Sete Pecados

Capítulo Setenta e Dois

— Oi. Francis? Ah, é você! Pode passar ao Francis, por favor? Obrigado.
Francis? Sou eu, Micael! Estou na clínica, o procedimento em Sophia foi feito, ela ficará de observação. Qualquer coisa sobre a vernissage você pode me ligar. Ok? Obrigado!

Ainda estava grogue quando abri os meus olhos devagar. Conseguia escutar tudo ao meu redor, mas não conseguia interagir com tudo e com todos. Fui abrindo devagar, identificando aonde eu estaria, tentando lembrar o que havia acontecido.

— Querida. — Micael segurou a minha mão, beijando em seguida. — Você está bem? Sente enjoos ou tontura? — Ficou preocupado.

Minha cabeça não estava raciocinando direito, alguns flashes vinham na minha cabeça mas nada que fosse mais além. O encarei, franzindo o meu cenho. Eu parecia ter levado um soco no rosto, de tão desnorteada.

— O que aconteceu?

— Você está livre agora! O médico colocou o DIU e conseguiu realizar todo o procedimento. Você reagiu bem, querida! — Micael soltou um risinho.

E logo fui lembrando que não estava em uma clínica obstetrícia e sim em uma clínica de aborto. Encarei a parede em transe, tremendo como um cachorro de bolsa, com raiva e ódio. Não tive muita força para fechar os meus punhos, sonhando em matar Micael com uma faca na garganta ou algo do tipo.

— A parte ruim é que precisamos ficar três dias sem sexo, pelo menos. — Micael riu pelo nariz, beijando a minha bochecha.

Ódio! Eu estava sentindo ódio por dentro!

— Você é o próprio demônio. — Tremi os meus lábios, lhe fuzilando com o olhar. — Eu gostaria tanto de quebrar a sua cara, cortar a sua jugular e beber a porra do seu sangue. Seu doente! DOENTE! — Gritei, começando a chorar.

— Querida...

— VÁ PARA O INFERNO! — Gritei mais ainda. — COMO VOCÊ CONSEGUE SER ASSIM? COMO? — Eu não conseguia entender.

Coloquei as mãos em minha cabeça, desnorteada. Estava chorando tanto que senti minha visão ficar turva, passando mal. Micael tentou me acudir mas não queria suas mãos em mim, eu estava com nojo. Ódio! Eu mataria ele se alguém me desse oportunidades.

— Sophia, eu fiz o que tinha que ser feito!

— Matar o seu filho é o que tinha que ser feito? Quanta honra, Micael! — Cerrei os dentes e tremi mais ainda. — Como você tem coragem de dizer isso para uma mãe?

— Eles não estavam formados, Sophia. Eram fetos! Fetos que não estavam formados, poderiam morrer de qualquer causa natural.

— Você é médico por acaso?

— Eram gêmeos! Eu não tenho genes com gêmeos, você não tem genes com gêmeos! Poderia nascer defeituoso ou algo do tipo. E se você morresse? Hein? No parto! Já pensou nessa possibilidade?

— Você já me matou naquela sala, Micael! Eu morri ali dentro, enquanto você me dizia que tudo iria ficar bem. — Engoli seco. — Mais uma vez eu acreditei em você e fui enganada!

— Ninguém mandou você mentir.

— Entendi. — Fui irônica. Desviei o meu olhar dele, focando na parede em minha frente. — Quanto tempo irei ficar aqui?

— Até à noite! Você está de observação e assim podemos ir embora.

— Eu não vou embora com você! Eu não vou voltar para a casa com você!

Micael não entendeu o sentido da frase.

— Vai ir embora com quem, então?

— Vou pedir para que Tina me ajude com as minhas coisas. Casada com você eu não fico mais!

Micael arregalou os olhos, um pouco desesperado.

— VOCÊ NÃO PODE FAZER ISSO!

— E VOCÊ NÃO PODIA FAZER O QUE FEZ COMIGO! ABORTAR UMA CRIANÇA, MICAEL? ALIÁS, DUAS CRIANÇAS!

— VOCÊ MENTIU PARA MIM! VOCÊ TIROU A PORRA DO DIU QUANDO CONVERSAMOS QUE NÃO IRÍAMOS TER FILHOS! POR QUE VOCÊ MENTIU PARA MIM? — Gritou nervoso, rolando os olhos e saindo de perto.

Andou de um lado para o outro, nervoso. Coloquei as mãos no meu rosto, estava suando frio.

— Eu não quero mais saber de você! Eu não quero mais viver essa sua vida doente de merda, entendeu? Eu cansei! — Gesticulei. — Eu cansei de tentar te ajudar, eu cansei de me doar para você!

— Então é isso que você vai fazer?

— Hoje, literalmente para mim, já deu! — Pausei. — Acho melhor você se tratar primeiro para conquistar a vida dos sonhos. Doente de merda!

Vi Micael me fuzilar com o olhar. Recebemos o médico na sala, com uma prancheta.

— Sophia, como você está? Sente tonturas, enjoos, formigamento?— Me examinou com uma lanterna fina para os olhos, quase me deixando cega.

— Me sinto uma merda, doutor. E o senhor deve se sentir bem mais! Matar os meus filhos e fingir que está tudo bem. — Fui irônica.

O médico e Micael me encaravam, ele estava bem sem graça diante da situação.

— Sophia, o procedimento...

— Eu não quero saber da porra do seu procedimento. — Fui sincera. — Eu quero alta para sair desse inferno, e a primeira coisa que irei fazer é te denunciar. Entendeu?

— Como você quer me denunciar sendo que aprovou o aborto?

— EU NÃO ASSINEI NADA!

— Mas o seu marido assinou por você! Sendo assim, a justiça não pode fazer nada. — O médico parecia bem tranquilo. — Sua alta sairá no final da tarde. Enquanto isso, peço repouso absoluto. — Deixou uma prancheta na ponta da minha cama. — Fique bem, Sophia.

Não iria ficar bem a não ser que eu fosse embora! Micael estava no canto do quarto, me observando, com uma cara de derrotado. Não quis contato visual, pelo menos por enquanto.

Retirei o lençol branco da clínica sentindo um desconforto imenso no meio das minhas pernas, logo percebi que estava de fralda descartável.

— Que merda! — Disse baixo, saindo da maca. Micael correu para me ajudar mas o afastei, não queria nada que viesse com ele. Até mesmo sua ajuda.

— Sophia, você precisa de repouso.

— Por que você não vai se foder, hein? — Mostrei o dedo do meio, andando devagar até o banheiro que havia no quarto.

Me tranquei lá dentro, me sentando no sanitário e me acabando de chorar. Eu só queria ter uma família normal, uma vida normal. Filhos, uma casa com vida, conversas saudáveis e nada que me deixasse triste. Por que tinha que ser assim? Por que Micael era assim?

— Eu preciso viver a minha vida! — Fui corajosa ao soltar, secando as minhas lágrimas e respirando fundo.

O próximo passo era deixá-lo! Ser feliz com outra pessoa que me aceitasse, sem esse mundo de loucuras.