Capítulo 13- 350 milhões.

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Dois dias. Esse é o tempo necessário para uma pessoa enlouquecer. Minhas esperanças estavam no chão com tudo que aconteceu, Niragi já tinha feito os negócios e nem tínhamos chegado perto de ter intimidade com eles. Nesses dois dias todos quiseram ir dançar durante o carnaval e eu estava com a mínima vontade mas mesmo assim eu fui com vários remédios antidepressivos, eu bebia para esquecer aquela dor dentro de mim, cheguei até a usar drogas e a noite eu chorava igual uma louca por culpa. Eu me culpava por não estar sendo uma boa mãe, eu me culpava por não ter arquitetado um plano melhor, eu me culpava por tomar remédios e bebidas/drogas escondido de Niragi, me culpava por ter que ficar chapada para parecer feliz, eu me culpava por assim que eu deitava na cama e Niragi pegava pesado no sono eu começava a chorar e ter crises de ansiedades que me faziam tremer toda, eu me culpava por assim que via que faltava 40 minutos para Niragi acordar para treinar eu lavava o rosto e tomava um calmante mega forte que me derrubava em minutos, eu me culpava por dormir só 4 horas por dia, me alimentar mal e antes de sair de casa tomar remédios descontroladamente e sair escondido no meio da curtição para usar qualquer coisa que me deixasse feliz.
Mas agora acho que não tenho muito o que fazer quando são 10 da manhã, Niragi me pegou tento uma crise de ansiedade e descobriu que não dormi e agora está me vendo vomitar igual uma desgraçada toda a bebida. Ele não estava entendendo nada pois ele não me viu beber nada, não me viu tomar remédio nenhum e também não me viu comendo só duas bocadas do café da manhã e jogando o resto no lixo quando ele foi ao banheiro.
- Oh meu anjo – ele disse acariciando minhas costas – o que foi?
- Não sei, deve ser a ansiedade para hoje – minto e ele me ergue em direção ao chuveiro, tirou meu pijama suado e vomitado e abriu o registro do chuveiro. Ele me colocou na água gelada, meu corpo e tremeu, minha cabeça latejou.
E para piorar tudo, era hoje a merda do jantar beneficente. Meu marido me tirou do banho, me deu um dramin e eu dormi igual um anjo até as 18 da noite.

E seis horas depois lá estava eu com um vestido verde escuro, levemente cintilante, longo com um decote em triangulo bem grande transpassado com um cinto do mesmo tecido, um pouco mais grosso,  embaixo nos meus seios bem onde o decote termina. As mangas eram longas e soltas, um pouco bufante. Havia uma fenda na coxa. Coloquei brincos, anéis e um salto cor creme. Prendi meus cabelos em um coque estiloso e uma make bem caprichada pois eu estava que era só olheira.
Como eu estava aqui? a base de calmantes e sem Niragi saber mas acho que logo ele saberia, hoje foi por pouco, ainda bem que consegui inventar uma desculpa. Niragi estava de terno e gravata combinando com o meu vestido, meu sogro e minha sogra também estavam incríveis.
Finalmente entramos naquela casa enorme, o palácio encantado da porra dos mentirosos dos Saragoça, tinha tanta gente lá dentro, tipo mais do que a primeira vez. Às vezes eu penso que caberia o Brasil todo lá dentro e fico com cada vez mais vontade de entrar aqui sem esses vestidos idiotas e com uma arma carregada de bala para atirar em quem tentasse me impedir. A ideia de entrar vestida de preto e com uma arma me faz arregalar os olhos, parar de respirar, fechar os punhos até sentir a palma da minha mão ardendo em razão da forma que minhas unhas se cravaram nela.
- Ellie? – Sora me puxa daquela nevoa de pensamentos e eu me assusto.
- Eu? Sim, claro, aqui – falo tentado focar.
- Calma – ela ri e toca meu ombro – vamos pegar uma bebida?
- Claro – falo sorrindo e vou com ela. Antes de sair olho por cima do ombro e vejo Niragi conversando com vários homens mas seus olhos estavam em mim, sorri fraco como quem diz “está tudo bem”.
Assim que pegamos as bebidas Stephanie nos encontrou.
- Senhoras Suguru! – ela veio sorrindo com uma taça de champanhe, uma sorriso cretino no rosto, um vestido vermelho decotado e nos abraçou – como vocês estão lindas!
- Imagine! Você está mil vezes mais que a gente – Sora disse sorrindo e Stephanie virou sorrindo para mim.
- Verde combina tanto com você – ela disse e eu sorri.
- E o vermelho com você! – sorrimos.
- Thomas me disse que se encontrou com os meninos, então eu vim atrás de vocês – ela disse se colocando no meio de mim e Sora e começamos andar como se fossemos melhores amigas adolescentes andando pelo corredor da escola, ela rindo e falando do quão boa estava sendo fazer a festa e eu apenas concordando. E quando percebi estávamos todos em uma rodinha com uns casais estranhos mas que pelo visto Suguru conhecia falando sobre dinheiro.
- Bom gente, fiquem à vontade – Thomas fala – daqui a pouco será servido o jantar, as mesas de vocês são aquelas ali – aponta para um canto – e depois do jantar teremos um leilão de roupas, imóveis, carros, joias e tudo mais – ele sorri.
- Ah que maravilha! – Niragi diz e eles se retiram.
Cada vez que eu olho para Thomas eu vejo inocência, como se ele realmente não fizesse parte dessa sujeira toda, como se ele tivesse ajudado Stephanie com o plano nojento dela mas não soubesse da situação. É como se ela tivesse mentido para ele também. Mas já Stephanie... ela não sabia mentir, ela nítido que as vezes ela saía do personagem no conversa. Confesso minhas esperanças estavam ficando cada vez mais baixas de conseguir a verdade, a ansiedade só aumentava e tudo na minha vida estava desmoronando, eu estava viciada em remédios e bebidas para me deixar “feliz”.
Eu estava quieta, eu não estava sendo eu, eu sentia falta de mim, sinto falta daquela Ellie que não estava doente e obcecada pela verdade, eu sinto falta da Ellie saudável, sinto falta de tanta coisa. Sinto falta de não estar como estou agora, por fora quieta, com medo, olhos arregalados, garganta apertada mas por dentro tão agitada, querendo gritar e destruir tudo, minha cabeça girava com tanta coisa. Eu estava em total estado de agonia. Os calmantes estavam passando o efeito.
Um garçom tira meu foco, o jantar já tinha passado e enquanto todo o resto da festa estava em rodinhas conversando sobre dinheiro e ostentação, eu estava aqui no corredor secundário, que por sinal era enorme, branco, com portas bem espaçadas entre si e cheio de quadros com pinturas e fotografia, arte. Eu fui saindo pelos cantos até chegar aqui, perdida em pensamentos e angustiada, aquele garçom... não era a primeira vez que ele passava do meu lado, o que ele estava tentando fazer? Olho para ele e sorrio, beberico o resto da champanhe na minha taça e olho a pintura de um bosque sombrio. Não havia ninguém naquele corredor a não ser eu e o garçom, estava até quieto como se a festa estivesse muito longe daqui.
Ele finalmente passa com um carrinho de comida e anda muito lentamente por aquele corredor, acompanho com os olhos até um ponto e estou quase voltando a olhar a arte quando ele me olha por cima dos ombros, assustado, olho para ele de novo, confusa e desconfiada. Ele desvia e anda, desvio o olhar como se nada daquilo tivesse acontecido mas mesmo assim eu o olhava de canto, uma mecha do meu cabelo estava solta e isso tampava meu olho um pouco. O garçom andou um pouco e parou, me olhou de novo antes de entrar quase correndo com aquele carrinho de comida em uma porta, desvio o olhar por um segundo mas volto, sem conseguir controlar e vejo ele com a mão na maçaneta me olhando assustado, me checando. Eu estava olhando sem mexer a cabeça mas assim que ele fez isso eu levanto o rosto e dou alguns passos firmes, esses passos são o necessário para ele fechar a porta com tudo e eu fico sem entender.
Que porra foi essa?
Coloco a mão no peito para me acalmar e parto para a próxima arte, olho a fotografia de um campo de girassóis mas não consigo ficar nem um minuto olhando pois eu começo a ouvir alguns gritos, abafados. Meu corpo fica em alerta, meus músculos se enrijecem, sinto meu sangue todo ficar quente e circular rapidamente pelas minhas veias. Olho para trás e vejo que o corredor continua vazio e então começo andar e a cada porta que eu vejo eu apoio os ouvidos, meu coração estava batendo tão forte que o barulho quase me impedia de ouvir o barulho da porta.
- QUERO VER ELA!! – ouço e aperto o passo. Essa voz... não era estranha.
Meu coração começa a se encher de esperança, começo a sorrir enquanto minhas mãos e pernas tremiam, eu tinha quase certeza de que eu estava perto de descobrir tudo, eu sentia aqui dentro de mim. Passa uma, duas, quatro, sete, nove portas e nada mas os gritos estavam cada vez mais altos, acho que estou me aproximando.
- SÓ QUEREMOS VE-LA, NÃO VAMOS CONTAR NADA! – ouço a mesma voz, acho que tem uma lágrima escorrendo pela minha bochecha esquerda, sorrio e quero gritar falando que eu estou chegando, só falta mais uma porta para o fim do corredor onde o garçom entrou, só tem mais 15 metros. Piso forte no chão, estou tão decidida.
- Ellie? – a voz me paralisa. Travo e tremo. MERDA! – meu Deus, você sumiu! – ela vem até mim, e toca meus ombros e eu respiro fundo antes de virar para ela com um sorriso.
- Estava entediada e artes que você possui me ajudaram – falei para Stephanie com raiva, com tanto fingimento. Respiro e os gritos pararam.
- Vamos para lá, vai começar o leilão – diz pegando minha mão como s eu fosse uma incapaz mas eu fico onde estou.
- Pode ter certeza de que já vou – sorrio e é exatamente aqui que algo nela cai, seus olhos tremem e ela entra em desespero, seu corpo não em entrega nada mas a sua respiração sim, quero empurra-la na parede e gritar com ela e estou quase fazendo isso quando ela sorri e me puxa gentilmente pelos ombros.
- Claro que não – ela ri – perder começo de eventos importantes aqui no Brasil é uma falta de respeito enorme – ela ri novamente, já estou irritada com isso – então venha comigo – ela me puxa pela mão.
Fico onde estou com dois segundos antes de ceder e ir. Ela vem me guiando pela mão, nossos dedos entrelaçados, ela na frente rindo e pedindo licença e eu atras sendo puxada e forçando um “essa minha amiga é doida mesmo, mas eu a amo”. Chegamos a nossa mesa, Niragi me olha chocado.
- Encontrei a princesa – ela ri e solta minha mão – ela estava no corredor vendo os quadros, é uma honra saber que eu tenho bom gosto para isso e mais alguém sabe apreciar pq aqui em casa é só eu - ela ri e Thomas entrelaça o braço no dela.
- Agora vamos abrir o leilão – ele sai rindo e eu sorrio “agradecida”.
- Onde você estava? – Niragi pergunta baixinho enquanto eu roubo a taça de champanhe dele e dou a volta na mesa para me sentar ao lado dele. Sora e Isamu me olhavam também.
E então falo em alto e em bom tom, brava, totalmente irritada:
- Quase com as mão no prêmio – digo mas em japonês e me sento.
Os três me olham e eu abro a boca para falar mas a voz insuportável de Stephanie estoura no microfone. O leilão se iniciou. Os próximos minutos passam muito rápido, eu estava tremendo e tentando me acalmar ao mesmo tempo que eu tentava manter a aparência que nada havia acontecido, os três também estavam tentando e queria que eu contasse tudo mas eu não podia falar ali, havia tanta gente ao redor.
Leiloaram casas, sítios, fazendas, ternos, vestidos, colares e nada parecia bom, sabíamos que tínhamos que comprar algo aquela noite mais nada era bom. Suspiro e olho para o cara que estava lá no palco com um microfone e um martelinho na mão, olho para o telão e meu mundo para, mais uma vez.
A casa que estava sendo leiloada, era a casa onde cresci. Toda de madeira, com jardim e piscina, dois andares. Igualzinha. Olho para Niragi que estava focado em outra coisa, minha garganta se fecha, não consigo respirar. Quero falar a ele mas tudo que consigo fazer é me tremer, tremer e tremer.
- Casa Saragoça vendido por 51 milhões, alguém da mais? Dou-lhe uma, dou-lhe duas... – cara fala e eu sinto tudo girar.
Não sei quem está comprando e nem pq a casa tinha o nome deles. Tudo gira, quero morrer ali mesmo, quero me jogar na água para ver se o calor passar, quero gritar, quero pedir para Niragi fazer algo até que...
- 350 milhões! – digo alto, muito alto até.
Todos me olham, Niragi então está chocado.
- Ok... Casa Saragoça vendido por 350 milhões, alguém da mais? Dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três – ele bate o martelinho e todos batem palma - Casa Saragoça vendido por 350 milhões para a Suguru mais bela da família – ele diz e eu sorrio desesperada e o leilão continua.
- 350 MILHÕES? – Niragi quase grita – aquela casa valia a metade disso – ele fala e uma facada penetra no meu coração, estou sangrando, sem ar, quero cair da cadeira, quero abraçar Niragi e chuta-lo ao mesmo tempo.
- Você vai querer tanto retirar o que disse quando eu falar para você que... – sou interrompida, o leilão acabou e o cara que me garantiu a casa está parado do meu lado, dou um salto e estou em pé e sorrindo. Não sei como estou fazendo isso mas estou.
Ele me cumprimenta com beijos e um abraço.
- A senhora fez uma ótima escolha, a casa fica em um local ótimo do Leblon e apesar dela não valer tudo aquilo que você apostou pode ter certeza que, como você tem uma amizade fortíssima com a Sra. Saragoça, vai poder fortalecer bem mais – ele sorri e eu estou confusa – a casa é dela, ela passou a infância lá – ele sorri – os pais dela moravam lá até algum tempo atras mas preferiram vir morar aqui com ela e com a neta – completa e meu mundo cai, estou no chão.
- Ah claro! – sorrio e me despedimos. Olho para o lado e vejo Niragi conversando com o pai, Thomas e Stephanie, olho para ela e estou pronta para socar ela bem aqui mas ela sai correndo, desesperada.
- Querida? – Thomas diz olhando para trás, no caminho onde ela foi – vou atrás dela, um momento – ele sai e está estranho, Niragi me olha.
Minhas mãos tremem e eu me desmonto na cadeira.
- Vamos embora – peço e ele me olha – AGORA NIRAGI!
O resto é um borrão, me tremo e choro o caminho todo, não conseguia nem explicar a Niragi, entro no banho e engulo 5 comprimidos de calmantes. Caio sem forças na cama em segundos. Não o que acontece depois.

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