Ficamos de pé também, com Eliot se enrolando com as muletas quando disparamos para fora do refeitório, observando os soldados correndo de um lado para o outro, enquanto o aviso sonoro continuava, assim como as luzes vermelhas que piscavam sem parar. Meu coração chegou a boca enquanto eu tentava entender o que estava acontecendo.
—Não é um ataque. —Eliot afirmou atrás de Ethan e eu, balançando a cabeça negativamente. —Se fosse, já estariam nos chamando pelos alto-falantes e teria uma aviso nas nossas pulseiras.
—Então o que está acontecendo? —Ethan indagou, me puxando na direção que os soldados estavam indo.
Eliot veio atrás de nós, tentando andar mais rápido com aquelas muletas, do que conseguia de fato. Seguimos a movimentação, não demorando a encontrar o corredor onde os soldados iam se espremendo, todos parecendo tentar descobrir o que estava acontecendo ali. Tive um vislumbre do rosto de Gia entre eles e automaticamente enfiei a mão em um dos vários bolsos que haviam na minha calça, até alcançar a faca que Eliot havia me dado.
Gia não havia feito nada desde que retornou do setor 1, mas eu sentia que ela estava apenas esperando o momento certo, porque seus olhos sempre faiscavam de raiva quando me via. Eu passei essas duas semanas em alerta com ela e seus amigos, mas nenhum deles fez qualquer sinal de me atacar. Dormi a maior parte dos dias no dormitório de Ethan, indo pra lá antes de Gates se recolher, o que evitava que eu o encontrasse acordado, já que eu sempre fingia estar dormindo quando ele chegava.
Sawyer era o único que sempre estava lá quando eu chegava, lançando sorrisos doces pra mim, além de deixar Ethan irritado sempre que tentava flertar comigo. Eu não me importava, na verdade, porque ele parecia mais sincero do que muitos soldados ali, além de ter ficado próximo de Ethan nessas duas semanas. Sawyer não estava mentindo quando disse que Tyler era esquisito. Ele realmente era. Eu normalmente o via de relance pelos corredores.
Sempre o pegava me olhando, o que o fazia desviar os olhos na mesma hora e desaparecer tão rápido quando havia surgido. Não sei se isso significava que ele tinha algum problema comigo, já que Cold literalmente apontou uma arma pra cabeça dele por minha causa. Também o via voltar para o dormitório sempre depois do toque de recolher, soltando suspiros longos e resignados antes de se deitar para dormir. Então, sim, ele era muito esquisito.
—O que diabos está acontecendo? —Indaguei, cutucando a parede que estava na minha frente, que eu logo reconheci ser Sawyer. Ele se virou, abaixado a cabeça para me olhar, já que eu literalmente dava na metade do seu peito.
—Não sabemos ainda. Parece que os rebeldes atacaram de novo, nosso depósito de armas. —Sawyer afirmou, olhando por cima de todas aquelas cabeças, para ver o que acontecia lá na frente. —Ah, merda, foi o Traidor.
—Quem? —Ethan vez uma careta atrás de mim, olhando pra Sawyer com uma expressão confusa.
Eliot se aproximou dele, começando a explicar toda a história sobre o Traidor, que eu já havia escutado pelos corredores. Os soldados começaram a abrir caminho quando Cold apareceu, seguindo na direção da sala onde a atenção de todos estavam. Os ombros tão rígidos que soava como se ele estivesse indo para uma batalha. Nesses momentos eu me lembrava de quando ele sorriu quando estávamos treinando juntos, sozinhos.
—Quando isso aconteceu? —A voz fria de Cold faz um silêncio sufocante se instalar ali. Cada soldado parecendo ficar tenso ao perceber que Cold não estava nem um pouco feliz com a situação.
—Ontem a noite, senhor. Eu cheguei agora pouco para pegar algumas coisas no depósito e encontrei tudo assim. —Uma voz feminina varreu o corredor, enquanto eu tentava ficar na ponta dos pés para ver melhor. —As câmeras estavam desligadas e o soldado que estava fazendo ronda durante a noite desapareceu.
—O que ele levou? —Cold indagou, fazendo o silencioso se prolongar por mais um segundo. —Vocês já checaram?
—Granadas de mão, munição e algumas armas de calibre pequeno, senhor. —Dessa vez uma voz masculina respondeu, que eu logo reconheci ser de Neo. Meu estômago afundou em puro gelo, porque eu havia aprendido a não gostar até mesmo do som da voz dele.
Cold ficou em silêncio, enquanto eu mordia minha língua para não soltar um gritinho quando Sawyer passou o braço ao redor da minha cintura e me ergueu, até que eu conseguisse os enxergar lá na frente. Dei um tapinha agradecido no ombro de Sawyer quando passei meu braço ao redor do pescoço dele, notando que ele também era forte pra caramba. Ou talvez eu fosse magra demais.
—Ele já sabe? —Cold indagou, enquanto eu olhava lá pra frente, piscando várias vezes quando vi a pichação na parede, bem ao lado de uma porta de metal que parecia ter sido explodida, o que não fazia o menor sentido já que não ouvimos nenhum barulho. A pichação era idêntica a todas as outras que eu já havia visto pela Zona Militar. Uma peça do rei do jogo de xadrez, com a cabeça sendo arrancada.
—Sim, senhor. —A voz de Neo saiu baixa e hesitante quando o vi olhar para Cold. —O presidente já está a caminho.
[...]
Voltamos para o refeitório depois do que aconteceu. A tensão parecia exalar de todos naquele lugar, como se a chegada eminente do presidente fosse a pior coisa que poderia acontecer ali. Eu não conseguia parar de pensar na reação de Cold quando ouviu a resposta de Neo. Seus ombros estavam mais rígidos do que qualquer outro dia. Sua boca se apertou, assim como seu rosto, como se aquela informação criasse um buraco no seu peito. Ele não pareceu feliz com a ideia do pai aparecer. Era muito claro pra mim.
—Quem você acha que é o Traidor? —Ethan indagou, quando chegamos a mesa que estávamos ocupando antes. Sawyer se juntou a nós, devorando uma maçã com um vigor surpreendente. Eu empurrei minha bandeja, sentindo a fome ir embora depois do que aconteceu.
—Não sei. Tem muitas pessoas que agem estranho nesse lugar. —Eliot respondeu, fazendo Ethan comprimir os lábios, como se aquilo o incomodasse. —Tenho alguns suspeitos e algumas teorias, mas nada concreto até agora.
—Eu acho que é um homem. —Sawyer murmurou, fazendo nós três olharmos pra ele. —Neo, Gates, ou alguém daquele grupinho deles. Estão sempre arrumando confusão, de uma forma descarada. Odeiam Cold e o presidente com tanta força, que eu não me surpreenderia se fosse um deles.
—E por que não pode ser uma mulher? —Me surpreendi quando Laís se sentou ao meu lado, depositando sua bandeja cuidadosamente na mesa. —Neo é um escroto e Gates é seu cachorro de estimação. Duvido que qualquer um deles tenha capacidade de ser o Traidor.
—E quem você acha que é? —Ethan indagou, fazendo Laís olhar pra ele. —Você nasceu aqui, não é? Conhece todo esse lugar e todas essas pessoas que vivem aqui.
—Não conheço todo mundo, mas sim, eu nasci aqui. Meus pais eram dois soldados da Zona Presidencial. Eles trabalhavam diretamente para o presidente. —Laís afirmou, o que explicada o quão próxima ela era de Cold. —Também tenho suspeitos e teorias, como Eliot disse. Mas nada concreto. De qualquer forma, Cold está caçando esse Traidor, então tenho certeza que não vamos demorar a descobrir quem é. —Laís começou a comer, antes de parar e apontar a faca para Eliot, que abriu um sorrisinho pra ela. —Pare de me olhar desse jeito!
—Te olhar como? Como se eu te achasse linda? —Eliot escorou os cotovelos na mesa, deixando o rosto entre as mãos, o que apertou suas bochechas de uma forma engraçada, enquanto ele sorria de forma larga para Laís. —Sinto muito, mas isso é impossível. Você é a coisa mais linda que eu já vi.
Laís revirou os olhos, enquanto eu, Ethan e Sawyer caíamos na risada, porque aquela estava longe de ser a coisa mais brega e fofa que Eliot já havia dito pra Laís. Essas últimas semanas foram divertidas, porque Eliot e Laís eram como cão e gato, se inticando sempre que estavam no mesmo ambiente. Eu estava sempre me perguntado quanto tempo ia demorar pra realmente rolar alguma coisa.
Continua...
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Em Destruição
Ficção GeralO mundo sucumbiu as guerras e os países se tornaram ruínas. Agora, décadas depois, as pessoas precisam viver em zonas de contenção no subsolo, impedidas de ir além dos muros que cercam o complexo em que vivem. Cada um tem um papel crucial nessa nova...