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Olho o trem passando ao longe, do outro lado, no alto da Cidade, há uns dez minutos de distância. Paro o carro de uma vez, encostando a testa no volante, sentindo meu peito doer, as lágrimas banham meu rosto e a dor só cresce em meu peito. É angustiante, dói tanto que parece que eu vou explodir, inchando meu coração e o esfaqueando repetidamente. Três, hoje eu perdi três pessoas na qual eu amava, a traição de uma delas nem se compara a dor que sinto agora. Eu perdi minha irmã, a qual dividiu o útero comigo e mesmo assim eu não convivi nem metade da minha vida com ela, eu sinceramente achava que dava para recuperar os dezessete anos perdidos, mas eu recuperei só cinco. Eu perdi minha gêmea, minha outra metade, ela era igual, mas também muito diferente. Ela sempre sorria enquanto eu estava de cara fechada e me trazia o amor quando eu me sentia sozinho, me deu um filho, mesmo sem ter certeza de se eu merecia e isso tudo apenas por amor.

Saio do carro, à procura de ar fresco, me encolhendo em cima do capô. Abraço meus joelhos afundando meu rosto, soluçando, morrendo por dentro, eu sinto minha alma se partir, como um grande caco de vidro, trincado. Estou como um quebra cabeça, faltando uma grande parte. Eu não sou nada sem eles.

— Hayden...— Quira tenta me abraçar, mas eu a afasto — deixa eu te abraçar?

— Eles não mereciam nada disso, Quira. Mel, toda a sua vida sofreu bem mais do que eu e mesmo assim, conseguiu manter o sorriso no rosto. Ela era minha versão feminina, idêntica a mim, minha irmã, eu era a raiva e ela a alegria, sempre foi. Asafe era meu bebê, meus pequenos olhinhos azuis no qual eu mal conseguia estudar na faculdade, de tanta saudade que eu sentia da sua risada, a primeira palavra que ele falou foi papai, eu era o pai dele, eu era...— as palavras ardem, aperto meus cabelos com força.

" — Hayden, vem jantar! — tiro os olhos dos meus livros e vejo Mel na porta do meu quarto, com um pano de prato no ombro e um vestido preto curto, de festa. Arqueio a sobrancelha.

— eu vou jantar e você vai para onde? — ela sorri largamente.

— primeiro diz, estou gata? — dá voltinha e eu analiso seu visual, sorri de canto.

— Feia demais, qualquer homem vai correr, eu estou quase fazendo — ela taca o pano de prato em mim e eu dou risada.

— fala sério, de zero a dez? — analiso de forma critica o vestido combinando com os saltos e provavelmente com a bolsa que virá, seus cabelos naturais soltos e brincos grandes. No rosto uma maquiagem preta noturna, porém discreta. Essa menina é realmente linda.

— gatissima, se não fosse minha irmã em... — brinco, fechando os livros e ela sorri — vai para onde, gata? Volta que horas? — abraço seu corpo, a suspendendo do chão e caminhando até a cozinha.

— eu não, NÓS iremos até uma baladinha que abriu, vá se arrumar! — arquei a sobrancelha, a soltando. Vou até o sofá, vendo meu neném deitado na cobertinha.

— oxi, está louca? Minha semana de provas é daqui três dias! — pego meu filho, dando um beijo em sua bochecha.

— louca não, visionária! — a olho em como assim? — saca só, você é um gênio irmão, só precisa do quê?

— estudar? — respondo e ela bufa com ódio, dou um sorriso em humor.

— Não! Você precisa descansar a mente. O que é melhor do que uma festa, para distrair a cabeça? Nada! Sem contar que terá tempo.

— nosso filho, não vai ficar sozinho! — argumento e ela sorri — aff, tem baba né? — ela assente — mas ele quer o pai, não é bebê? Fala papai! — olho para meu filho, dou cheirinho em seu pescoço e ele ri — aah, cadê o sorrisão do tio Hayden? Cadê?

Silênt nigthOnde histórias criam vida. Descubra agora