Era aparente que o homem no banco das testemunhas havia feito uma plástica pra tentar reparar seus lábios, mas ainda havia uma grande cicatriz ali. Eu logo lembrei de quando arranquei o lábio de Jeff… Mas era o Jeff que estava aparecendo na minha memória, ou era ele? Olhei pro meu advogado, esperando por uma resposta.
— Sim, eu sabia que ele viria. – Ele sussurrou, mas quem era aquele cara? – Não te contei pois era irrelevante, ele não vai dizer nada e, se disser, irei expô-lo. Não precisa se preocupar.
— Quem é ele?
— Você realmente não se lembra? Bem, logo irá saber.
— Senhor Neumann, – O promotor começou. – Pode explicar o que aconteceu com o seu rosto?
— Isso não é pergunta que se faça, não concorda?
— Senhor Neumann, por favor, responda. – O juiz ordenou.
— Ok… Eu fui mordido.
— Por quem? – O promotor perguntou.
— Por um cachorro. – O promotor suspirou, então se virou de costas.
— Evidência número sete da promotoria, por favor. – Após dizer aquilo, o projetor mostrou a imagem do rosto de Jeff, que foi destruída pelos meus dentes, ao lado de uma foto do rosto daquele rapaz antes da cirurgia. Houve uma comoção na corte, mas o promotor continuou. – A foto à direita foi tirada antes da sua cirurgia plástica, confirma?
— Sim.
— E a foto à esquerda mostra o rosto da vítima após ser assassinada. Conseguem ver a semelhança? Então, não podemos afirmar que o “cachorro” que te atacou foi o mesmo que atacou o Senhor Steward?
— Objeção. – Edwin disse.
— Indeferido. Senhor Neumann, está ciente de que mentir perante o júri constitui crime, não está?
— Mas eu não estou mentindo. Já teve um cachorro, Excelência? Eles são bem grudentos e fazem tudo o que você quer, lambem a sua mão mesmo que os chute. – O que…? Por que aquelas palavras estavam fazendo os meus nervos explodirem? Por que eu queria chorar? Por que eu estava me vendo lambendo entre os dedos dele enquanto seus pés pressionavam minhas pernas contra o chão? – Então, se uma pessoa age como um cachorro, ela é um cachorro.
— Senhor Neumann, serei mais direto. – O promotor disse. – A pessoa que te mordeu é a mesma que está sentada no banco dos réus?
— Hm… – Neumann me encarou e aquilo me arrepiou. Eu não estava aguentando, mal conseguia respirar. – Não sei, ele parece diferente. Quer dizer, esse cara aí é quase anoréxico, mas o que me mordeu tinha uma bunda tão gorda que eu quase perdia meus troféus de futebol americano nela. – Não. Não, isso não aconteceu. Isso não aconteceu!! Por que eu não conseguia lembrar de nada? – É uma metáfora, aliás. – Suspirei de alívio. É claro, não teria como eu esquecer de uma coisa dessas.
— Senhor Neumann, a pessoa que deixou uma cicatriz em sua boca foi a mesma que seus pais adotaram quando você tinha dezoito anos, cujo nome é Elliot Taylor? – Neumann finalmente tirou o sorriso do rosto, e suspirou.
— Como eu disse, foi um cachorro… No meu próprio conceito do que ser um cachorro significa.
— Está ciente de que, ao cometer perjúrio, poderá receber uma pena de até cinco anos de prisão, certo?
— Não estou mentindo.
— Mas está evitando responder às minhas perguntas.
— Estou respondendo. Cabe ao júri interpretar o que eu digo. – Era clara a frustração no rosto do promotor. Ele bufou, coçando a cabeça.
— Sem mais perguntas.
— A defesa gostaria de fazer alguma pergunta? – O juiz perguntou.
— Não, Excelência, mas solicito que o testemunho do Senhor Neumann seja descartado dos autos, já que não é confiável.
— Deferido. – Edwin sorriu, olhando para o promotor. Eles tentaram me ferrar, mas vejo que a Igreja conseguiu comprar o silêncio daquele cara… Mas por quê?
— Você está bem? – Quase pulei da cadeira quando o Edwin pousou a mão no meu ombro. Eu definitivamente não estava bem, havia um sentimento dentro de mim que eu não conseguia identificar, nem mesmo era capaz de entender o que era. Me sentia violado e exposto, da mesma forma que me senti quando fui atacado por aquele cara na prisão. Por quê? Eu estava ficando tonto apenas ao pensar nisso. – Elliot, o que está sentindo? – Eu podia ouvir sua voz, mas estava muito longe. Minha cabeça girava, era difícil respirar. – Elliot?!
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Sawdust
УжасыApós afogar as mágoas na bebida por conta do término de seu namoro, Elliot Taylor acorda nu em uma oficina de marcenaria. Ele tenta lembrar o que aconteceu e, ao conhecer o belíssimo marceneiro, tira a conclusão de que dormiu com ele na noite anteri...