51 - Gerard

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De todas as vezes em que eu havia parado para analisar as feições bonitas de Frank, aquela era a que havia durado mais tempo até então. Eu havia decorado cada marquinha em seu rosto, notado a distância entre um piercing e outro, e percebido que a primeira coisa que ele havia feito assim que saiu do hospital, havia sido trocar os alargadores pretos por um par de vermelhos que havia comprado em Paris. Eu não tinha a visão privilegiada de seus olhos, mas presumi que aquele tom fazia um bom contraste com todas as cores que aquele belo rosto apresentava. Sempre que o fitava assim, me dava conta de que, ao contrário do que enfiei em minha cabeça na primeira vez que o vi, ele não era estranho, muito menos bizarro... Ele era bonito como ninguém jamais seria.

Possuía ainda traços tão joviais, longe das pequenas marcas que eu já estava ganhando no canto dos olhos, mais evidentes quando eu sorria, que qualquer um poderia achar que Frank tinha dezoito anos de idade facilmente. E ainda usando aquele suéter enorme, preto e rasgado em alguns pontos, tão grande nele, que era impossível não olhar aquela expressão serena ao dormir e sentir aquela exacerbada vontade de cuidar daquele pequeno garoto tatuado. E era o que eu estava fazendo nos últimos quatro dias: cuidando de Frank incansavelmente.

Não era necessário ressaltar que ele quase havia brigado sério comigo, quando então apareci naquele bar, logo após sua fuga quase bem sucedida, pronto para tirá-lo dali. Gritou que queria ficar sozinho, assim que me viu tão próximo dele, exclamou que ele estava bagunçando a minha vida e a de todo mundo, parando somente de falar alguma coisa quando eu o tomei no colo, jogando-o sobre o meu ombro e o enfiando no mesmo táxi que Bert e Mikey e eu chegamos. Seguimos sozinhos de volta ao hospital, deixando meu irmão e McCracken naquele bar com Quinn, onde mais nada dissemos. Até, claro, o médico responsável por seu caso aparecer e permitir que Frank retornasse para o seu quarto em uma santa paz.

Ali, antes de fazer uma bateria de exames, o convenci a ficar e desacreditar que estava me causando qualquer tipo de problema. Frank chorou um pouco mais e, além de partir meu coração, ele me deixou ainda mais preocupado pelo o que eu andava temendo desde que acordou: meu maior medo era vê-lo tornar-se uma pilha de nervos e decepção, basear-se em uma negatividade que não lhe cabia.

Quantas vezes eu havia visto aquilo enquanto estava internado? Quantas vezes eu havia chegado naquele patamar e me dado conta de que era capaz de enlouquecer se deixasse aquele pensamento criar raízes em minha cabeça? Frank não iria enfraquecer e eu estava predestinado a não permitir que ele construísse aquela ideia dentro de si. Eu não era psicólogo, mas sabia exatamente do que ele precisava. E não era discutir, gritar ou forçá-lo a ficar trancado naquele hospital vinte e quatro horas por dia.

Era simplesmente ficar ao lado dele... E desde que eu estava ali, que havia conseguido passar-lhe aquilo, Frank sequer tentou escapar ou contrapor-se a algo, quando assim lhe deixei fazer as coisas em seu tempo. Segurou minha mão e se propôs a escutar tudo o que o médico tinha a lhe dizer (desde grupos de apoio a remédios que poderiam aliviar sua ansiedade), cuidar mais de si mesmo e me permitir fazer parte daquilo. Não era uma batalha de um homem só, ele precisava de uma base e eu lhe daria.

Sendo assim, não foi difícil convencê-lo a fazer exames para verificar se havia sofrido alguma sequela. Foi confirmando o óbvio, que Frank estava bem, que ele percebeu que assim deveria ficar. E, agradecendo enormemente ao médico, quando lhe foi receitado um calmante em decorrência ao episódio da fuga, senti que as coisas realmente estavam se consolidando e eu poderia, em partes, descansar um pouco. Frank precisava relaxar e o remédio era eficiente o bastante para deixá-lo dormir por horas. Até mais do que eu.

Surrender The Night || Frerard versionOnde histórias criam vida. Descubra agora