⑬ Clan - Parte 1

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Hey!

Eu sei, eu sei. Eu sumi, e não vou entediar vocês com desculpas. A verdade é que a vida ficou corrida e minha criatividade resolveu não cooperar. MAS! Aqui vai mais um capítulo, e não vai demorar tanto para postar o próximo, já que o que eu pretendia postar acabou tendo que ser dividido no meio – eu gosto de capítulos grandes, mas 100 mil palavras já é demais.

Enfim, boa leitura!

- A natureza subjugada de um paciente de instabilidade mental, é melhor compreendida e, arrisco dizer, ordinária – quando desconstruída de sua ordem anarquista e deteriorada em padrões. Ainda que pitoresco, em meus métodos, sou apenas um mero mecânico. Lubrificando engrenagens, reconectando ou cortando fios; fazendo o necessário para manter os pregos e parafusos no lugar.

A franqueza foi mais do que bem-vinda naquela conversa. Toda a complexidade do tema exigia uma atenção maior do que a mera escolha de palavras, golpes mais baixos de franqueza ou outros que seriam basicamente um tapinha nas costas digno de pena. Sinceridade é sempre um elemento a se invejar em sessões de terapia, o que é estranho de se pensar, pelo menos em um ambiente comum. O que não era a ocasião.

Aquela reserva era tão ferrada em combate, que até os psicólogos e analistas tinham seus próprios traumas para lidar com outros doutores ainda mais ferrados do que eles. Era uma bola de neve sem fim, e no meio de tudo, alguma coisa muito sombria podia acabar escapando de vista.

Tudo o que os dois faziam escapava da ditadura de regras rigorosas, locais de encontro, duração de sessões ou até, a maneira com que ficavam lado a lado. Mais próximos do que uma mesa de madeira poderia permitir na saleta em que costumavam se encontrar. O sol brilhava no céu, o toque quente amenizado pelo vento do verão no hospital da reserva. Soldados iam e voltavam vestindo fardas verde musgo, alguns ainda com seu pequeno chapéu entortado na cabeça, outros grunhiam alto o suficiente para ouvirem dali. Seus corpos descansados em macas, a cor de sangue destacada na grama verde enquanto outros enfermos já tratados aproveitavam o rápido banho de sol com olhares distantes, alguns deles saíram do acampamento com passos orgulhosos e voltaram sem as duas pernas.

Todos eles conectados como o tronco grosso de uma grande árvore, cheia de galhos. Pensando na guerra; na batalha perdida de onde vieram, nos corpos que sobraram de suas divisões. Seus amigos mortos e como sua humanidade havia ficado perdida entre as cápsulas vazias e poças de sangue em algum lugar por aí. Era mais comum encontrar alguém chorando em um belo dia como aquele do que ver um sorriso aliviado pelo milagre da sobrevivência.

Porque, a verdade seja dita, o "milagre" que os tirou da linha de uma bala ou do alcance de uma explosão foi a sentença de outro ao seu redor. E viver com a falsa culpa de ter escapado respirando, podia ser muito pior do que as coisas que tiveram de fazer para retornar daquele jeito. Em suas formas defeituosas, com novas cicatrizes, novos mortos, novos fantasmas.

Bastava apenas olhar para saber que todos eles estavam pensando na guerra mais silenciosa que já poderiam testemunhar, e ela era vivida naquele momento, longe de balas, do cheiro de carne queimada, de terra ou pólvora, dos gritos desorientados das linhas de frente. Do caos organizado de um avanço nas trincheiras. Do último reluzir de vida nos olhos de alguém, desfrutando da última batida de seu coração. Ali, em segurança, era onde se podia finalmente perceber que uma possível "liberação de serviço por inaptidão" era nada mais do que uma série de palavras bonitas, mascarando a verdade de que todos eles foram usados e descartados. Nada mais.

O que resta a uma marionete depois que os cordões foram partidos? Mais ninguém para rir de suas artimanhas, para parabenizar por sua obediência completa. As luzes se apagam, o espetáculo morre junto com o senso de dever e objetivo.

FINITUSOnde histórias criam vida. Descubra agora