Capítulo 14 - Edisia

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No ar paira uma névoa fina, cinzenta e fria. O vento uiva por entre as grutas e agita os sinos que ela mantém pendurados na porta. A noite é tão profunda e negra que é impossível ver através dela. Nem a lua, nem as estrelas tem a coragem sequer de aparecer naquele recinto.

A caverna dela é coberta de tecidos negros remendados, como grandes painéis sem nexo que tentam completar um cenário insano. Objetos bizarros, cadáveres de pequenas criaturas, frascos e ferramentas encontram-se jogadas por todos os lados. O caos reina soberano.

O cheiro, podre e pestilento, exala do piche escuro que cobre o chão. Uma pilha de peles e carcaças secas forma uma estrutura similar a uma cama. Ao lado dela, uma penteadeira de madeira, com um espelho trincado, é o único móvel real desse "quarto".

Ela cantarola um ritmo alegre e infantil, enquanto mexe em várias coisas simultaneamente. Seus pés descalços estão cobertos de uma espécie de sangue escuro e viscoso; suas roupas, sujas, se parecem com os painéis de tecido negro espalhados pela caverna. Seu cabelo é ruivo em tons intensos de laranja quente, enquanto os olhos, enormes e sem pupila, são de um poderoso azul gélido. Sua pele é de uma cor cinzenta, arroxeada, como hematomas antigos...

Um zumbido agudo interrompe a canção. A mosca enorme entra na caverna e a garota a pega no ar, com um salto, entre as duas mãos. Ela aproxima sua prisioneira de um dos ouvidos e repete o que ela lhe diz:

_ Hm... Meus bichos que fugiram... Aham... Eles fizeram maldades! Oh... Sim... A Ecclesia! Ah! Hm... Entendi... Ele estava lá?! Uhum... _ Ela finalmente solta a mosca que se afasta rapidamente.

Passando as mãos imundas no próprio rosto, ela emite gemidos enquanto se aproxima da penteadeira. Encarando-se no espelho, ela diz:

_ Oh não! Edisia deixou os bichos fugirem, aí eles causaram problemas pra um pessoal chato e aí a Ecclesia apareceu! Ohhh não! Mas Edisia cometeu só um errinhozinho, de nada, quase sem importância! _ Sua expressão muda subitamente para perfeito desespero _ Mas e se eles me encontrarem??!! Vai ser o fim de Edisia! _ Ela volta a sorrir _ Mas não tem como eles me encontrarem! Eles são burros e fedidos! Humanos burros e fedidos! Edisia não! Edisia é a maior e mais poderosa de todas as BRUXAS!... Em treinamento! Hehehehe...! _ Ela faz uma pausa e morde os lábios _ Ainda bem que mataram os meus bichos... Vou ter que tomar cuidado nas próximas vezes, sim, sim, Edisia é uma menina cuidadosa e dedicada!

Ela se afasta do espelho e dança sozinha, enquanto volta a cantarolar a mesma música de antes, mas agora com sua letra irracional: "Eu ainda não sei, mas ainda estou viva! Eu sou Edisia! E vou mataaaaar!"...

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