Devaneio ou não

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  Na manhã seguinte, eu acordei o mais cedo possível. Corri para a cozinha, onde as cozinheiras conversavam ansiosas. Todos os criados já estavam de pé, agitados com a chegada do Conde.
  -- bom dia, pessoal -- cumprimentei, me aproximando.
  -- bom dia, Amélia -- respondeu Polly, ansiosa.
  -- bom dia, Amélia -- disse Alfred, colocando um bolo na mesa -- conte algo sobre o tal Conde, por favor. Estou ouvindo mexericos desde que acordei e não sei em quem acreditar.
  -- Alfred, Alfred...-- eu respondi, separando uma bandeja para servir o Conde.-- foi horrível. Ele chegou de madrugada, estava chovendo horrores. Ele foi grosso e exigiu que a Condessa deixasse os aposentos oficiais para ele.
  -- então é verdade? A Condessa teve mesmo que sair do quarto?-- Polly se assustou.
  -- sim. Eu e Maeve tivemos que retirar todas as coisas de Lady Clarisse e preparar o quarto para ele.
  -- oh, céus! Quanta arrogância!-- ela exclamou, horrorizada.
  -- realmente, precisamos nos preparar -- comentou Alfred, preocupado -- esse novo conde parece que vai dar trabalho para nós.
  Eu concordei com a cabeça e sai, levando a bandeja para os aposentos do Conde. No caminho, passei na frente dos novos aposentos de Lady Clarisse Cumberland, e Andy deixava sua bandeja em seu quarto.
  Lady Clarisse deveria estar um pouco abatida por tudo que aconteceu.

  Segui adiante até chegar a porta dos aposentos dele, respirei fundo e bati a porta. Não demorou nada e ele abriu.
  Eu fiz uma reverência e quando levantei meu olhar, meu coração ficou em choque. Sem aquele casaco vermelho ensopado, com a barba adequadamente feita e cabelos bem penteados, um terno e gravata elegantes. Era Thomas. Apesar das cicatrizes no rosto e a barba que adornavam, disfarçando-as, eu podia reconhece-lo. Era Thomas Cumberland. Reconheci seus olhos e seu cheiro de mar.
  Meu amado tinha voltado dos mortos. Estava em frente aos meus olhos e agia como um cavalo truculento. Ele simplesmente não me reconheceu. Ele me olhou de cima a baixo, em silêncio, esperando que eu dissesse algo.
  -- bom dia, vossa graça -- eu saudei, esforçando para que as palavras saíssem de minha boca. -- trouxe seu desjejum.
  -- bom dia. Eu agradeço.
  Ele me deu licença para passar. Caminhei pelo quarto até a mesa, sentindo meu coração disparar de uma maneira inexplicável. Minha mente estava a mil e eu não conseguia compreender o que estava acontecendo.
  Coloquei a bandeja na mesa e dispus o bule, a xícara e o pires. Coloquei tudo em seu devido lugar. O Conde me observava de uma maneira estranha. Doía em mim ver que ele não me reconhecia. Talvez não fosse ele, por isso a indiferença. Talvez fosse um parente ou alguém semelhante.
  -- tenha um bom dia, vossa graça. Se precisar de algo, estou a disposição -- eu falei, saindo do quarto e ele não me respondeu.
  Enquanto andava pelos corredores da mansão, eu me questionava o que poderia ter acontecido. William tinha me informado, anos atrás, que estavam a procura do corpo de Thomas, depois de um ataque. Me dando a quase certeza de sua morte. Quase certeza.
  Eu chorei por anos por alguém que estava bem vivo.
  E agora ele estava ali, completamente irreconhecível, cheio de grosseria e arrogância, e simplesmente não me reconheceu. Ou simplesmente não era ele.
  Bom, havia uma chance de eu estar enlouquecendo. Eu poderia estar surtando e imaginando coisas. Talvez aquele seria realmente um parente distante com algumas semelhanças, e eu, cheia de saudades, acabei enxergando coisas.
  Encontrei Lady Clarisse na varanda, olhando o dia agradável que estava surgindo. O sol estava brilhando no céu, diferente dos últimos dias. O jardim estava verdejante e o céu azul, uma.paisagem maravilhosa. Desde que saiu de sua depressão, ela apreciava as frescas manhãs de Suffolk.
  -- bom dia, mi Lady -- cumprimentei,e aproximando.
  -- bom dia, Amélia. Sinto muito por tudo que aconteceu ontem a noite.
  -- eu digo o mesmo, mi Lady.
  -- como eu temia, é um homem arrogante. Irei me reunir com ele hoje, para saber como ele quer as coisas, de agora para frente. Você serve a ele, agora.
  -- que Deus nos ajude, mi Lady.
  Ela concordou com a cabeça, mas seu olhar estava pesaroso.
  Enquanto eu passei o dia garantindo que a transição dos aposentos fosse o mais leve possível, Lady Clarisse se reuniu com o Conde por horas.
  Maeve e Andy terminaram de tirar todos os pertences dos armários dos aposentos e fizeram a transferência de quarto. Quando entardeceu, não tinha nenhum resquício de que uma Condessa tinha dormido naqueles aposentos antes dele.
  Os criados trouxeram suas malas e seus pertences foram colocados em seus devidos lugares. Conde Cumberland estava devidamente alojado em seus aposentos oficiais.

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