Desventuras em Série

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Durante todo o percurso em direção ao meu condomínio todos nós viemos calados. Eu estava no banco de trás e ele ao meu lado, tocando com as costas de sua mão as minha mão esquerda. Quando o carro parou ele desceu, deu a volta no carro e abriu a porta para que eu descesse, ainda estávamos imersos naquela atmosfera de paixão. O pai dele parecia indiferente a nós... menos mal. Eu fiquei bem nervosa quando ele me conduziu ao carro e pediu carona para mim. Ele tinha acabado de me desejar uma boa noite e antes de entrar no carro que o levaria para casa, olhou para mim e ficamos naquela troca silenciosa de olhares, de repente ouvi alguém chamando meu nome, o rapaz alto atravessou o saguão e veio ao meu encontro com uma cara meio preocupada. Era o Fernando. 

- Helena, que bom que você chegou... eu e minha mãe estávamos no seu apartamento... seu telefone tocou...era sua mãe...

Eu tentava prestar atenção nele e em William que me olhava silenciosamente. Eu não sei o que estava passando em sua mente . Notei sua expressão mudar a partir do momento que meu amigo chegou e me abraçou, eu não tinha falado do Fernando para ele. Eu havia esquecido completamente... será que ele sentiu ciúmes? Tipo, eu sabia que ele estava gostando de mim e era recíproco, mas a gente não estava namorando... pelo menos ele não tinha me pedido e nem eu era louca de pedir. Tudo que eu sabia era que estávamos nos entendendo melhor. E agora, será que estraguei tudo? Sabe, a gente só ficou, trocou uns beijos e carinhos... é algo sem compromisso, mas ele parece ter se sentido muito chateado com o que "deve ter pensado" em ter visto. Nossos olhos às vezes veem maldade onde não existe.

- Sua mãe estava no Hospital...parece que sua avó passou mal...

Eu ouvia apenas trechos do que Fernando falava, em minha mente passavam muitas coisas diferentes.

Perdida em meus devaneios eu só o vi dar de costas para mim e entrar no carro. Ele estava chateado, eu podia sentir.

- Helena? Você ouviu o que falei?

- Ah, desculpe... o que você disse?

- Que sua avó teve uma parada cardiorrespiratória...

Aquilo foi como um choque, eu precisava falar urgentemente com minha mãe. Também precisava urgentemente ligar para William. E se ele não atendesse? O que ia acontecer agora? Dentro do elevador meus pensamentos recocheteavam nas paredes metálicas que pareciam se mover lentamente até o 4º andar.

- Você está bem?

- Sei lá...

- Desculpe se estraguei sua noite...

- De boas...

- E aí, quem era seu...amigo?

- Ah, é da escola...

- Entendi.

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Quando o carro de luxo estacionou fiquei meio bolado, mas reconheci a garota que saiu de dentro acompanhada por um carinha metido a boyzinho. Ele não me era estranho, não mesmo... de onde será que o conheço?! Daqui para mais tarde eu lembro, mas agora... isso não vem ao caso.

- Helena...que bom que você chegou...

Ela parecia muito dispersa, será que estava saindo com aquele cara? Ela não tinha me falado nada sobre ter namorado quando nos conhecemos, e até mesmo agora, depois de já fazer um tempinho que somos amigos ela nunca abriu o jogo. Mas de boas, é a vida pessoal dela, não precisa me dar nenhuma satisfação. Só que isso muda um pouco as coisas...Ele me olhou de cima a baixo, tudo bem... eu não era nem um galã de novela das 9, mas também não era tão acabado assim.

 De certa forma me senti aliviado quando ele se foi, pois só então ela percebeu a seriedade da notícia que eu estava lhe transmitindo. A acompanhei quando pegou o elevador, afinal ia para o mesmo lugar que eu. Ela dispensou minha ajuda quando perguntei se queria apoio para andar, falou que foi só uma torção e que já estava bem. Ainda tentei puxar assunto, mas calada ela estava, calada ficou. De boas, sem pressão. 

- Aí... melhoras para sua avó...

- Valeu...

Observei enquanto ela caminhava lentamente pelo corredor, uma espécie de melancolia se instalava e se alastrava pelo meu corpo. Eu não podia fazer nada por ela, somente esperar que tudo ficasse bem.

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- Ô Victor, fala de novo como foi que você e seus amigos acabaram se perdendo dos outros...

- Ah mãe... foi só uma pequena distração ...e aí bummm todo mundo sumiu e ficou só a gente e tals...

- Tem certeza que você não aprontou nada?

- Eeeuuu? Que é isso? Tá me tirando?

- Eu sei muito bem que você não é nenhum anjo, viu...?!

Minha mãe cismou que toda essa treta foi por culpa minha, na boa... por que tem que sobrar só pra mim? Agora tudo que dá errado é minha culpa? Que injustiça...

- Você recebeu a mensagem? Sua tia está vindo na próxima semana passar uns dias aqui com suas primas... 

- Ai não, só o que faltava... bando de frescas...

- São apenas uns 4-5 dias, as meninas acabaram de ficar de férias... vão visitar sua avó, mas antes disso passam por aqui para dar um oi...

- Podiam dar um "oi" só lá da porta e voltar...

- Eu hein... não entendo isso, vocês eram tão amigos quando eram crianças...

- Mãe, as coisas mudam...

... e as pessoas também... Por culpa daquelas intrometidas que a Sarah passou quase um mês de mal comigo. Isso rolou quando todos nós tínhamos na faixa dos 14-15 anos no baile do 9º ano. Elas foram contar para a Sarah que eu fiquei com a melhor amiga dela. Foi um inferno...

- E aí mãe, o que tem pra o jantar?

- Você vai saber na hora em que estiver comendo, agora vai logo tomar um banho, você está fedendo...

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Enquanto minhas unhas dos pés secavam eu conferia as fotos que tirei da viagem deitada na minha cama. Haviam muitas paisagens diferentes, flores, vegetação, corais, o céu da tarde, pessoas se divertindo na praia, pessoas no ônibus e aquele novo "casal" se formando. De repente meu celular vibrou em cima da cama. Destravei a tela... um número novo surgiu na minha frente.

 Ora bolas...Quem poderia ser? Atendo ou não? Pode ser que seja engano...

Fiquei ali por alguns segundos analisando prós e contras de se atender um número desconhecido até que minha curiosidade me venceu.

- Alô?

...silêncio...

- Alô?

Do outro lado havia apenas silêncio. Um misto de impaciência e frustração preencheu todo o meu peito... eu nem pensei muito, apenas bloquei o maldito número.

Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora