Nos aposentos oficiais

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  Os aposentos estavam bem diferentes do que eu me lembrava, ele tinha mudado as coisas por ali. Tinham poltronas novas, novos castiçais com velas, espalhados pelo lugar. Tudo bem iluminado. As cortinas eram novas. Tudo perfeitamente organizado.
  Tinha seu estilo, sua cultura.
  Caminhei, um tanto sem jeito, seguindo Thomas pelo pequeno Hall dos aposentos. Ele tirou o fraque e o deixou em uma poltrona.
  -- tenha paciência, já vou lhe mostrar -- ele comentou, enquanto dobrava as mangas da camisa nos cotovelos.
  -- estou ansiosa.-- respondi, esfregando as palmas das mãos.
  Ele sorriu e caminhou até sua sala de estar particular. Eu o segui de perto. E fiquei perplexa com o que meus olhos viram.
  Havia dezenas de pinturas pelas paredes, desde pequenos quadros a grandes. Com molduras elegantes e luxuosas, dispostas por toda sala de estar.
  Todas elas pintadas por ele.
  E em todas ela, havia eu.
  Meu rosto, minhas mãos, pinturas de corpo inteiro, retrato, apenas detalhes de mim. Eu não sabia o que dizer, minha boca estava aberta diante daquilo.
  Me aproximei de um grande quadro, em frente a sua escrivaninha, a pintura era minha, enquanto eu segurava uma xícara de chá nas mãos, com delicadeza.
  -- oh, céus -- murmurei, levando uma mão aos Lábios.
  -- lamento se causei algum choque -- ele se preocupou.
  -- oh, não... Eu não estava imaginando isso...-- respondi, olhando cada uma das pinturas bem de perto. -- é nisso que estava trabalhando?
  -- todas as noites, quando subia para dormir... O sono fugia de mim. Os fragmentos de minha vida me perturbavam.-- ele contou, me abraçando por trás e encaixando a cabeça no meu ombro -- eu sempre tinha uma tela para me distrair. E a única coisa que sempre vinha a minha mente, era você...
  -- meu Deus, deve ter levado séculos para pintar todos eles...-- suspirei, emotiva.
  -- desde que eu me lembrei de você. Todos os dias. Eu venho me dedicando a isso...
  Fiquei sem palavras. Era como um santuário, uma galeria toda dedicada a mim. E ao amor que ele sentia por mim. Cada detalhe estava sobre aquelas telas. Pinceladas desesperadas e outras mais centradas. Certamente, ele pintou durante vários dias e vários estágios de sua mente.
  -- tenho conseguido novas lembranças, desde aquele baile, em que você se revelou. Tenho me dedicado de corpo e alma para me lembrar de tudo que vivemos. Você está aqui, Amélia -- ele se aproximou, com a mão sobre seu coração -- sempre esteve...
  -- nada como a arte para salvar a nós...
  -- eu quero que Cumberland's Hall leve a arte a todos. Eu te vi hoje, mais cedo, com aqueles inquilinos. Eles conheceram Cumberland's Hall e a galeria, os jardins... De alguma forma, demos acesso a eles a arte.
  -- sim, eles contemplaram tudo e absorveram com sagacidade...
  -- essa galeria está aberta a todos, ela é o projeto de minha vida. Quero que, daqui cem anos, meus descendentes saibam que dediquei a minha vida a arte em sua essência... E que cada pessoa desse Condado tenha o prazer de admirar um quadro, pelo menos uma vez na vida -- ele jurou, sem hesitar ou piscar, havia paixão em suas palavras.
  -- eu estarei ao seu lado para cumprir tudo o que você disse.-- prometi, segurando suas mãos.
  -- a pintura salvou minha vida, Amélia... Eu não sobreviveria muito tempo, se não pudesse me lembrar de você... Quando você me incentivou a ser um artista, logo que nós encontramos aqui, eu não imaginava que chegaríamos a esse momento...-- ele sussurrou, olhando em meus olhos, e aproximou o seu rosto.
  -- sempre soube que seria um grande artista, meu amor...
  Seus lábios encontraram os meus num beijo apaixonado, sem urgência, apenas apreciação. Suas mãos me puxaram para perto do seu corpo, com a ânsia de sentir seu calor. Ele se afastou por um instante, sorrindo.
  -- queria te guiar por um passeio aos meus aposentos, minha adorada... Mas acredito que podemos esperar até amanhã.
  -- sim, podemos -- respondi, me inclinando para continuar o beijo que fora interrompido.
  -- mas, permita-me levar até o leito, ao menos -- ele rebateu, puxando-me até a porta do quarto que estava entreaberta -- detestaria te possuir aqui no meio do escritório...
  -- e qual o problema? Já fez isso hoje -- argumentei, seguindo-o de perto.
  Thomas não teve resposta para aquele argumento, apenas sorriu de forma maliciosa e fechou a porta atrás de nós.

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