Capítulo 23

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Observo pela janela do meu quarto o amanhecer no México. A luz do sol aos poucos vai invadindo o meu quarto. Respiro fundo e levanto-me da cama. Mais uma noite sem conseguir dormir direito. Vinte e dois dias que cada vez que fecho os meus olhos, a imagem das minhas mãos sufocando Maitê me atormentam. Vinte e dois dias que vivo na escuridão profunda, sem ela. Olho o meu telemóvel em busca de uma ligação não atendida ou uma mensagem simples dela. Falta-me coragem para ligar ou mandar mensagem. Ela não quer me ver ou falar comigo. Ela deve me odiar, assim como eu me odeio por ter feito isso com ela. Ando para a casa de banho, tirando a minha calça do pijama pelo caminho. Completamente nu entro em baixo do chuveiro e a água fria bate no meu corpo quente, tentando acalmar a minha dor. Talvez com o tempo eu aprenda a conviver com ela. Talvez um dia ela pare de me sufocar e me deixe viver sem culpa. Fecho os meus olhos e o sorriso dela vem-me à cabeça. O olhar sedutor querendo-me. Ela cozinhando e o seu cabelo preso num coque bagunçado. O toque dela no meu corpo. A sua boca na minha. As minhas mãos percorrendo o seu corpo. Ela amarrada e as minhas mãos no seu pescoço. Abro os meus olhos assustado e a minha respiração está acelerada. Olho as minhas mãos que tremem. Ainda não acredito que a magoei assim. Pego o sabonete e começo a me lavar para afastar ela da minha cabeça. Coloco a minha roupa e sigo para a cozinha. Sinto o cheiro do café e assim que entro, vejo a Sra. Rodrigues. Ela olha para mim e um pequeno sorriso surge nos seus lábios. 

Sra. Rodrigues: Bom dia! 

Eu: Bom dia! 

Tento retribuir o sorriso gentil. Olho a mesa posta, cheia de pães e frutas. 

Sra. Rodrigues: Quer o seu café?

Eu: Por favor. 

Sento-me e ela serve-me uma chávena com café. Olho toda a comida, mas não tenho fome.

Sra. Rodrigues: O senhor precisa comer. 

Sra. Rodrigues diz de forma carinhosa, como uma mãe diz a um filho pequeno. 

Eu: Não tenho fome. 

Dou um gole no meu café. 

Sra. Rodrigues: O meu marido mandou isso. 

Ela entrega-me uma sacola de papelão. 

Sra. Rodrigues: Disse que talvez o anime. 

Sr. Rodrigues tem sido uma boa distração nas noites sem dormir. Tenho ido à feira algumas vezes por semana. Assim como ao topo do meu prédio para ver o sol nascer. É uma forma de sentir Maitê. Uma forma de diminuir a saudade. Abro a sacola e suspiro ao ver a tal fruta que ela me fez provar na feira. 

Sra. Rodrigues: Pitaia. 

Sra. Rodrigues sussurra e sorri. 

Eu: Eu sei. Maitê fez-me provar uma vez. 

A simples menção do nome dela em voz alta, faz o meu coração apertar. 

Sra. Rodrigues: Coma a fruta pelo menos. 

Ela vira-se e vai para a pia. Viro todo o meu café e encaro a fruta. Ela continua com uma aparência feia. 

Sra. Rodrigues: Quer que eu a corte para o senhor? 

Eu: Não precisa. 

Estou realmente sem fome. Mas talvez provar a fruta novamente me traga a doce lembrança dela. Corto a fruta e mordo um pedaço. Começo a rir e a Sra. Rodrigues olha para mim sem entender. 

Sra. Rodrigues: O que foi?

Eu: O gosto não é o mesmo, que da última vez que provei.

Sra. Rodrigues: O senhor comeu alguma coisa junto com ela ou antes dela? As vezes misturou sabores. 

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