Mil novecentos e trinta e sete, Alemanha nazista.
Lucas e seu pai, Adam, estavam juntos nos arredores de um campo de concentração abandonado. Pescavam calmamente em no lago de água barrenta, sentindo o sol em seus corpos, ouvindo o assobiar de passarinhos pela floresta ao redor. O mais velho se sentia muito bem naquela manhã, seus cabelos curtos e sedosos balançavam no vento, alguns cabelos brancos, não havia mais dor ao respirar como no dia anterior, a batalha que lutou contra a tuberculose finalmente estava no fim e seu filho, Lucas, estava bem ali. Pronto para ajudar se precisasse.
O rapaz de dezesseis estava concentrado, uma grande ruga atravessando a testa, dedos apertados demais na vara de pescar. O pé direito batendo na pedra pequena logo em frente ao tronco de madeira em que estava sentado, seu pai o olhava por algum tempo, ter pressa era inútil naquela situação e Lucas nunca entendeu os seus motivos de estar sempre calmo. Era inquieto, inconsequente, jamais pensava antes de agir até que estivesse com problemas e precisasse de ajuda.
Ele era o tipo de homem que trazia admiradores por todo lugar que andasse, que chamava a atenção em seus mais despretensiosos passos, ambicioso e firme de si, completamente ciente do que estava ao seu alcance e o que conseguiria com um empurrãozinho a mais. Ia deixar sua marca no mundo de uma maneira tão profunda que faria todos esquecerem que antes existiu outra escolha. Logo aceitando o inevitável e repetindo suas palavras como as escrituras de uma bíblia. Não era nada do que Lexa tinha imaginado, tinha um corpo esguio, pele pálida, um nariz grande, rosto oval e magro de bochechas fundas. O cabelo era preto e curto do chapéu Fedora, de veludo penteado, uma tira de ceda e abas curtas, orelhas pontudas e a barba rasa manchava seu maxilar com um toque suave de cinza. Não usava roupas chamativas demais, o típico camaleão daquela década que só se destaca quando os planos viram realidade. Uma camisa branca de algodão, suspensórios e gravata longa preta, calças escuras de cintura alta, sapatos branco e pretos lustrados e um relógio prata no pulso esquerdo. Os dedos eram magros e longos de unhas levemente avermelhadas sobre o tampo da mesa, olhos pretos como os cabelos.
Adam mantinha o paletó do terno preto sobre a pedra vizinha, a camisa preta tinha mangas arregaçadas e mostrava as cicatrizes espalhadas por seus braços das torturas que sofreu. O cabelo penteado desaparecia abaixo da cartola, sua bengala de cabo prata descansava em cima da peça de roupa, gravata borboleta elegante no pescoço, barba aparada e aliança arranhada na mão esquerda. Os nós dos dedos feridos do interrogatório de mais cedo. Postura tão reta quanto as árvores mais altas ao redor, os olhos não olhavam para o lago mais do que o suficiente e sua calma era fria, quase desumana. Ele tomava aquele silêncio para meditar.
Havia algo errado, mas não estava claro o que. O primeiro peixe foi tirado da água, pequeno, pouco maior que um polegar e colocado na pequena cesta ao lado de Lucas. Adam pescou o segundo e terceiro, peixes maiores e mais pesados. Lucas tirou o quarto da água, do tamanho de seu antebraço e com escamas esverdeadas. Os dois decidiram que era o suficiente e guardaram os anzóis, caminharam lado a lado no caminho de grama verde carregando cestas e varas, passaram além das grades velhas e buscaram a única mesa inteira nos destroços do prédio vizinho a câmara de gás. A colocando de pé no centro do ambiente e se sentando em um par de cadeiras velhas.
As paredes eram de concreto correido e um vivo tom de cobre, o cheiro de ferrugem era parecido com o de sangue, chão úmido da chuva que escapou entre os buracos, folhas carregadas pelo vento da entrada até ali, teias se acumulando nos cantos e uma pilha de ossos humanos que simplesmente não pareciam tão velhos assim. Abriram suas cestas, sacaram facas e limparam os peixes facilmente, fatiando suas escamas para joga-las fora e comer os animais crus começando por suas cabeças. O som da pele clara e úmida envolta em olho natural se fez ouvir, as fibras eram cortadas como pedaços de uma maça saborosa e jogadas para o interior de suas bocas. Logo sendo engolidas. Lucas saiu para buscar uma garrafa de vinho tinto e dois copos, voltando para servir a si mesmo e o pai. Ambos saboreando o gosto envelhecido de uma safra antiga, quase da mesma idade que Adam.

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FINITUS
FanfictionTudo levou àquilo. As perdas, as derrotas, amarguras e feridas. Manhãs calmas se tornaram em caos no campo de batalha, o brilho das estrelas em fagulhas vindas de uma explosão. Um sorriso puro foi uma breve despedida, desde o primeiro nome escrito n...