66 - Gerard

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- O que você está fazendo aqui? – Donald se achou no direito de exclamar, fechando a porta atrás de si em um baque desnecessário, ao mesmo tempo em que deixava seus ombros ligeiramente baixos, notando que havia algo bem claro em sua postura altiva que não denotava mais que havia construído aquela barreira ao seu redor. Ela havia sido quebrada e o mais inacreditável: pelo pai de Frank.

- Aparentemente, o mesmo que você: visitando o seu filho. – O Frank mais velho parecia calmo... Mas eu sabia que somente "parecia" pela maneira com que seu filho se comportava ao meu lado, não mais tão próximo de mim ou curvado contra meu rosto, naquele beijo doce e interrompido por meu pai, mas sim agarrado em minha mão. Eu não podia fazer muito mais do que entrelaçar nossos dedos e afagar as costas de sua mão com o polegar, tentando fazer com que ele parasse de tremer. – Aliás, não estamos fazendo a mesma coisa... Parece que você veio repudiar Gerard por alguma coisa. Algum problema, James? Algo que queira repartir conosco?

Foi ali que eu vi tanta coisa, que, se eu não estivesse doente, preso a uma cama de hospital, eu teria de fato corrido para fora daquela sala, arrastando Frank comigo, apenas para não lidar com as inúmeras possibilidades e teorias que partiram meu cérebro em mil pedaços. A começar por Frank chamar Donald de James, o segundo nome... O que poucos conheciam e que sequer minha mãe mencionava. Aliás, eu me lembrava muito bem de uma das vezes em que o chamou assim, docemente, após preparar uma refeição para a família no dia dos pais, recebendo gritos em resposta.

E, pela primeira vez, em anos, os gritos de meu pai fizeram sentido quando se calou bruscamente, sem palavras para cuspir em minha cara, sem colocar meu namorado no chão ou sequer começar uma discussão estúpida sobre como ele via aquilo como algo nojento. Enquanto aquela pessoa que ele tanto menosprezava era a única no mundo, se não levarmos Mikey em conta, que significava realmente família para mim.

Quase agradeci ao Iero mais velho por conseguir afetar meu pai, desarmando-o assim, quando me veio a enxurrada de questões, um tanto quanto tardiamente. Talvez fosse pelos analgésicos que havia tomado para fazer o último exame, causando aquela clara exaustão em mim. Enfim, aos poucos tudo se transformava em afirmações e duas delas estava bem sólidas diante de meus olhos: o pai de Frank conhecia Donald mais do que o esperado e, por fim, tinha um poder nítido sobre ele, algo que era brutal o suficiente para visivelmente transformar meu pai em um rato acuado.

- O que está acontecendo aqui?! E como vocês dois se conhecem?! – Frank deu voz aos meus pensamentos e eu o vi claramente mudado, não só fisicamente, mas por sua firmeza. Seus dedos poderiam estar gélidos e tremulando contra os meus, mas sua voz era uma clara expressão de determinação em saber da verdade. – Pai! – Ele conseguiu com que o mais velho o olhasse aturdido, lhe dando uma resposta com notável pitada de nervosismo em sua face. Os Iero eram mesmo péssimos com mentiras, ao contrário de meu pai. E, na medida em que Frank nos falava os fatos, eu o interpretava pelas alterações de humor de meu pai e em como ele conseguia ainda ser tão falsamente impassível.

- Nós dois nos conhecemos na guerra... Quer dizer, fazíamos parte de um clube de remo em Nova Jérsei, depois nos reencontramos no mesmo regimento, mas servimos em alto-mar por um bom tempo. – Enquanto o Iero mais velho mexia nos cabelos grisalhos, como o filho fazia ao enrolar-se para contar a verdade, Donald era mais evidente, sem despregar os olhos de Sr. Iero, com o rosto imerso em algo até então desconhecido por mim. Enquanto o outro falava, meu pai parecia estar definhando por dentro, apodrecendo a cada palavra. – Nunca mais nos vimos desde então... Eu me mantive em Nova Jérsei e me casei. James... Ou melhor, Donald saiu da cidade. Quando me disse sobre Gerard, desconfiei do sobrenome, mas achei que seria coincidência demais, eu não teria tanto azar assim. – Havia amargura no Frank mais velho, assim como empesteou aquela sala, nas palavras de meu pai.

Surrender The Night || Frerard versionOnde histórias criam vida. Descubra agora