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Lúcia: E o que tem sua irmã, fia? Pode falar.- assentiu calma e eu limpei as lágrimas rápido, com força.

Mari: É que... É que desde que nossos pais morreram, eu me senti deixada no papel de "mãe" dela, sabe? Desde criança eu tenho isso convicto inconscientemente na minha cabeça, e... E agora... Agora eu sinto que eu fracassei, sabe? - falei quase sem voz, com a vista embaraçada de lágrimas, vendo ela negar.- Eu sinto como se tivesse feito tudo errado. Como se eu tivesse decepcionado eles com ela, entende? Que tudo que tá acontecendo, indiretamente, é culpa minha. Eu que não soube preparar ela direito pra vida...- assenti com as mãos na boca e ela respirou fundo fazendo o mesmo.

Lúcia: Eu entendo, fia...- suspirou, pondo a caneca no chão.- Mas o que te faz pensar isso? - perguntou de olhos semi cerrados e eu respirei fundo, tentando encontrar palavras.

Mari: Então... A algum tempo, ela veio até esse morro pra um tal baile funk com algumas imbecis que se diziam amigas dela.- revirei os olhos.- E... E nesse baile... Ela conheceu o irmão do Arcanjo... O Grego.- suspirei, meio cansada, e ela arregalou seus olhos.- Sim... Eles se conheceram e ela me contou que eles se beijaram nessa noite. E teria ficado por isso mesmo se o meu instinto superprotetor não tivesse me arrastado até aqui, duas horas da manhã, e me tivesse feito fazer o maior barraco na entrada do morro mandando que me trouxessem ela.- respirei fundo.- Logo o Arcanjo apareceu, a gente discutiu e...- fui interrompida.

Lúcia: Espera, você discutiu COM O ARCANJO? - perguntou um tanto espantada, com uma expressão de incredulidade e eu suspirei, assentindo.- Meu Deus...! - arregalou os olhos.- Ô menina, eu não sei bem se você é muito corajosa ou muito doida, mas eu sei que eu gostei disso.- assentiu, deixando nascer um sorriso meio estranho nos lábios e eu cerrei o olhar em ar de riso também.

Ue...

Mari: Por que a senhora diz isso? - perguntei estranhando e ela negou, sorrindo mais.

Lúcia: Porque, minha filha, nesses anos que o Arcanjo vem sendo o chefe desse lugar, eu nunca, NUNCA vi ninguém ter a minima coragem de dar, nem que fosse um aumentado de tom, com ele.- negou sorrindo e eu franzi o cenho.- Sempre tiveram absoluto medo desse menino e ninguém nunca desafiou ele, desde tudo que aconteceu...

É, posso imaginar o porquê.

Mari: Mas, no dia, eu não conhecia ele bem, nem sabia o monstro que ele poderia ser... Pelo menos, não nos primeiros cinco minutos...- arregalei um pouco os olhos, lembrando dele me arremessando no chão.

Só de lembrar, minhas costas doem.

Lúcia: Não, fia... Eu tenho certeza que você teria feito a mesma coisa, mesmo que já o conhecesse.- negou sorrindo.- Você tem cara de gente valente, e a energia que você emana não desmente isso, menina.- negou, pondo sua mão na minha bochecha.- Arcanjo, até pra quem não conhece, mostra quem é. Porque ele, no dia que se auto consagrou Arcanjo, teve a morte e o ódio cravados no olhar.- cerrou os olhos, fechando o sorriso, ficando com uma voz sombria.- E o seu espírito reconheceu isso, mas mesmo assim você não se acovardou, fia.- sua voz voltou a ficar doce e nasceu um novo sorriso em seu rosto.

Eu me senti estranha vendo ela falar aquelas palavras, mas não era um estranho ruim.

Me senti até elogiada.

O ego da gata tá nas nuvens agora.

Lúcia: Mas enfim, me conta o resto dessa história que eu preciso saber o desfecho de tudo isso.- negou, cruzando suas pernas e eu retomei a linha do raciocínio.

Terminei de contar todo o resto da história e, quando mal calei a boca, ela se levantou da cadeira parecendo ter ficado extremamente atordoada com a história.

No alto do morro...Onde histórias criam vida. Descubra agora