E que Comecem os Jogos...

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Pontualmente às 5 da manhã o alarme ecoou por todo o complexo de cabanas no meio da floresta nos avisando que a aventura havia acabado de começar.

- Afz, ninguém merece... eu estava no meu melhor sono...

A Helena estava apagadona, não importava o barulho que eu fizesse, nem que lá fora fizessem... só depois de umas três sacudidas foi que ela acordou bem atordoada.

- A que horas você dormiu ontem?

- Sei lá...

- Pois bem, melhor se aprontar logo, não quero me atrasar para o café da manhã.

Quero chegar lá antes que aqueles garotos esfomeados acabem todo o presunto e a muzarela. A parte boa da Helena é que ela não fica brigando pelo banheiro, e como acordei logo no primeiro toque do alarme tive tempo de fazer toda minha higiene pessoal sem preocupações. Eu estava terminando de escovar meus cabelos quando ela saiu do lavatório.

- Nossa!!!, mas já?

Ela ignorou meu comentário... Que pessoinha mais insossa...

- Vamos lá... o dia vai ser longo.

Ela se vestiu em tempo recorde, fiquei apenas observando ela por o jeans, a blusa, o casaco e o all star. Ela não era feia, não tinha o mesmo "corpão" que as meninas da natação e da ginástica, mas era bem feminina com suas curvas delicadas. No vestuário da escola, na hora da educação física era um verdadeira competição, campeonato de reclamações e também motivos de risos e piadinhas infames. Umas tinham o quadril largo, outras os seios muito avantajados, ou as panturrilhas muito grossas, os ombros largos, o nariz muito grande ou os lábios não eram cheios o suficiente, na pior das hipóteses você podia desenvolver estrias ou aparecer uma espinha enorme no dia daquele encontro, além das gordurinhas provenientes do abuso excessivo de frituras que tinham o dom de se acumular na barriga. Eu, graças a Deus nunca sofri tanto com esses problemas pois sempre fiquei ligada na minha alimentação e vez ou outra dava uma corridinha ao redor do quarteirão de bicicleta.

Quando chegamos ao refeitório, a fila já estava gigante, poxa vida será que essa galera acampou aqui?

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Depois do revigorante café da manhã, eu me sentia pronto para enfrentar qualquer coisa. Os instrutores começaram a reforçar as regras do local e a nos dar dicas de sobrevivência porque passaríamos o dia inteiro explorando mata a dentro. Pediram que levássemos de um tudo na mochila porque a caminhada era longa e cheia de surpresas até o local onde acamparíamos. Eu já estava sentindo saudades do conforto do meu colchão só de imaginar como seria a noite de hoje. 

Pois bem, fomos divididos em dois grupos novamente com uma professora e 3 instrutores para nos conduzir. Fizemos um alongamento, enchemos nossos cantis de água e com as mochilas nas costas começamos a adentrar na floresta. E que os jogos comecem...

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A professora ia falando sobre os diversos exemplares de pteridófitas e angiospermas e alertando para que não cogitássemos o remoto pensamento de colher uma fruta, pois ela podia não ser tão comestível quanto podia aparentar ser. Na minha frente Alice e Victor ficavam trocando faíscas de hostilidades, ela não estava nenhum pouco satisfeita de sua amiga Rosie estar no outro grupo e ela ser obrigada a ficar com um bando de pessoas que ela não tinha tanta afinidade... apesar de ser a miss simpatia.

Enquanto a aula de biologia ia sendo ministrada ao ar livre, alguns dos garotos e garotas ficavam bagunçando, tirando fotos, outros faziam anotações e eu só ficava observando o mundo verde a minha volta, folhas e flores de todos os tamanhos e tonalidades, os insetos sobrevoando e rastejando por entre a paisagem. A umidade e os raios do sol que mal conseguiam atravessar a copa das árvores faziam daquela floresta um cenário meio sombrio. Recebemos inúmero avisos de que nunca deveríamos perder nosso grupo de vista e caso isso viesse a acontecer deveríamos procurar um ponto alto e localizar as chaminés do acampamento, em seguida voltar para lá imediatamente. 

Tudo estava indo até bem, quando Alice saiu correndo atrás do Lucas porque pelo que entendi, ele pegou sua câmera, cheia de registros fotográficos da viagem desde a partida até o presente momento. Eles enveredaram mata adentro, nem a professora, nem os guias, nem os outros alunos prestaram muita atenção pois estavam muito à nossa frente e quem estava mais próximo de nós, nem ligou muito porque sabiam do gênio de ambos os personagens da discussão, uns ficaram até rindo. Eu esperei uns 2 min e fui atrás deles sem me preocupar se alguém viria atrás de mim. Se nos perdêssemos pelo menos seriamos os 3 e não eu sozinha. Quando finalmente os alcancei estavam bolando no chão, ela o socava mas não causava nenhum dano, ele só ria e escondia o objeto tomado o que fazia com que a raiva dela só aumentasse.

Tentei separá-los mas eu sozinha não tinha forças suficientes, Alice era bem mais pesada do que eu e Victor tava nem aí para o que estava rolando, só se divertia com a situação. De repente surgiu outra pessoa e foi dessa forma que obtivemos êxito em resolver aquela mini confusão, no final das contas ele devolveu a câmera o que ela recebeu com uma cara de desprezo. Caminhamos de volta afim de unir-se ao nosso grupo, mas a nossa frente surgiu uma bifurcação e aí todos ficamos com uma interrogação estampada na cara.

- Esquerda ou direita?

- Eu não sei...

- A culpa é toda sua, quem manda ser tão infantil?!

- Minha?? Só que nunca, você que é uma mocinha mimada...

- Idiota!!! Vê lá como fala comigo hein?

- Se não o quê? Vai mandar o Max me pegar? Hahaha, desculpa, eu tinha esquecido que ele te trocou...

- Aí, vocês podem parar de serem tão...

- Oia só...?! Ela fala, hehehe...

Eu respirei fundo, o outro cara olhou para mim, parece que nós éramos os únicos adultos ali.

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Optamos por seguir a direita, aqueles dois não paravam de falar um segundo sequer. Estou começando a pensar que foi uma péssima ideia ter saído do grupo e vindo atrás deles. Estava tudo de boas, por um bom tempo fiquei ignorando a discussão deles. De repente só se ouviam o burburinho dos outros alunos e quando dei por mim, vi apenas de relance as costas da garota que desaparecia floresta adentro, nem pensei duas vezes antes de segui-la. Quando finalmente a alcancei ela tentava inutilmente separar Alice do Victor.

- Ei, vocês ouviram alguma coisa?

- Ouviria se você parasse de berrar...

- Ai meu Deus, ninguém se mexe...

A nossa frente surgiu um animal com os dos restos de sua caça na boca, ela parecia uma onça pintada, mas de pequeno porte. Nos olhou e começou a se aproximar, os guias já tinham dito que haviam alguns animais aqui que tinham sido acolhidos e viviam protegidos por conta do risco de extinção. Eles não eram muito habituados ao contato humano e se os víssemos não deveríamos fazer movimentos bruscos. Porém, nós somos um grupo muito sortudo, a Alice inventou de tirar uma foto e quando se aproximou dela, o animal se irritou pois pensou que ela ia tomar sua caça e avançou em nossa direção. Não teve jeito, todos nós corremos em busca de proteção. Diz-se que é diante do perigo que a gente descobre nossa verdadeira natureza, e foi ali que eu percebi o quanto sou egoísta. Meu instinto me dominou. Eu não pensei em ninguém, eu não me importei com ninguém, eu só não queria me machucar.


Convergindo (Em Construção)Onde histórias criam vida. Descubra agora