Era aquele tipo de sonho que você sabe que não é real e por esse mesmo motivo luta para continuar mergulhado nele. E foi o que fiz, assim que preguei meus olhos e me deparei com aquela memória não muito recente, em um misto de perturbação e algo acolhedor. Era minha mãe, afinal, e parte de mim, além daquela saudade absurda, estava prestes a explodir de felicidade. No atual estado de tudo, a minha necessidade de tê-la ao meu lado havia me levado àquilo e talvez fosse um sinal de que as coisas ficariam bem.
Parte daquilo era estranho demais: vê-la trajando o vestido borgonha da noite de meu casamento não realizado, impecável e cheia de saúde, fazia parte da incógnita que vagava minha mente. A mesma sala esbranquiçada, a mesma decoração, o espelho em que eu me encarava e a mesma roupa (terno, calça e camisa de bom corte, juntamente da gravata listrada)... Tudo aquilo me causando uma familiaridade que só era bem vinda pelo sorriso de minha mãe, cujo podia admirar através do reflexo do espelho, a mulher parada logo atrás de mim, velando por seu filho.
Aproximou-se um pouco mais, em silêncio, os dedos envelhecidos ajeitando o paletó na altura de meus ombros, naquele toque caloroso e tão real... Um toque maternal reconfortante, que fez com que eu fechasse meus olhos e sorrisse. Uma linha tênue se formando em meus lábios, trazendo-me paz. Não busquei perguntas, por ora, a respeito do porquê daquela memória atípica, só... Só senti.
Não havia muito o que fazer, sonhos sempre lhe mostravam algo oculto e era por tal motivo que eu deixei que continuasse, ainda que eu me apegasse à tal ao ponto de abandoná-lo para descobrir seu significado em algum momento.
- Eu senti sua falta. – mal notei que havia deixado aquele sentimento expresso em palavras, de forma que sequer percebi que meus lábios haviam se movimentado para isso. Só tive certeza de que foi dito em voz alta, ao que a voz doce de minha mãe ecoou logo atrás de mim, tocando-me gentilmente, para que eu virasse meu corpo em sua direção. E foi o que fiz.
- Também senti sua falta, filho querido. Vejo que está feliz... Mas ainda sim preocupado. – encontrei seus olhos acastanhados tão atentos, lendo minha expressão contraída, ao que me postei diante dela, para que minha mãe ajeitasse a gravata em meu pescoço, com seus dedos finos repletos de anéis. E ao mesmo tempo em que olhei a aliança que meu pai havia lhe dado, Donna não demorou a sussurrar. – Seu pai vai enxergar tudo. Não vai demorar muito. Ele não é tão cruel quanto parece... Eu fui a melhor amiga dele, sabe? Ele é bem diferente de toda aquela pose horrível.
- Não consigo acreditar, me desculpe por isso... Você sabia que...? – a pergunta morreu no ar, completamente óbvia, ao mesmo tempo em que Donna assentiu com a cabeça, liberando um suspiro resignado. Havia muita memória ali, eu poderia ver por seu olhar cansado e seus lábios crispados naquela expressão pensativa, antes de se afastar. Mas não para muito longe.
- Eu sempre soube e foi por isso que me casei com seu pai... Para tentar curá-lo. Tirá-lo daquela dor. Por algum tempo, acreditei que fosse capaz, mas... Meu maior pesadelo é saber que falhei na minha missão. – Donna se sentou no único sofá da sala, ajeitando o vestido e esticando o tecido sobre seu colo. Eu me adiantei para sentar-me ao seu lado, respirando pesadamente. Aquilo era um sonho de verdade, não era? Mas porquê parecia tão real? – Não foi fácil... Amei muito o seu pai, além de todos os erros e teimosias. Ele era um homem de personalidade forte, ainda é, que desistiu muito cedo de sonhar... Mas ainda não é tarde, Gerard. – parte de suas palavras me fizeram, mais uma vez, comparar-me à ele, naquele dilema tão parecido, que era como se eu estivesse enxergando o meu eu mais novo, quase desistindo de tudo. Naquele caminho árduo até Frank, mas que havia conquistado. Ao contrário de meu pai, infelizmente. Ou felizmente... Afinal, o meu Frank não teria nascido se acontecesse. – Você pode ajuda-lo, filho... Sei que Donald ainda nutre algo por seu antigo amor, mas não é exatamente disso que falo. É sobre a vida... E ele precisa viver. Eu não estou mais lá para prendê-lo e depois de tudo o que você conquistou, não deveria se preocupar tanto em ser como você. Um homem com coragem suficiente para amar.
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Surrender The Night || Frerard version
Fanfiction[Continuação de Burn Bright] " O amor nunca acaba. Não quando é real e nós dois sabemos o quanto foi. Nós vivemos, nós crescemos, nós morremos e ele continua ali, firme e forte. Vivo, incandescente e vibrando, mandando aquele incessante "É ele, é e...