capítulo 76

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Charles olhava para a pipa, depois para Ucker. Seu rosto refletia a adoração pelo homem que lhe pro­porcionava tantas alegrias. Dulce sentiu uma pontada de ciúme. Ucker conquistara a confiança de Charles. Assim como conquistara a dela.


Não, não queria pensar dessa maneira. Tampouco queria parar para pensar em seus sentimentos. Pre­feriu observar as mãos de Ucker. Era sua função. Era com isso que deveria preocupar-se. E, não com o vazio que logo ficaria em sua vida e na de Charles. Não deveria pensar na falta que sentiria daquele ho­mem discutindo, implicando, tocando-a.


Ucker manejava a linha com desembaraço. Automa­ticamente. Facilmente. Dulce descobriu o que já suspei­tava, apesar de achar que precisava de mais tempo para ter certeza. Mas a verdade estava ali. Clara, inegável, escrita nos movimentos dos dedos de Dulce controlando a linha de pipa. Não podia ignorar a realidade que se desenrolava diante de seus olhos. Não poderia fingir que Ucker ainda precisava de sua ajuda.


Logo, Ucker retomaria seu caminho. Voltaria ao hospital. O tempo estava passado. Ela concluíra seu trabalho.


Viu quando Ucker passou a linha para as mãos de Charles. Aproximando-se mais, ouviu Charles exclamar:


- É tão divertido, Ucker. Quero empinar pipa ou­tras vezes com você.


- Eu também, filho.


Dulce sabia que essas palavras não significavam nada. Ucker estava saindo da vida deles. Ela teria que cortar aquele vínculo. Falaria com ele naquela noite.


Depois que Ucker terminou os exercícios, Dulce foi para a cozinha. Ela não estava em seu estado normal. Não costumava ficar tão nervosa. Evitava fitá-lo nos olhos. Agia desse modo por não compreender exatamente o que estava sentindo e não queria que ele percebesse seu estado emocional. Não era o momento de mostrar-se emotiva ou confusa. Ucker chegara ao fim do trata­mento. Mais do que nunca, ela precisava ser forte.


Ucker levantou-se e Charles despediu-se dele. As­sim que o menino foi para o quarto, Ucker apareceu na porta da cozinha, sorrindo, preparando-se para as despedidas. Dulce pigarreou.


-     Não vá ainda. Espere até eu colocar Charles na cama. Quero conversar com você. - Rapidamente, sem dar tempo para ele contestar, ela seguiu para o quarto do filho.

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