Crônicas Vespertinas

46 1 0
                                    

- Bom, tá na minha hora de ir para casa... você sabe né, antes que você fique mal acostumada comigo aqui...

- Sei de nada viu hahahaha

- Tenho que ver umas paradas, na segunda já volto a trabalhar... acabou a folga.

- Haha, e eu vou aproveitar e lavar minhas roupas, já que você cuidou da limpeza da casa...

- É senhorita... pode dizer que sou foda... rsrs

- Tá se achando muito hein...rs

- Que nada... também de adoro viu?!

Ela jogou um pano de pratos em mim quando lhe dei as costas. Eu me virei e ela fingiu que estava ocupada com outra coisa.

- Ah, sua capeta agora você vai ver!!!

Corri em sua direção e a agarrei, ela tentou escapar mas eu a encurralei na parede. Nós ficamos rindo até nossos olhos se encontrarem e aquele clima estranho pairar sobre nós. Eu a soltei meio sem graça e saí de seu apartamento. Caminhei pelo corredor até chegar no meu, destranquei cuidadosamente a porta. Minha mãe parou de varrer e me olhou.

- Achei que fossem só amigos...

- É... nós somos... rs

- Ela é uma boa moça, gosto muito dela.

- Ela é sim.

- Você está feliz?

- Sim... 

- Bom... e ela?

- Ela vai ficar bem... 

Eu não sei como as coisas iriam ser daqui para frente, depois daquele primeiro beijo as coisas ficaram meio diferentes. Pelo menos para mim... está ficando cada vez mais difícil segurar esses sentimentos dentro de mim... Guardei os livros na estante e capotei na cama. Fiquei olhando fixamente para o teto enquanto meus pensamentos fluíam devagar. Ontem eu não dormi quase nada, por um minuto, antes dela adormecer recostada em meu peito ela me olhou de um jeito... era como se ela pudesse ler meus pensamento... como soubesse meu segredo. Antes disso ficamos falando sobre assuntos diversos, vimos um filme de ação, comemos pipoca, bebemos vinho ouvimos música, rimos... fiz de um tudo para mantê-la distante de sua tristeza. 

                                                    --------------------------------------

Quando terminei de executar as últimas notas da partitura o relógio já marcava 17 hrs. Hoje não haveria ensaio porque o Gabe ficou constipado. Eu já não me sentia tão grogue quanto estava de manhã. Uma manhã tão entediante que pensando bem, teria sido melhor ir para a escola. Mesmo sem ir ainda vi uns conhecidos, a Alice e o Guga. Mal consegui falar com ele porque meu pai ficou me arrastando a manhã inteira entre os convidados, me "apresentando" para seus amigos como seu futuro sucessor, mesmo eu já tendo deixado bem claro que não queria isso para mim. 

O céu estava com um tom azul-algodão, aliás... as nuvens pareciam mesmo feitas de lã. O sol era apenas um rastro de luz num horizonte distante e escuro. As imensas árvores se rendiam e concediam à brisa suave o prazer da dança. Minha música ecoava pelo cais enquanto que meus pensamentos eram  carregados de interrogações.

Amanhã talvez eu a reencontre na escola, mas é simples... é só ignorá-la como sempre fiz. Ela é só uma garota, nada mais. Guardei meu violoncelo, o arco e as partituras dentro do estojo e caminhei de volta para casa. Mercedes estava preparando uma torta gelada de chocolate quando passei pela porta da cozinha.

- William, vai querer raspar o chocolate da panela?

- Mas é claro que sim, Mercedes...

- Eu estava ouvindo você daqui.

- E aí?

- Menino, você tem muito talento.

- Valeu Mercedes, rs... a propósito... o chocolate está ótimo...rs

Continuei andando pela casa até chegar ao meu refúgio. Coloquei meu instrumento no seu devido lugar e como não tinha mais o que fazer fui dar uma navegada na net. Liguei o computador e arrastei uma cadeira, sobre a mesa estavam vários livros e papéis, de um dos volumes sobressaia uma foto. Eu a puxei e fiquei um minuto observando a imagem enquanto a máquina à minha frente carregava a tela inicial. Era uma cena que eu não sabia se queria guardar ou não na mente ou mesmo no papel. Amassei-o e joguei-o em algum lugar. Pus os fones e liguei a play list no aleatório.

"...Guarde o que foi bom e jogue fora o que restou..."⒂

                                      ---------------------------------------------

Estava um belo dia para um café da manhã da high society, claro que preferi o ar requintado do que ficar sentada por 8 h na escola, foi uma decisão unânime entre mim e minhas irmãs, papai não teve escolha. Aliás, ele não deu muitos detalhes do porquê estávamos voltando a participar do círculo social dos Carter's mas tenho minhas próprias teorias. O lugar era um jardim cheio de esculturas e cercas vivas, tendas brancas onde eram servidos os comes e bebes. Eu já havia tomado um chá de hortelã e comido umas torradas, sabe como é... coisas leves para não ficar inchada logo cedo e o vestido ficar parecendo que era dois números menores que o seu. Encontrei várias colegas da minha antiga escola, todas pareciam muito cheias de laquê. Resolvi ficar na minha, me sentei próximo à piscina e fiquei vendo as babás correndo feito loucas atrás dos pentelhos. Eu sei que algumas delas fazem até "serviço extra" na tentativa de descolar uma graninha a mais. Conheço algumas meninas lá da escola que fazem isso, eu sei porque elas não tem grana para comprar aquele tipo de sapatos.

Estava aqui no meu canto, só observando quando ele se aproximou. Ele parecia bem calmo. Perguntei sobre a Helena na esperança de que ele pudesse me explicar o que houve mas sua resposta foi bem evasiva. Eu fiquei louca da vida quando o vi aos beijos com a Luana, sério que apostei minhas fichas no casal errado? Enfim... vamos ver o que vai rolar quando eles estiverem cara a cara na escola. Eu me despedi e caminhei até onde as chatas das minhas meia-irmãs estavam sentadas. Em poucos minutos iríamos embora... mas antes disso, meu olhar foi atraído por um objeto exposto num dos bancos brancos que estavam dispostos nas laterais da piscina. A cor da rosa contrastava com a alvura do assento. Eu a peguei delicadamente e discretamente, meu olhar fez um tour rápido pelo ambiente, não havia ninguém ali que pudesse ser candidato a meu admirador secreto. 

Agora me encontro aqui revisando as questões de Física, perder aula implica em estudar em dobro, as provas se aproximam e preciso manter minhas notas impecáveis. Na mesa onde estão meus livros há um vaso com duas rosas vermelhas. Meu celular vibrou, automaticamente fechei a cara. Essa pessoa não se toca? Fica me ligando e não diz nada... que inferno!

Destravei a tela já decidida a falar umas poucas e boas para o indivíduo... mas não era uma chamada, era um sms. Apenas quatro palavras:

Você estava linda hoje!

Meu coração de repente acelerou... chequei novamente o número, era ligeiramente diferente daquele que vinha infernizando com ligações misteriosas. Digitei rapidamente algumas palavras... Aaaah, dessa vez você não me escapa!

Pode me dizer quem diabos é você?


Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora