capítulo 65

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Realmente, sua mãe fala sempre a verdade. Tal­vez, ela não tenha se expressado bem. Acontece que... bem, eu não convivo com crianças há muito tempo e por isso não estou mais acostumado a falar com elas.


¾ Você está falando comigo. - Charles deixou o caminhão de lado e encarou Ucker.


¾ Tem razão. Estou. Isso significa que não devo ter medo de você, não é? Assim como você não deve ter medo dos monstros. Eu estou aqui e você não tem com que se preocupar. Vou protegê-lo, Charles.


Era uma promessa mais para ele mesmo do que propriamente para o garoto. A admiração estampada no rosto do menino quase fez com que Ucker se afas­tasse dele. Obrigou-se a continuar sentado.


- Então, você não tem medo de monstros? - Char­les perguntou, admirado.


Ucker pensou em tudo que temia. Crianças, uma mulher como Dulce. Ela o fazia querer coisas que não se permitia mais. Como amor, lar, família. Sim, deci­didamente, ele tinha seus próprios monstros. Ele co­nhecia o significado de medo.


-     Não, não tenho medo de monstros - mentiu, sabendo que o menino precisava da segurança de suas palavras. - Mas, uma vez, conheci uma menina que tinha muito medo deles.


- O que aconteceu? Os monstros pegaram ela?
Oh, sim. Os monstros a pegaram, sim.


-Não, os monstros não a pegaram - Ucker ga­rantiu. - O pai dela espantou-os de casa.


-É mesmo? Como? Ele lutou com espada? Ou matou eles com tiros de revólver? - Charles interessara-se pela história. Seus dedos torciam a barra do lençol.


Ucker negou, movimentando lentamente a cabeça.


-     Não, nada de violência. O pai dela foi à loja e comprou uma tinta antimonstro. Ele pintou as paredes do quarto da menina e o cheiro da tinta era tão ruim que os monstros fugiram para sempre.


Os olhos de Charles brilhavam, empolgados com a no­vidade. Ele quis falar alguma coisa, mas, um acesso de tosse impediu-o. Ucker foi buscar um copo com água. Passando o braço pelos ombros do menino, levou o copo ao lábios dele. Charles bebeu a água, mas a tosse persistia. Ucker sentia os músculos do corpinho dele sob a mão. Quando percebeu o que estava fazendo, retesou-se.

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