careta.

— Esquece isso. Eu poupei dois anos da sua vida, então, posso trabalhar para pagar a conta do hospital. — Fiquei em transe. — Obrigada por você ter salvo a minha vida! — Sorri falsa.

— Será que você ainda não entendeu? — Micael chegou mais perto.

— O que?

— Eu gosto de você, Sophia! Desde aquele dia, eu gosto de você! Eu, eu... — Procurou palavras. — Eu quero ficar com você. Te conhecer melhor...

Nos encaramos, uma sensação esquisita. Foi como se tudo acontecesse, de novo.

— Podemos fazer tudo isso do seu sonho, menos na parte em que eu te bato. Por favor! — Me fez soltar um riso.

— Isso é... Doido!

— Não, isso é a realidade! — Sorriu.

— Só para constar... — Micael levantou as sobrancelhas. — Você ainda odeia a Amélie?

Micael soltou um riso, abaixando a cabeça.

— Ela melhorou um pouco mas ainda sim, não acho ela uma boa companhia para você. — Pelo menos isso ainda era real!

— E Tina?

— Nem se fale. — Foi minha vez de rir.

Micael me trouxe à realidade aos poucos, me explorando dois anos perdidos em algumas horas. Ficamos conversando sobre a vida, o acidente, ele me viu chorar e surtar três vezes seguidas, depois de recitar alguns poemas que me deixaram mais aliviada. Quando se deu conta, já era tarde! Mamãe, papai e Anthony haviam chegado, matando a saudade dos meus dois anos perdidos.

Ainda seria estranho falar isso, pois sim, foram dois anos perdidos.

— Você vai ter alta amanhã! Depois de alguns exames. — Papai me contou, super feliz.

— Ótimo! Eu conversei com a sua médica... Podemos comemorar a sua saída! E Micael está mais que convidado.

— Eu? — Se impressionou. — Não quero incomodar a volta da Sophia para casa.

— Incomodar? Jamais! Sophia deveria ter orgulho de você, jovem. — Papai o elogiou. — Somente um cavalheiro faz isso que você fez. Entregar dois anos da sua vida à minha filha, que estava em coma.

— Realmente, é surpreendente. — Mamãe sorriu. — Venha conosco até a nossa casa de praia.

— Eu... — Micael ficou sem graça. — Juro, eu não quero atrapalhar ninguém.

— É o máximo que eu posso fazer por você, Micael! — Disse calma, vendo que ele estava sem graça. — Vamos, por favor.

Ele assentiu, ficando corado. Anthony deu risada antes de zoa-lo com suas piadinhas chatas. Mamãe e papai ficaram felizes com a resposta do convite, conversando o que seria feito amanhã, logo após a minha saída do hospital.

Sete Pecados Onde histórias criam vida. Descubra agora