42 - Gerard

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- Frank, você precisa parar de chorar. – Sussurrei, um tanto quanto fraco, após acordar, na manhã seguinte, com ele ainda agarrado à minha mão. Os dedos coloridos apertando os meus, com todo o cuidado do mundo, enquanto o rosto pendia diretamente em direção a mim, as bochechas e olhos avermelhados denunciando que havia continuado a choramingar durante toda a manhã, enquanto eu estava dormindo.

- Mas e se algo acontecer com você?! Eu deveria estar de olho, eu... – Frank iria começar a lamuriar e por mais que eu achasse adorável como os lábios vermelhos se curvavam em quase um biquinho, apoiando os cotovelos sobre a cama onde eu repousava. Eu podia ver seus olhos cor âmbar reluzindo pelo fiapo de luz que adentrava a janela entreaberta do quarto, ao meu lado direito, assim como destacava sua expressão cansada, as olheiras atenuadas com a noite mal dormida, o cabelo curto já conseguindo ficar completamente bagunçado e arrepiado em alguns pontos, e todos os sinais que deixavam óbvio que Frank havia passado a noite com os olhos pregados em mim, enquanto eu estava dopado por analgésicos. – Você acordou melhor hoje?

- Um pouco... É bom ver você assim que eu acordo, ainda mais em um lugar desses... – Resmunguei, sentindo meus músculos retesados, as pernas fracamente esticando-se na cama, a fim de senti-las um pouco melhor. Por mais que eu gostasse de dormir, ficar deitado e descansar, aquelas horas de repouso me deixavam inquieto, ainda mais quando Frank chorava e me segurava com tanto desespero. Eu não podia amparar como queria e assistir ao meu pequeno se sentir tão culpado por tudo era ainda pior. – O médico disse que posso receber alta amanhã ou hoje à noite. Você não precisa se desesperar...

- Claro que preciso! Você ouviu o que o médico disse! É um princípio de cirrose... Cirrose... – "Hepática", eu concluí, sussurrando baixo, sentindo o gosto amargo daquilo me percorrer, o olhar afastando-se do rosto de Frank para encarar o teto do quarto branco. Ele continuou a falar, claro, preocupado, alisando meus dedos com cuidado, até a palma da mão, aproveitando-se de que aquela estava livre do soro injetado na oposta, me fazendo mantê-la repousada ao meu lado na cama. – Você precisa cuidar melhor de si... Vou procurar algumas receitas leves para as próximas semanas... E você vai parar de beber. Nem um gole de qualquer merda que contenha álcool!

E escutar Frank me dar aquela bronca fez com que eu sentisse ainda mais o peso de todos aqueles anos sendo irresponsável comigo mesmo sobre meus ombros. Era complicado, era um vício que eu achava que havia tratado, mas, aparentemente, os frutos de minha adolescência ainda estava ali, fixos em mim, criando raízes que eu ainda possuía certa vantagem para cortar, me livrar daquilo. E aquele último surto, toda a noite terrível que tive por pura teimosia. Se aquilo se alastrasse, se fincasse em mim um pouco mais, sabe-se lá o que seria de mim. Eu teria que parar e, agora, em definitivo.

Mikey já havia me dado uma bronca semelhante, muito mais gritada e irritada do que a manha de Frank, assim que me encontrei acomodado naquele quarto, longe da emergência, no exato instante em que o resultado de meus exames chegaram e nós dois tivemos que lidar com aquele drama familiar novamente. E o desconforto só crescia, só transitava para algo pior, ao saber que Mikey teria que lidar com aquilo de novo e ainda por cima sozinho, sem nossos pais para aguentar toda a barra. E o pior: agora com Frank, de quem eu havia escondido tudo aquilo por todo aquele tempo, apenas para que ele não tivesse que se submeter àquele tipo de coisa.

Desde que ele havia adentrado aquele quarto, eu evitava fixar meu olhar no dele, sentindo toda aquela vergonha me percorrer. E tudo piorou quando eu tive de lhe contar o que havia acontecido ao certo, que deveria tomar alguns remédios e que tudo aquilo era fruto de bebida e má alimentação. E escutar o sermão de Frank talvez fosse tão pior quanto ouvir meu irmão gritar. Pois Frank chorava copiosamente, acertando tapas no colchão da cama onde eu repousava, por saber que não poderia me bater por minha sublime estupidez naquele momento. Pior ainda foi não poder ampará-lo, quando se encolheu sobre o sofá antigo do quarto, resmungando que ele deveria ter me seguido até o bar naquela noite, que não deveria ter me deixado nem por um segundo sequer.

Surrender The Night || Frerard versionOnde histórias criam vida. Descubra agora