10. Certo?

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POV GIZELLY

Estávamos tomando café e esperando Rafa e sua filha chegarem. Manu havia combinado com ela na noite anterior para nos encontrarmos hoje pela primeira vez para falarmos do que realmente me trouxera a Goiânia. Manu estava animada desde cedo para ver a "afilhada de coração", como ela chamava a filha de Rafa. Eu estava um pouco nervosa, mas isso era normal antes de começar qualquer caso. Meu nervosismo nesse só estava um pouco mais aflorado, por conta de ser alguém que Manu se importava tanto e porque eu ainda estava com a minha confiança abalada devido à minha ultima derrota.

Tentei pensar positivo, - como qualquer texto de auto-ajuda que eu havia lido tinha me mandado-, mas era difícil. Pensei então em focar nas atitudes de Manu, que percorria o apartamento de maneira jovial e alegre como ela sempre foi. Manu tinha um jeito de trazer alegria e luz pro lugar em que ela estava.

Comi em silêncio, deixando o trabalho de preencher o ambiente com a minha amiga, que fazia isso com todo o prazer do mundo. Manoela falava sobre seu livro, sobre o dia no estúdio, sobre Larissa (esse era o nome da filha de Rafa). Ela passou a maior parte do tempo falando na menina. Eu não me considerava alguém muito boa com crianças, mesmo tendo convivido com inúmeros dos meus primos quando estava na casa da minha avó.

"Ela é a Rafa em miniatua só que com um jeito mais aberto, palhaço..." Manoela continuou com seu monólogo, enquanto eu apenas concordava com a cabeça. "Nessa parte ela é mais eu e você quando éramos crianças, você lembra?" ela disse rindo, com certeza lembrando de alguma travessura específica dos nossos tempos de meninas.

"Se ela for como a gente era, a Rafa que se cuide," decidi responder a minha amiga enfim. E eu falava sério, eu e Manoela não eramos "flor que se cheire" quando crianças, como diz minha avó.

"Espero que quando ela cresça mais, ela fique mais Rafa e menos Ginu," rimos juntas.

Ficamos mais um tempo em uma conversa alegre, relembrando de histórias do passado. Manu não morava em Iúna como eu, na verdade, dava para ver de longe que Manoela sempre foi menina de cidade grande. Mas ela passava todas as férias de verão na chácara dos avós, que por sorte divina, era no mesmo interior do Espírito Santo que eu vivia.

Lembro muito bem quando nos conhecemos, ela tinha por volta dos 8 anos e eu tinha 9. Nessa idade eu já vivia pelas ruas da cidade com o meu "bando" de crianças, inventando protestos, fazendo desfiles e aprontando de maneira geral. Manu estava conhecendo a cidade com sua avó quando nos viu na praça central em uma roda. Nessa dia estávamos protestando contra o desmatamento e ela achou aquilo meio engraçado. Lembro de perguntar se ela queria assinar o nosso "abaixo assinado" quando ela se aproximou e ela riu das 8 assinaturas que tínhamos. Claro que eu fiquei brava e soltei a "mini advogada" que tinha em mim,- palavras de Manoela - mas acabamos nos entendendo e formando uma amizade que perdurou durante todos os verões seguintes, aguentou os anos de faculdade e até a vida de adulto.

"A Rafa está chegando, ela apenas se atrasou porque passou no mercado para comprar material de bolo," Manoela me tirou dos pensamentos antigos. Olhei confusa pelo o que ela tinha acabado de falar e ela deu de ombros. "Larissa disse que queria fazer bolo com a gente," ela respondeu a minha pergunta "muda".

Acabei tendo que rir da situação. Manoela não sabia cozinhar nada, imagina um bolo.

"Eu sei o que você está pensando," disse ela apontando o dedo para mim. "Saiba que Rafa é uma boleira profissional e ela me deixa bater as claras!" terminou orgulhosa.

Levantei meus braços, num gesto de "eu me rendo", mas não aguentei e ri de novo, o que me fez ganhar uma uva de presente na cara. Foi a vez de Manoela rir.

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POV RAFAELLA

Eu ia chegar de novo atrasada para um compromisso com Gizelly e me perguntei no caminho entre o mercado e o apartamento de Manoela, se isso interferiria em como a advogada pensaria de mim. Eu geralmente era bem pontual com as meus compromissos, mas eu ainda estava tentando me ajustar a ter que fazer as minhas coisas e ter uma criança que entende o suficiente para impor suas vontades. E Larissa adorava impor as suas.

Fomos o caminho inteiro ouvindo músicas infantis, que eu como qualquer mãe, já sabia de cor. Larissa achava graça quando eu começava a cantar, porque ela dizia que eu era "péssima" e isso sempre fazia eu tentar cantar ainda pior para arrancar mais risadas da minha filha.

Chegamos no prédio de Manoela quase meia hora atrasadas e eu tive que pedir ajuda ao porteiro para conseguir subir com todas as coisas que eu comprei. Além das coisas com as quais eu havia saido de casa, Larissa fez eu comprar diversos recheios e coberturas para o que agora tinha se tornado "uma festa de cupcakes". O senhor era bem gentil e me ajudou a subir com as sacolas, enquanto eu me dividia em carregar algumas coisas e segurar a mão de Lari.

Ele deixou as sacolas na porta do apartamento de Manoela e eu agradeci antes dele voltar para o seu posto. Antes que eu pudesse fazer algo, Larissa ja tinha aberto a porta e já tinha corrido para dentro do apartamento gritando e se jogando em cima de alguém que estava no sofá da sala.

"A senhora não é a tia Manoela," ouvi minha filha dizer.

"Não, sou amiga dela, Gizelly," ouvi a resposta e me aproximei para ver o que acontecia.

Na verdade quem estava no sofá era Gizelly e não Manoela, como Larissa deve ter imaginado. Pensei que a minha filha ficaria sem graça, mas ela me surpreendeu dizendo:

"Você é amiga da minha mãe também?"

Isso fez com que Gizelly levantasse os olhos, como se tivesse procurando a resposta para aquela curiosa pergunta. Quando ela me encontrou com os olhos, eu lancei um sorriso para ela e dei de ombros. A advogada então voltou seus olhos para a minha filha que ainda aguardava a resposta.

"Sou sim. E você é a famosa Larissa?" Gizelly perguntou.

"Sim!" Lari respondeu entusiasmada. "Se a senhora é amiga da minha mãe, então eu posso lhe chamar de tia, certo?"

Isso fez Gizelly me olhar novamente.

"Certo?" respondeu.

Nota da autora:

Vocês pediram mais um capítulo, então aqui vai.

A gente se vê no próximo!

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