Me deitei para dormir sentindo uma angústia tomar conta de mim. Me cobri, puxando os cobertores até meu pescoço, controlando a vontade de chorar.
Precisava aceitar que todo amor que senti e tudo que eu idealizei, não iria acontecer. A breve aventura que vivi com Thomas tinha sido tão insignificante para ele, que ele não se lembrava de nada.
Ao contrário de mim, que me lembrava de seu cheiro e de sua voz, revivia nosso beijo todas as noites e vivi o luto de corpo e alma, Thomas sequer se lembrou de meu nome.
Chorei por alguns longos minutos, me esforçando para me acalmar. Não adiantava mais tanto choro e sofrimento.
Eu concluí que iria fazer ele se lembrar de mim. Ele precisava saber que eu o esperei. E que ele simplesmente me decepcionou.
Quando ele soubesse de tudo, eu iria embora de Cumberland's Hall.
Respirei fundo.E na manhã seguinte, me reuni com os criados e iniciamos a organização da sala de artes, tudo conforme as exigências do Conde Cumberland.
Ao entardecer, tudo estava preparado.
Os criados, Tobey e Marshall foram chamados para outro serviço e eu fiquei sozinha, terminando os últimos detalhes.
Detalhes esses, que só poderiam ser feitos por uma mulher dedicada. Como verificar a harmonia da distância dos quadros ali, o ângulo que a luz do sol entrava pela janela e iluminava o lugar escolhido para ostentar o futuro retrato do Conde.Estava ajustando algumas pinturas, de acordo com a iluminação natural, quando ouvi a porta sendo aberta. Já estava anoitecendo e os últimos raios de sol iluminavam a sala.
-- oh, ainda está aqui, Amélia?-- ele perguntou, entrando na sala, com sua postura impecável, apesar de sua perna mancando.
-- me desculpa por ainda estar aqui, estou terminando alguns ajustes -- respondi, com uma reverência -- mas já estou de saída, se me permite.
-- não se incomode comigo, por favor. Pensei que tinha terminado seus afazeres. Já está anoitecendo.-- Thomas se explicou, caminhando pela sala, olhando ao redor.
-- os afazeres de uma governanta nunca acabam, mi lorde.
-- por favor, minha cara. -- ele comentou, balançando a cabeça -- já está tarde, está dispensada. Não aprecio essas jornadas de trabalho exaustivas para meus criados.
-- sim, vossa graça.-- fiz uma reverência e fui em direção a porta, me apressando.
-- Amélia?-- ele me chamou, com a voz firme e eu virei rapidamente, para lhe dar atenção-- a propósito, ficou muito boa essa disposição --elogiou, sorrindo e apontando para o lugar. -- fez um ótimo trabalho.
-- obrigada, mi lorde. A luz do pôr do sol adentra perfeitamente essa sala, -- voltei, explicando a ele -- deixei esse lugar reservado para seu retrato. Recomendo o baile ao entardecer, assim pode apresentar essa sala com seu retrato sob a luz do sol.
Ele olhou tudo que eu dizia, atentamente, com um sorriso no rosto. Era como se ele estivesse imaginando exatamente o que eu estava dizendo.
-- Devo admitir que Clarisse estava certa, cara Amélia. Você realmente é a melhor.
Aquele elogio entrou em meus ouvidos e desceu ao meu coração, com a mesma sensação de suas doces palavras há sete anos atrás.
Senti meu rosto se aquecer, enquanto ficava ruborizada.
-- obrigada, mi lorde. Fico feliz por ter gostado.
Ele sorriu.
Entre nós havia um clima, uma magia inexplicável. Pelo menos, para mim era intenso demais. E eu não conseguia entender como ele não sentia o mesmo. O silêncio pós-sorriso criou uma tensão e a maneira que ele me olhava me deixava sem ar.
Fiz a reverência para deixar a sala e ele me chamou novamente:
-- Amélia?
-- sim, vossa graça.
-- estive pensando sobre meu retrato.
-- e o que decidiu, mi lorde?
-- quero ser pintado enquanto estou pintando.
-- como assim?
-- venha cá, por favor.-- ele me chamou, me guiando até a porta da sala de arte que dava acesso a varanda na sacada, abriu a porta para mim e disse:-- quero que coloque o cavalete que está no corredor, bem aqui.
-- se me permite, que cavalete, mi lorde?
Ele me olhou de cima a baixo, encontrando seus olhos nos meus.
-- me perguntou ontem, cara Amélia, por que eu não sou um artista, ainda. Pensei no que disse e decidi que, apesar das circunstâncias ruins que atrasaram meu sonho, eu devo seguir em frente.
-- oh -- eu consegui dizer, pois meu coração batia descompassado.
-- então, mande colocarem o cavelete aqui. Mas isso é para amanhã, por hoje, você está dispensada. De verdade.-- ele disse, sorrindo de uma forma que me deixava sem chão.
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Entre As Memórias E Os Pincéis
RomanceA história de Amélia Pevensie, uma jovem criada de uma casa de família, que conhece o apaixonante Lorde Cumberland na sua adolescência. Uma breve paixão arrebatadora inunda seus corações, mas infelizmente o destino os afasta sem piedade. Sete an...