Dias se passaram. Micaela voltou ao seu quarto de criada. Nina não tinha paz, Joseph tampouco. Mas Nina era porque Micaela não dava. Ele não a procurou, e ela tampouco. Quando ele entrava no quarto para ver Suri ela simplesmente saia, ou então se afastava, com os olhos distantes.
Ele ainda não se acostumou ao ver o cabelo dela picotado, mutilado daquele jeito. No começo teve receio de ela tentar algo contra Suri. Não era a mesma Micaela cuja ele confiaria a filha.
Mas...
- Papai diz que eu serei rainha um dia? – disse sentada a sua cadeira, na frente do espelho. Micaela, que dobrava uns lençóis, a olhou.
- E tu serás. – disse, se aproximando.
- Só não entendo como. – disse tristinha, olhando as penas imóveis. Joseph estava tão imóvel quanto as penas ela, do lado de fora do quarto. Viu Micaela passar a mão no cabelo curto outra vez – Não posso me por de pé como governarei algo ou alguém assim?
- Tu serás uma rainha exemplar, disso estou certa. – disse Micaela se aproximando.
- Como podes saber?
- Porque tu és linda. Preciosa, inteligente. Quem liga para pernas com uma pessoa sendo tão especial? – perguntou tocando o nariz dela. Suri sorriu.
- Eu imagino como seria... Papai nunca deixou... – pensou alto.
- O que teu pai não deixou? – perguntou se abaixando na frente da menina. Joseph não gostou do descaso com o qual ela falou dele.
- Eu nunca me vi de pé. Estou sempre sentada ou deitada. Pedi a ele para me pôr de pé uma vez, mas ele disse que não podia, e saiu. – Micaela escutava quieta.
- Pois vamos ver... – disse se ajoelhando em frente a cadeira.
- É sério? – perguntou admirada e animada. Micaela assentiu.
Joseph não queria assistir aquilo, mas continuou ali. Ver como Suri se privava era como lastimar a si mesmo. Mas ainda viu Micaela cuidadosamente apanhar a menina por debaixo dos braços e colocá-la de pé em frente ao espelho, segurando-a por trás.
- Viu? – perguntou mantendo a menina de pé. Suri arrumava o vestido sorrindo da própria imagem. – Tu és linda, será a rainha mais linda que qualquer reino possa ter.
- É diferente. – disse se olhando – Mas não consigo... – disse, um nozinho de esforço se fazendo entre as sobrancelhas.
- Não consegue... Ei, não faça isso! – pediu vendo que o esforço era para tentar mover as pernas. Joseph estava prestes a entrar no quarto quando ela intercedeu.
- Porque não funcionam, assim como as tuas? – perguntou frustrada.
- Porque tu és diferente. Especial. – disse puxando a cadeira de volta, ela pôs Suri cuidadosamente lá. – Não te entristeças por isso, não vale a pena. – Suri assentiu caidinha. - Vamos falar de outro assunto! Quer dar um passeio?
- Você diz lá fora? – perguntou admirada novamente. Micaela assentiu – Mas papai...
- Queres ou não? – Joseph revirou os olhos com a implicância.
Mas Suri assentiu, radiante. Ele saiu dali antes que Micaela passasse com a menina. Acompanhou o passeio de longe. As duas apenas deram voltas no jardim e apanharam algumas flores. Depois desse dia ele teve novamente certeza de que Micaela não causaria mal a Suri. Enquanto isso, Nina descobria o significado da palavra inferno.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Se entregando ao inimigo
Romance" Eu nunca pensei que conheceria meu verdadeiro amor desse jeito. Primeiro vi seu lado demônio e depois seu lado anjo" Micaela, uma formosa plebeia. Sendo perseguida e cobiçada pelo rei de seu próprio reino, sendo sua única saída fugir. Agora fugir...