Cumprir o dever

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  Na manhã seguinte, os hóspedes dos Bennet partiram, restando apenas Thomas. Infelizmente, eu estava atarefada demais lavando os lençóis dos aposentos dos convidados e não consegui encontrar ele nenhuma vez.
  Também, duvido muito que ele me encontraria entre os muitos varais cheios de lençóis e cobertores. Passei aquele dia todo trabalhando feito uma condenada, como diria Thomas.
  Quando finalmente me sentei para jantar e descansar um pouco, lady Bennet entrou na cozinha. Elegante como sempre, se aproximou de mim.
  – boa noite, Amélia. Como você está?
  – cansada, milady. Mas estou bem.
  – oh, quando os hóspedes vão embora só resta o trabalho, não é mesmo?-- ela comentou, despreocupada.
  – sim, milady.
  – acredito que depois de amanhã o último hóspede vai partir também, então tudo vai ficar mais tranquilo por aqui.
  – mas já?-- me surpreendi, e quando vi já tinha falado.
  – sim. Lorde Cumberland pretende partir depois de amanhã. Ele pediu para levar o desjejum de amanhã nos aposentos dele. Pediu que fosse você.
  Eu engoli em seco tentando disfarçar.
  – sim, milady.
  – vejo que agradou bem nossos hóspedes, Amélia. Lorde Cumberland gostou muito de seus serviços. Acredito que William vai te recompensar por seus serviços aqui.
  – obrigada, milady.
  – era só isso que eu tinha para te pedir, Amélia. Tenha uma boa noite e até amanhã.
  Lady Bennet saiu caminhando graciosamente.
  Enquanto eu engoli em seco, sentindo meu coração apertado. Thomas partiria dentro de dois dias.

  Na manhã seguinte, bem cedo. Peguei a bandeja com o café da manhã de Thomas e fui até seus aposentos. Bati levemente na porta e imediatamente ele abriu.
  Sorriu e fez uma reverência para mim, me dando licença para passar.
  – bom dia, Amélia. Como está?-- ele cumprimentou, me seguindo até a mesa.
  – bom dia, Thomas. Estou bem. Apesar de não ter te visto ontem.
  – oh, sim. Eu esperava cruzar contigo pela casa, mas infelizmente não te encontrei.-- ele se explicou, puxando a cadeira para mim.
  – mas agora estou aqui.-- respondi, me sentando.
  – e isso que importa.
  Ficamos frente a frente e ele tocou minha mão sobre a mesa.
  – Soube que vai partir amanhã – eu perguntei, sem rodeios, e senti um peso saindo dos meus ombros, pois aquele assunto tinha custado o meu sono.
  – queria falar contigo sobre isso.-- ele falou, arrumando sua postura e servindo uma xícara de chá.
  – é verdade?-- eu me indignei.
  – sim, é verdade. Mas, antes de qualquer coisa, me deixa explicar.
  Senti a raiva tomando conta de mim. Mas precisava me controlar.
  – você me disse que iria me levar contigo.
  – eu sei, mas… bem, eu recebi uma carta ontem. E não será possível.
  Fiquei irritada. Thomas agia com tranquilidade, sem perceber ou se importar que eu estava furiosa.
  – que tipo de carta?-- questionei, e ele percebeu minha irritação.
  – fui convocado pelo Exército de Vossa Majestade. Para servir na França. Eu devo cumprir meu dever pela Coroa-- ele enfim respondeu, colocando sobre a mesa uma carta com timbre do exército.-- meu pai recebeu a convocação em casa e enviou para mim.
  Meus olhos saíram de seu rosto e correram pela carta.
  Tinha ouvido os Bennet comentarem sobre o apoio do Reino Unido às revoltas na França. Uma decepção tomou conta de mim, com um aperto forte no meu coração.
  – eu tenho vinte e cinco anos. Fui convocado para o Exército e devo comparecer no Quartel em Sudbury, em Suffolk, em menos de uma semana.-- ele explicou, com olhar pesaroso. – Lamento, mas receio que não poderei cumprir minha promessa nesse momento.
  – oh, céus…
  – eu sinto muito, Amélia.-- ele segurou minha mão com carinho.
  – eu também sinto muito.
  – eu vou voltar. Eu te prometo. Eu contei a William sobre meus sentimentos por você, mas por ora manteremos segredo.-- ele me olhou nos olhos, prometeu com ternura – Quando eu retornar da guerra, virei imediatamente te buscar.
  – eu irei te esperar.-- respondi, com a voz levemente embargada pela vontade de chorar que estava surgindo.
  – eu a amo, Amélia.
  – eu também o amo, Thomas.
  Ele levou minha mão aos lábios e beijou carinhosamente.
  – devo retornar aos meus afazeres – interrompi, levantando.
  – por favor, venha aqui amanhã de manhã para nos despedirmos.-- ele pediu, se levantando também.
  – eu virei sim, Thomas.
  – eu te vejo amanhã, então.
  Saí de seus aposentos com meu coração doendo. Caminhei até meu quarto e me sentei na cama, procurando um lenço para limpar as lágrimas que teimavam em escorrer pelo meu rosto.

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