114. Pequenos convites

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POV RAFAELLA

Depois daquela intensa conversa em meu escritório, Gizelly e eu acabamos conversando melhor sobre como ela poderia manter a relação linda que havia construído com Larissa, mesmo que a nossa não estivesse em seu melhor momento. Ficamos, então, de Gizelly ir buscar minha filha no colégio aquele mesmo dia e sempre que as duas quisessem e passassem tempo juntas no apartamento de Manu. Por mim, Gizelly iria até o que fazia pouco tempo, eu considerava - mesmo sem dizer - o nosso apartamento, mas percebi durante a conversa que ela não se sentiria confortável desse jeito, então deixei estar. Me doía saber que ela ainda não estava pronta para uma conversa comigo, e mesmo que a falta que eu sentia dela em cada momento do dia fosse gigantesca, eu sabia que ela merecia todo o tempo e espaço do mundo que quisesse.

Eu sabia que as minhas palavras naquela manhã haviam sido o primeiro passo para reconstruir a nossa relação, da mesma forma que sabia que precisaria muito mais do que aquilo também. Como Gizelly mesmo havia dado a entender quando saiu do apartamento naquela noite: palavras não valiam tanto quanto sentimentos. E ações valiam muito também, logo eu queria demonstrá-la como havia me arrependido do que insinuara aquela noite.

Eu comecei com algo que já deveria ter feito há muito tempo, antes que tudo se complicasse tanto: tive uma nova conversa com Pedro. A conversa foi bastante passional, de uma maneira negativa, e acabamos discutindo seriamente, porém eu não permiti que aquilo me acovardasse de dizer tudo o que eu queria dizer. Deixei claro para ele que já havia dado tempo o suficiente para ele compreender a minha relação com Gizelly e que a partir daquele momento, ele não teria mais poder algum de decisão sobre a minha vida romântica. Qualquer decisão que envolvesse o meu relacionamento com a minha namorada, seria feita por nós duas, e apenas nós duas. E que ele deveria buscar os meios de fazer paz com toda aquela situação, pois Gizelly estava sim na vida de Larissa e era uma parte importantíssima dela, quisesse ele ou não.

Apesar de ter ouvido algumas coisas que me machucaram, saí daquela conversa me sentindo mais forte. Tudo o que eu disse sobre Larissa, Gizelly e eu não era nada que eu não acreditasse completamente. Mesmo sem todos os títulos, biologia, anos de história, eu nunca havia me sentindo tão em família como quando estávamos juntas, praticando a rotina que havíamos criado de maneira tão natural, juntas.

Parte de entender tudo isso de maneira tão límpida e clara, me fez me arrepender ainda mais do que havia sucedido, de ter me deixado levar, mas ao mesmo tempo, eu decidi que a partir de agora olharia para frente. Faria de tudo para reconstruir minha relação com Gizelly e retomar o nosso lar de três.

Por conta da mesma conversa que tivemos aquele dia no meu escritório, eu não havia mais procurado Gizelly, nem por mensagens ou por ligação. Nos falávamos apenas quando tínhamos que compartilhar informação sobre os momentos dela com Larissa e eu estava esperando ela me procurar quando estivesse pronta, assim como havíamos combinado nesse dia. Confesso que quanto mais tempo passava, mais tinha medo de que ela acabasse se afastando demais de mim para querer voltar, mas não deixei meus medos falarem mais alto e dei todo o espaço que ela queria, confiando e esperando que uma hora ela estivesse pronta para que eu reconquistasse o que era nosso.

Foi em uma terça-feira, algumas semanas depois, quando eu havia ido buscar Larissa no apartamento de Manu e Gizelly, que as coisas finalmente começaram a mudar.

Eu estava exausta. A minha carreira continuava atribulada, mesmo que apresentando certos sinais de melhora, e eu não podia negar que estava tendo problemas para dormir bem nos ultimos tempos. Meu corpo me cobrava um pouco e algumas pessoas mais próximas, como minha mãe e Marcela, já monstravam sinais de preocupação.

Toquei a campainha daquele apartamento tão conhecido por mim e acabei sorrindo, inevitavelmente, ao ouvir vozes e risadas do outro lado da porta. Manu foi quem acabou me recebendo e assim que ela abriu minha visão para o apartamento, a imagem que eu tive não era incomum, mas uma nostálgica.

"Boa noite, Manu," falei num tom de voz cansado, porém ainda mantendo aquele sorriso no rosto, que mesmo que eu quisesse, não conseguia me desfazer.

"Boa noite, Rafa. Entra, entra!" minha amiga falou, com sua animação habitual e eu acabei buscando o olhar de Gizelly, querendo saber o que ela achava daquele convite. Afinal, respeitando seu espaço, todas as vezes que eu ia buscar Larissa, só a esperava pegar suas coisas na porta mesmo.

"Entra, Rafa," Gizelly, como se entendendo meu olhar, chamou e eu senti meu coração acelerar com o sorriso delicado que ela lançava até mim.

Com pasos ainda incertos, entrei no apartamento e antes que eu pudesse pensar em dizer alguma coisa, senti o corpo de Larissa colidir com o meu, assim como a sua saudação aguda em meus ouvidos. Sem poder evitar rir do jeito da minha filha, me agachei levemente para abraçá-la e deixar um beijo no topo da sua cabeça.

"Como foi o final da tarde, bebê?" perguntei ainda no abraço e me preparei pro monólogo que certamente veio depois da minha pergunta. Sem pensar, como algo habitual de um costume não esquecido, busquei os olhos de Gizelly para a nossa troca naquelas situações, um olhar que dizia: "Lá vem". E para minha surpresa, os olhos castanhos retribuíram aquele meu gesto impensado e ambas sorrimos, mesmo que um pouco tímidas. Tem coisas que são mesmo inevitáveis, não consegui deixar de pensar.

"Mãe, a gente pode terminar de assistir o filme antes de irmos?" Larissa perguntou depois que ela terminou de contar tudo o que achava que era importante de ser dito sobre o seu dia (com detalhes, é claro).

Eu, que nesse momento, estava sentada ao lado oposto de Gizelly no sofá, com Larissa entre nós duas e Manoela na cozinha, busquei mais uma vez a aprovação da minha namorda para poder responder aquilo. Por mim, assistiriamos todos os filmes já criados se significasse compartilhar mais algum tempo daquele jeito com elas, mas essa não era a minha decisão a tomar.

"Não podemos deixar o filme pela metade, mini Rafa," Gizelly respondeu para a minha filha, porém eu sabia que era mais uma resposta pra mim do que para Larissa. "Você sabe que eu não me aguento de curiosidade," ela completou, voltando seu olhar até o meu e mais uma vez me sorrindo de leve. 

Eu ainda não sei como meu rosto não rasgou com o tamanho do sorriso que se estendeu sobre meus lábios. Gizelly estava começando a dar pequenos passos em minha direção e isso era tudo o que eu mais estava esperando naquelas ultimas semanas. Algum sinal de que ela estivesse pronta.

Quando ela virou seu corpo no sofá para encarar a tv ao memo tempo que envolveu Larissa em seus braços antes de dar o "play" novamente no filme, eu senti meu corpo relaxar contrastando com o meu coração acelerado. Reação essa que apenas piorou quando os olhos castanhos voltaram a procurar os meus antes de finalmente focarem na televisão de vez.

Sem dizer nada, eu entendi o que Gizelly estava fazendo. Ela estava me convidando aos poucos. E eu estava mais do que encantada em aceitar qualquer um de seus convites.

A.N.:

Boa noite, boiolinhas! Como estamos?

Bom, como todo o relacionamento das duas sempre foi muito orgânico e construído lentamente, eu acredito que a reconstrução desse deve ser da mesma forma.

O que vocês acham?

Espero que estejam gostando.

Até o próximo!

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