Festival Part.1

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Pus a mochila nas costas e desci silenciosamente as escadas da casa que ainda estava imersa na escuridão. Meus pais estavam dormindo, chegaram bem tarde de uma reunião. Na parede o relógio indicava que eram 3 hrs e 15 min da manhã. Eu precisava me apressar, David e o resto da galera me aguardavam na casa do Alan. Chegando a garagem retirei o molho de chaves do bolso, destravei o carro, entrei no veículo e girei a ignição... em poucos segundos eu já podia sentir a brisa da madrugada no meu rosto. No banco de trás estava minha case contendo meu instrumento. Depois de alguns minutos eu já podia avistar os primeiros sinais urbanos. 

Fiz aquela rota tão familiar a mim, por enquanto o tráfego de automóveis estava lento... o que me permitiu chegar rapidamente no meu destino. Quando cheguei eles já haviam terminado de por os instrumentos e suas bagagens no porta malas, só estavam esperando por mim.

- Aê, manos... todos prontos?

Alan estava muito empolgado, era nosso primeiro festival, nossa primeira vez na estrada em busca pela fama. Dividimos quem ia em cada carro e partimos. Seriam longas 6 hrs até o local do evento.

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Levantei da cama silenciosamente, com todo cuidado do mundo para não acordá-la. Esta havia sido uma das noites mais perfeitas que tivemos desde que nos assumimos como namorados. Cheguei cansado do trampo e mesmo assim ela me convenceu a irmos comer fora. Eu admirava seu esforço em tentar me libertar do estresse. Conversamos, rimos, comemos pizza, tomamos coca e sorvete, dividimos os lados do fone enquanto andávamos de mãos dadas na rua... E depois, quando já estávamos deitados um de frente para o outro, trocamos carícias e palavras. Ela acabou me confessando que estava pensando em fazer a inscrição para o teste de proficiência. Eu já desconfiava disso desde que vi o panfleto em suas coisas. Demonstrei entusiasmo e a encorajei, afinal não é todo dia que se tem uma chance de realizar um sonho. Eu queria vê-la feliz, e não frustrada.

Caminhei até o banheiro a fim de fazer minha higiene pessoal. Quando terminei de tomar banho e me vestir fui preparar o café para quando ela acordasse não tivesse que perder tempo com isso. Conferi as horas em meu relógio, 4 hrs em ponto. Hora de ir para a selva de pedra. Fui até seu quarto me despedir. Afastei a mecha de cabelo que lhe cobria a testa e beijei o local. Ela esboçou um leve sorriso permanecendo de olhos fechados, logo em seguida caiu no sono. Eu já ia saindo do quarto, mas aquela pulga atrás da orelha voltou a me perturbar. Não me contive, sei que isto é errado, mas... 

Me aproximei cautelosamente da cômoda, tudo estava do mesmo jeito... exceto a fotografia. Demorei um pouco até encontrar os pedaços de papel espalhados pelo piso. Dentro do meu peito alguma coisa se acalmou e não deixei de me sentir um pouco orgulhoso. Olhei para a cama, a moça que ali dormia tinha uma expressão tão doce...

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- Ai maninho, boa aula...

- Valeu.

Desci do carro e fiquei observando o cenário ao meu redor. Tudo estava completamente igual. Fazia um bom tempo que eu não vinha à escola. Sei lá... parece algo bem louco, mas parece que todos me olhavam meio estranho, não que eu estivesse enfaixado ou com curativos... era o simples fato de eu ter estado ausente. Nunca cheguei a faltar tantos dias seguidos. Meu irmão acelerou e seguiu rumo ao centro da cidade. Ajeitei a alça da mochila que já escorregava pelo meu ombro direito e caminhei pelo gramado tranquilamente entre os grupos de adolescentes. Dentre eles um rosto se destacou. Ela veio correndo em minha direção com um sorriso de orelha a orelha. Abri os braços e a segurei em pleno ar, girando-a num ângulo de 360º. 

Seus cabelos castanhos lhe encobriam a face quando a pus no chão novamente. Ela era tão leve...

- Olha só quem resolveu aparecer!

- É isso aí baby, estou de volta...

Ela ficou segurando minhas mãos, balançando-as como fazia quando éramos crianças. Removi a mecha de cabelo que escondia seu olho esquerdo, ela sorriu sem jeito... o que também me deixou sem ação. Ela sempre fazia isso, mulheres... sempre deixando interrogações no ar! Fomos interrompidos pelo sinal estridente que nos intimava a entrar no prédio e nos dirigir a nossas salas. Nos separamos no corredor, ela foi para o 2º B e eu para o 3º C.

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Esta é a primeira vez, pelo menos desde que me lembro... que o assento a minha frente está vazio. Fora isso, tudo está normal... a algazarra, a inquietação dos alunos, as cadeiras fora do lugar. Quando o sinal soa, todos se apressam para deixarem a sala em sua configuração original, seis fileiras. Os alunos retardatários entram junto com a professora que acaba de chegar. Fico observando até que o último deles passe pela porta... 

Patrícia põe seu material sobre a mesa e olha para os indivíduos com reprovação. 

- Estou de olho em você, Victor!

- É...hehe... eu sei que sou irresistível...

- Hm... se eu fosse você... eu não brincaria tanto. Cuidado viu, você está por um fio.

- Oxe 'fessora, o que foi que eu fiz?

- Apenas não leva a sério minhas aulas, fora as inúmeras faltas sem justificativas...

Respirei fundo e baixei minha cabeça sobre o tampo da mesa, era sempre assim quando um professor pegava Victor para Cristo. Ele nunca dava o braço a torcer, o que irritava ainda mais quem quer que estivesse discutindo com ele. A galera ficava apenas rindo e torcendo para Victor vencer a disputa verbal. De repente fez-se silêncio na sala. Achei estranho, geralmente demorava em torno de uma aula até que a confusão se dissipasse.

Levantei a cabeça não me contendo de curiosidade. A secretária estava na porta falando com a professora. Patrícia assentiu e voltou para a sala.

- Helena, estão lhe chamando na diretoria.

Seis palavras que todos temem ouvir. Instantaneamente todos me olharam e a sala se encheu de cochichos. Levantei-me e caminhei em direção à porta. Eu já tinha uma breve noção do que se tratava, mas é claro que os demais alunos desconheciam a verdade e já estavam bolando mil e uma teorias do porquê alguém como eu estava sendo solicitada... .Não que eu fosse santinha... mas também não fazia a linha de garota que vivia aprontando. Eu era apenas... Eu.

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Quando cheguei no pátio da escola tudo estava imerso no mais completo silêncio. Ai que droga!!! Estou super atrasadaaaaa!!! Corri o máximo que era possível com aquele salto assim que vi o zelador fechando os portões.

- Eeeeeeiii, me esperaaaaaaa!!!

O senhor ficou me olhando com um ar de reprovação. Mas não podia fazer nada, após o sinal havia uma margem de 10 minutos para atraso. E eu, estava dentro do limite. Hahaha... Respirei fundo e me recompus, agora precisava chegar o mais rápido que eu podia em minha sala. É inevitável levar falta quando você se atrasa, principalmente se você é o número 1 da lista de chamada. 

Apressei o passo, o primeiro lance de escadas foi fácil, mas a fadiga começou a atacar no segundo. Parei para recuperar o fôlego, o corredor estava vazio exceto pela jovem sentada em um banco de frente para a porta da secretaria. Forcei a vista e imediatamente a reconheci. Minha nossa, o que será que eu perdi? Nesse momento a porta se abriu e alguém fez sinal para que ela entrasse. Após ter certeza que ninguém estava me vendo prossegui rumo a minha sala. Eu não podia correr o risco de levar uma repreensão.

Ao passar pelo local no qual aquela moça estava a alguns minutos atrás, não deixei de sentir curiosidade e me perguntar o porquê de Helena estar na diretoria.

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