Capítulo 60

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CAROLINE VICENTE

Meu cérebro não quer assimilar certas coisas. A minha amiga desaparecida e o meu namorado algemado a minha frente. Eu não sei se tenho raiva ou pena, eu não sei se estou machucada ou se quero saltar para cima de alguém a partir-lhe os cornos.

— Eu não fiz nada, eu juro! - O rapaz loiro a minha frente tem os olhos azuis marejados. Não sei se quero chorar com ele ou matar-lhe.

— Se não fizeste como é que o teu sangue foi lá parar? - Pergunto com a voz trêmula. Eu quero acreditar nele, mas as evidências não deixam. 

— Eu não sei, eu não mexi em nenhum momento no telemóvel dela, eu como todos aqui estou surpreso. - O menino loiro chora ao proferir tais palavras.

— Nós precisamos leva-lo agora para prestar declarações! - Os polícias afirmaram e o levaram de lá.

Nesse momento me sinto quebrar por dentro por não saber como me posicionar. Por um lado tenho a amiga desaparecida, por outro lado tenho o namorado a ser preso e o motivo é o tal desaparecimento dessa amiga. Eu tenho raiva, eu tenho nojo, tenho medo do que possa vir a acontecer, do que tenha acontecido.

MICHAEL PEREIRA

Não consigo entender o que aconteceu. Eu só consigo me lembrar de ver a Kenya entrar para o café, fazer a refeição como sempre e depois sair de lá como já era de costume, em nenhum momento eu falei com ela algo que não tivesse a ver com o pedido feito, em nenhum momento peguei no telemóvel dela, mas como é que o meu sangue foi lá parar?! Não consigo parar de pensar em tudo o que aconteceu naquele dia e no que me estava a acontecer bem naquele momento.

"Eu ia ser preso por algo que eu nem sei, algo que não me aparece na mente, algo que...„ - Minha cabeça vai explodir só de pensar em tantas coisas.

Continuo no carro da polícia sentado entre dois homens fardados, algemado e sem saber o que fazer, ou o que falar. Nesse momento tudo está tão confuso, nem a minha namorada acredita em mim. Ela não falou directamente que não acreditava, mas pela expressão do seu rosto, pelas palavras utilizadas eu vi o quão desapontada ela estava, e isso só fez o meu chão se abrir.

O carro para e logo vejo a porta ser aberta. Sou puxado para fora do carro e acompanhado para a parte de dentro do recinto chamado de delegacia, continuo algemado e tenho coração nas mãos. Sou colocado dentro de cela escura e suja, com apenas uma cama de solteiro no canto direito.

Sento-me na cama já que é o único remédio e passado sete horas ou oito naquele lugar vejo a cela ser aberta e entrar um homem fardado.

— Levante-se! - Ele diz num tom autoritário.
— Para quê? - Pergunto e sinto ele me algemar outra vez e tirar-me da cela com ele.
— Está calado! - Ele diz rude.

— Para onde me está a levar? - Insisto e sinto ele me empurrar para frente de uma porta.

Estou de frente a uma porta preta de metal, ela parece pesada e eu tenho os meus olhos postos nela de cima pra baixo. O homem aproxima-se e empurra porta a nossa frente dando-me uma outra visão, uma visão para o interior de uma sala onde tudo parecia bastidores de filme dos anos 90, tudo parecia muito preto e branco ou talvez fosse só na minha mente, já que não assimilava tão bem por estar aí tanto tempo e sem saber exactamente o que fazer ou ter respostas para as minhas perguntas. Entramos para a sala e fui colocado em uma cadeira em frente a um homem com um olhar sinistro.

— E então senhor Pereira o que me tem a dizer? - O homem pergunta. Acho que ele deve ser o delegado.
— Eu sou inocente, eu não fiz absolutamente nada. - Digo.
— Isso é o que todos dizem. - Ele diz irónico.
— Essa é a verdade e eu não posso fazer nada. - Digo e o homem parece se enfurecer.

— Como assim não pode fazer nada? - Ele bate com as mãos na mesa e me deixa assustado. — Temos uma rapariga desaparecida, o seu sangue é encontrado na telemóvel dela e você me diz que não pode fazer nada. Vendo bem já que não pode fazer nada, eu posso deixa-lo apodrecer na cadeia e jogar a chave fora se você não fizer essa menina aparecer em função de segundos.
— Mas...
— Não tem mas, onde é que ela está? O que você fez com ela?
— Eu já disse que não fiz nada, eu não sei nada sobre o desaparecimento dela. - A porta da sala é aberta.

— Senhor delegado entramos câmeras na aquela zona e pedimos as gravações do dia em que a menina Vaz desapareceu e as trouxemos para serem analisadas. - Os vídeos foram postos a rolar inúmeras vezes e nenhum sinal de como o telemóvel foi parar no lixo e nem como a Kenya desapareceu, mas pelo menos havia o vídeo que mostrava como o meu sangue foi parar no telemóvel. Quando havia ido deitar o lixo naquele dia haviam cacos no saco, um dos cacos fez um rasgão enorme na minha mão e foi assim que o meu sangue foi lá parar.

KENYA ONIKA VAZ

A minha cabeça dói, dói tanto que mal consigo abrir os olhos. Acho que vou chorar de tanta dor, forcei os meus olhos a abrir devido a luminosidade que havia naquele lugar que eu tentava reconhecer. Me sinto fraca, não sei onde estou, só sei que me encontro num quarto completamente velho as pinturas desgastadas na parede e o chão velho denunciam que o local é velho e cheira mal. 

Estou deitada em uma cama que não sei de quem é, e o mais engraçado é que me sinto tão cansada sem me lembrar de ter feito algum esforço, me sinto tão fraca, e não me lembro de ter comido, me sinto tão perdida porque não sei como cheguei a esse lugar e que eu desconheço.

Tento levantar-me da cama, mas o meu esforço é vão porque não tenho forças para isso. Reparo em mim e não há vestígios das minhas roupas, estava apenas de sutiã e calcinha e um robe bem leve por cima.

"O quê que aconteceu comigo?„ - Penso assim que reparo na minha figura.

Ouço barulho de passos fora do quarto, acho que vêm na minha direcção, porque o barulho vai se intensificando a cada passo dado. tento me sentar na cama com muito esforço por estar tão fraca e quando consigo sentar vejo a maçaneta ser girada, não demora muito e vejo um corpo a se mover com uma bandeja nas mãos para dentro do quarto assim que a porta é aberta.

— Bom dia meu amor, que bom que você já acordou! - Minha voz falha e não consigo dizer nada assim que lhe vejo.

NURDOnde histórias criam vida. Descubra agora