105. Uma coisa não tão maluca assim

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POV GIZELLY

Entrei no escritório da equipe de Rafaella, um tanto quanto desesperada. Rafaella havia chorado o tempo inteiro no telefone enquanto eu dirigia até ali e eu precisava vê-la. Só desliguei a ligação quando lhe avisei que já havia chego e que já estava a caminho da sua sala.

No corredor, encontrei Marcella que primeiramente se assustou em me ver ali naquele horário, mas rapidamente sua expressão suavizou e ela me lançou um sorriso agradecido.

"Ela tá na sala dela," a prima de Rafaella, que eu já considerava uma grande amiga, me disse e eu concordei com a cabeça, indo a passos rápidos até a porta no final do corredor.

Não bati, apenas entrei e fechei a porta rapidamente atrás de mim. A cena que encontrei partiu meu coração. Rafaella chorava intensamente sentada no sofá que tinha ali, seus cotovelos apoiados em suas coxas e seu rosto enterrado em suas mãos.

"Amor," falei com a voz quebrada, a alertando da minha presença.

Antes que eu pudesse fazer algo, eu vi seu rosto levantar até me olhar e seu corpo rapidamente vir de encontro ao meu. A segurei em meus braços da melhor maneira que pude, por conta do contato repentino.

Não sabia o que tinha acontecido, então me limitei a apertar o corpo de Rafaella no meu e acariciar seus cabelos, dizendo que tudo ia ficar bem. Eu faria com que ficasse bem.

Quando Rafaella se acalmou, eu a puxei para sentar novamente no sofá, de frente para mim.

"Me conta," pedi carinhosamente, acariciando seu rosto.

"Eu não aguento mais um problema atrás do outro, Gi, eu não aguento mais," Rafaella falou frustrada e novas lágrimas ameaçaram cair dos seus olhos. "Parece que quando eu penso que venci, vem a vida e joga outro problema, aí mais outro e outro. Eu juro que tô exausta. Não tem uma parte de mim que não queira só gritar," ela continuou seu desabafo desesperado.

Eu não sabia o que tinha acontecido naquele dia em específico, mas sabia que era uma grande sucessão de eventos que a levaram até ali.

"Me conta o que houve," pedi mais uma vez, quando ela pareceu já ter falado o que queria.

Busquei seus olhos com os meus e senti suas mãos procurarem as minhas.

"Existe a possibilidade do Pedro anular as decisões que já foram tomadas sobre a Larissa?" a pergunta pesou no rosto de Rafa e eu finalmente pude entender parte do seu desespero.

"Possível sim," respondi e quando ela já ia tirar suas mãos da minhas, segurei com mais firmeza. "Ei, calma," pedi, buscando mais uma vez o seu olhar que havia desviado de mim com a minha resposta. "Possível, mas improvável, meu amor," tentei tranquilizá-la, mas não teve efeito.

"O que isso quer dizer?" ela perguntou, frustrada.

Eu sabia que não era comigo e sim com a situação.

"Ele tem direito de tentar mudar o acordo da guarda, alegando sua inaptidão, mas ele teria que ter provas para isso..." eu não havia concluído, mas ela me interrompeu, finalmente conseguindo tirar suas mãos das minhas e se levantando.

"Eu não vou aguentar passar por esse inferno de novo," ela disse andando de um lado para o outro.

Me levantei do sofá também, mas não sabia se deveria tentar lhe confortar com o toque novamente, ou deixá-la expressar seus sentimentos do jeito que estava fazendo.

"Amor, eu sei que batalhas judiciais são difíceis, mas..."

"Difíceis? Difíceis, Gizelly? Você não tem noção do que são," ela falou se virando pra mim. "Ver uma pessoa qualquer, que nunca te conheceu, falando coisas absurdas de você e da sua vida na frente uma outra pessoa, que tem o poder supremo de decidir se você pode ou não ficar com a sua filha," Rafaella falava com raiva. "Isso não é só difícil, é torturante!"

Suspirei. Provavelmente eu não soubesse mesmo o que era aquilo. Não como Rafaella.

"Eu entendo..." comecei.

"Não, não entende!" ela disse, ríspida.

Soltei um suspiro pesado. Eu sabia que não merecia a rispidez em sua voz, mesmo que ela estivesse frustrada, eu só estava tentando ajudar.

"Eu sei que você está com raiva, mas eu vim aqui pra te ajudar," falei em tom neutro.

Rafaella me encarou e eu pude ver sua expressão suavizando ao mesmo tempo que se transformou em arrependida.

"Desculpa, não queria ser grossa com você," ela disse passando as mãos no rosto. Ela deu dois passos em minha direção e segurou meu rosto em suas mãos. O seu olhar era intenso e dizia muita coisa que eu não conseguia decifrar. Um sorriso — poderia dizer
sonhador e triste ao mesmo tempo — apareceu no canto da sua boca. "Por que eu não conheci você antes?"

Levei minhas mãos até a sua cintura e suspirei, já tendo pensando o mesmo inúmeras vezes. Prendi meus olhos nos dela.

"O nosso tempo era esse," falei a resposta que tinha encontrado em meus pensamentos. "Pode não ser o tempo perfeito, mas é o nosso."

Rafa levou suas mãos até a minha nuca.

"Posso dizer uma coisa maluca?" ela perguntou.

"Ok?" respondi, incerta.

Ela sorriu, ao mesmo tempo que suas unhas começaram a arrastar pela minha pele, em um carinho familiar. Seus olhos haviam mudado de cor de repente e se o misto de sentimentos que eu havia sentido naquele pouco tempo não tivesse me desnorteado, as suas palavras seguintes o fariam.

"Eu queria que Larissa fosse minha e sua," Rafa falou em um quase sussurro que me deixou sem ar. "E às vezes, eu sinto que é. Ela pode ter meu rosto, meu cabelo e meus olhos, mas toda vez que eu olho para ela, vejo a tua alegria contagiante, o teu jeito de falar pelos cotovelos, a tua fome absurda," Rafaella falou essa última parte rindo e eu, inevitavelmente, a acompanhei. "Tem tanta Gizelly nela e isso é porque você da tanto seu pra ela pra mim," os olhos de Rafa agora estavam mareiados de emoção assim como os meus. "Eu sei que é muito, que é intenso, que é doido, mas eu sinto a cada dia mais que ela é parte de mim e de ti."

Lágrimas desciam livremente pelo meu rosto e Rafa tentava secá-las. Era como se minha respiração estivesse presa na minha garganta. Quando não respondi nada, a expressão de Rafa mudou para receio.

"Eu não te assustei com isso, assustei?" perguntou, temerosa.

Eu balancei minha cabeça, como se acordando de um transe. As pontas da minha boca se abriram em um sorriso que eu não tinha controle sobre e que, se tivesse espaço, seria infinito para se adequar a alegria que eu sentia por dentro com aquelas palavras de Rafaella.

"Me assustar? Nunca!" falei, enfim. Foi minha vez de tomar seu rosto com as minhas mãos. "Até hoje eu não acredito na sorte que eu dei, Rafaella," falei negando com a cabeça. "Eu me apaixonei pela mulher dos meus sonhos e de brinde, como se eu merecesse, ganhei o melhor presente do mundo. Larissa é parte de mim desde que eu a conheci. Eu não preciso ter estado lá para quando ela foi feita ou quando ela nasceu. Eu não precisava ter conhecido você antes. Eu sinto em mim que já estava escrito que seria assim. Toda vez que olho para ela, tenho mais certeza que eu poderia ter feito todas as escolhas erradas, mas o destino ainda me traria aqui. Não tem biologia que explique isso, Rafa. Eu não sei como é possível, mas ela é o melhor de nós duas."

Rafaella espelhou o meu sorriso em seu rosto antes de me puxar para um beijo rápido, porém cheio de significados. Acho que ela sentia o mesmo que eu naquele momento. Não haviam mais palavras a serem ditas. Há muito tempo, organicamente, já tínhamos nos tornado uma família. Aquele era só o reconhecimento do que já existia.

"Eu vou deixar ninguém tirar ela de ti," prometi.

"Da gente, Gi. Ninguém vai tirar ela da gente, eu tenho certeza."

E eu também tinha.

Notas da autora:

Boa tarde, boiolinhas. Vamos de maratona? 👀

O que acharam do que essa quase Dr se transformou???

Tem mais um de noite para matar a saudade.

Até o próximo!

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