Capítulo 101 - Pecado

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Maidowa é uma cidade pesqueira no norte de Ruber, rodeada por uma densa floresta tropical. Foi em suas profundezas que Harel Ionani, uma mulher de 30 e poucos anos, filha de um albanense com uma ruberina, escutou um suave choro, enquanto procurava frutas para suas geleias. Não houve hesitação: Ela seguiu na direção do pedido de socorro até chegar a uma gruta úmida, sob as raízes de uma árvore caída.

O cheiro de carne apodrecida a preencheu de náuseas, mas ela continuou em frente conforme o choro aumentava. Ela foi tomada por uma surpresa terrível ao ver a criança de poucos dias de vida no colo de uma mulher... morta. Havia uma flecha atravessada em seu peito. Harel adiantou-se um passo até seus olhos se ajustarem à penumbra.

Foi então que ela viu aquela criatura, com a forma de um homem enorme, a pele vermelha e grossa, cheia de rachaduras e ferimentos terríveis. Os pequenos chifres na cabeça e nos ombros despontavam, assim como os grandes caninos brancos, mostrando sua natureza não-humana. A face, serena, estava parcialmente encoberta pelos longos cabelos negros.

Subitamente, ele ofegou.

Com o susto, Harel tropeçou nas pedras limosas e caiu. O bebê começou a chorar mais alto. Seu coração disparou. Ela sabia que era um Fabulare, mas nunca havia visto algo como aquilo. Os gritos de fome e frio do pequenino, porém, definiram sua conduta: Ela ignorou o medo do desconhecido e tocou a criança. No mesmo instante, a criatura abriu os olhos cinzas, como estrelas frias e moribundas. Harel congelou. O monstro moveu seus braços lentamente, acariciando os cabelos da mulher falecida com uma das mãos, enquanto estendia a criança com a outra. Sua voz parecia um cochicho íntimo, grave, secreto:

_ Cuide... do nosso... filho....

Lágrimas se misturavam com o sangue das feridas. Harel tomou a criança para si. Seu corpo movia-se por si só na tentativa desesperada de proteger o indefeso. Passando os olhos rapidamente pelo pequeno, ela concluiu: "É um menino... normal". Seu peito se aqueceu e ela envolveu o bebê em seu próprio casaco. O choro diminuiu aos poucos até que o sono imperasse.

Voltando-se ao Fabulare, Harel reuniu o restante de sua coragem e perguntou:

_ Quem é você...?

A criatura sorriu, fechando os olhos lentamente. Respondeu:

_ Sou como você... mas mais antigo. _ Ele suspirou _ Algo entre a alma... e o ser... Tauh.

Com as mãos trêmulas, Harel fugiu da gruta. "Não é possível...", ela pensava ao correr de volta para casa. "Essa criança... é algum tipo de híbrido? Mas não é possível...", ela olhava atentamente as feições delicadas dele. Com um riso desconcertado, disse:

_ Você é lindo, pequenino... Não posso te deixar sozinho, não é? Mesmo você sendo... uma... uma... abominação...

A decisão foi simples, mesmo que a situação em si fosse um mistério absurdo. Harel sempre acreditou que enfrentar os problemas sem reclamações é a melhor forma de viver. Ter encontrado uma criança na floresta, sem poder sequer confirmar sua origem, definitivamente era algo problemático, mas ela preferiu pensar nisso como uma "oportunidade": Ela sempre quis um filho, mesmo sem interesse em se casar, além, claro, da impossibilidade de sequer gestar devido a sua doença crônica. Seja lá o que fosse, a pessoinha a sua frente precisava de alguém e ela podia assumir esse papel.

No dia seguinte, ela levou a criança à polícia, notificando que o encontrou em sua porta, em um cesto. A assistência social a ajudou com a burocracia da adoção e dos muitos registros. O mais difícil, porém, foi definir a data de nascimento. Quanto ao nome, não houve dúvida:

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