Introspectiva

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De repente me peguei fazendo uma coisa que a tempos não fazia. 

Aqui estou eu, sentada nos últimos degraus das escadas externas... O céu estava riscado de vermelho e laranja, os últimos vestígios do sol. Pus mais uma colherada na boca, nesse momento o gosto doce e a sensação fria do sorvete de creme era um pequeno pedaço do paraíso. Havia um sentimento estranho dentro de mim, revirando meu estômago... minha cabeça... meu coração. Eu queria chorar, mas era como se meus olhos fossem incapazes de produzir lágrimas. 

Eu já estava no terceiro estágio... primeiro foi a negação, depois a raiva e agora a introspecção. Meus hormônios realmente estavam agitados. Até então, eu não fazia idéia do quão ciumenta e possessiva eu poderia ser. Mas não foi o fato deles estarem próximos que me perturbou... foi a faísca que atravessou o olhar de um para o outro. Posso até estar sendo dramática, mas a verdade é que eu sempre quebro minhas próprias regras e em determinado momento passo a  buscar nos outros uma aceitação, uma aprovação... Eu tenho medo de não ser boa o suficiente e acabar sendo descartada. Todos nós temos medo de um dia acordar e ver que não importa o quanto nos esforcemos aquele sentimento, aquela impressão de que falhamos, não passa.

Pesquei meu celular de dentro do bolso da calça... eu nem tinha me dado o trabalho de trocar de roupa quando cheguei. A tela acesa revelava que já eram quase 19 hrs... Os dias estão se passando tão rápidos...  Pus os fones nos ouvidos, mais uma colherada de sorvete na boca e deixei a música fluir...

"We're creatures of indecision, easily undone... Caught inside collisions under a dying sun..." 

"Nós somos criaturas de indecisão, facilmente desfeitos...Preso dentro de colisões sob um sol morrendo..."

Fiquei ali no meu canto sendo apenas uma telespectadora daquela cidade pulsante... mesmo que estivessem distantes, os sons ainda eram audíveis: O barulho dos carros, das motos, das buzinas... Eu até podia imaginar as pessoas andando de um lado para o outro nas calçadas voltando do trabalho, da academia, da escola... 

"... Take our time for granted, entitled in this life..." (28)

"...Não damos valor ao nosso tempo, intitulado nesta vida..."

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Tudo estava envolto em uma atmosfera de paz e prosperidade. O único som dentro do ambiente eram resultado do contato entre os talheres e os pratos.

- Victor.. hoje de manhã eu encontrei uma de suas professoras no banco ...

Desviei o olhar de meu prato para o rosto de minha mãe. Ela parecia uma leoa avaliando sua presa antes de atacar.

 Puta merda... fodeu.

- Rs... e aí?

Fingi que não sabia do que se tratava. Eu tinha esperanças de que elas tivessem conversado sobre qualquer coisa, exceto sobre minha "expulsão".

- E aí, o quê? Para quê você quer saber sobre o que conversamos?

- Ah... por nada...

A desconfiança aumentou em seu olhar. 

Ah droga! Por favor, Deus... me salvaaaa!

Como se fosse uma resposta às minhas preces, senti meu celular vibrar... nem olhei se era mensagem ou ligação, já fui me levantando da mesa... erguendo o aparelho na tentativa de usá-lo como álibi para que eu pudesse escapar daquele clima pesado.

- Fugindo, hein?!

- Quem? Eu? Ah, não mãe...rs...sabe... é que eu preciso atender...rs... é tipo... super importante! É sobre um trabalho da escola...

Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora