77. Máscaras

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A música desse capítulo é Ease My Mind - Ben Platt.
Indico.

POV GIZELLY

A melhor coisa que eu podia ter feito foi convidar Rafa para vir comigo nessa viagem. Os dias não estavam sendo nada fáceis e ela parecia saber exatamente o que fazer para tornar tudo mais suportável. Todas as noites voltávamos para o meu apartamento vazio - agora eu conseguia ver o quão realmente vazio ele era - e em meio a uma rotina suave de movimentos - que acabamos tomando sem nos dar conta -, eu me pegava esquecendo de como era viver antes ali. Viver sem os passos leves de Rafaella pela cozinha, sem ouvir ela cantando baixo sertanejo enquanto fazia absolutamente qualquer coisa ou sem ter ela sorrindo para mim toda vez que me pegava a observando fazendo as anteriores. Rafaella dava vida para aquelas quatro paredes mais do que eu pude dar nos muitos anos que morei ali. Mas eu sabia que o sentimento de casa que eu sentia nesse momento não tinha nada a ver com parede nenhuma.

Os dias no hospital eram difíceis. Eu ainda não havia contado para Rafa que eu estava pagando grande parte do tratamento de Carlinhos - não por medo de sua reação, pois sei que ela não me julgaria -, mas por sentir vergonha, culpa. E esses sentimentos eram difíceis de mostrar. Rafaella não me pressionava em momento algum, ao contrário, era sempre paciente e respeitava meus silêncios até mais do que eu gostaria.

Nesse momento ela estava deitada na minha cama, vestida apenas com uma camiseta larga minha e roupa íntima. O óculos se equilibrava na ponta do nariz, enquanto ela lia em silêncio. Eu estava trabalhando no outro quarto, que servia com uma espécie de escritório, mas havia largado tudo quando vi que não iria conseguir me concentrar. Fui para o meu quarto com intenção de me afundar nos braços de Rafa e fingir que consegui dormir por mais uma noite inteira como eu estava fazendo nos últimos dias, mas a cena acabou me prendendo no batente da porta.

"Vai vir para a cama não?" ela perguntou sem tirar os olhos do livro.

"Tô apreciando a vista," respondi, fazendo ela finalmente me olhar sorrindo.

"Pois vem apreciar de mais de perto," ela falou fechando o livro.

Abri um sorriso largo e fui até a cama. Ela deixou o livro na cabeceira e abriu os braços em um convite que eu gratamente aceitei. Me deixei invadir pelo seu cheiro e calor, enquanto ela me envolveu em seus braços.

"Eu já disse que te amo hoje?" eu perguntei com a boca em seu pescoço, próximo a sua garganta.

"Já sim," ela falou rindo baixo e começando um carinho em meus cabelos. "Mas pode tá dizendo de novo," brincou.

"Pois eu amo demais," falei beijando seu pescoço diversas vezes, a fazendo rir.

Ficamos mais um tempo em silêncio, aproveitando a companhia uma da outra. Eu sempre morri de medo do silêncio - afinal é nele que mora os maiores gritos -, mas Rafaella o tornava suportável... De certa maneira até confortável.

No outro dia voltamos para o hospital, como já tinha se tornado rotina. Às vezes eu deixava Rafaella lá com Dona Marcele e ia fazer outras coisas pela cidade, mas passávamos a maior parte dos nossos dias ali. Quando Rafa não estava comigo, estava fazendo companhia a Dona Marcele ou brincando com Cláudia. Sim, ela é perfeita.

Estávamos caminhando em silêncio até o o quarto de Carlinhos quando ouvimos uma grande comoção vindo dele. Eu e Rafa nos olhamos rapidamente e com os olhos arregalados e o coração acelerado, nos apressamos.

"Gizelly!" Dona Marcele exclamou emocionada assim que me viu.

O médico e as enfermeiras no quarto cobriam a minha visão da cama, então eu não sabia como interpretar a expressão dela.

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