05. Está teimando?

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Eu estava sentada no sofá da minha sala, repassando tudo que falaria para o diretor amanhã.

Eu não podia ficar com um aluno do mesmo ano que eu. Isso complicaria muito os meus estudos e a minha agenda. E além disso, ainda precisava conversar sobre o baile de boas vindas.

— O que está fazendo aí sentada? Não vai se arrumar? — Ouvi Larry se aproximar de mim, com uma expressão nada agradável. O garoto vestia um terno preto tão formal que me perguntei se estava indo para uma reunião de negócios. Se bem que o relacionamento de Anne e Larry era basicamente isso, negócios. — Você se esqueceu que Anne está vindo? Devo lembrá-la o que falei hoje mais cedo?

— Estou organizando coisas importantes para amanhã. — Declarei, sem encarar aquela cara feia. — Não sei se terminarei a tempo do jantar.

— Você dá conta disso depois. — Larry puxou os papéis de minhas mãos e agarrou meu braço me puxando para as escadas. — Vai trocar essa roupa e ajeitar o cabelo. — O menino me deixou no primeiro degrau da escadaria e saiu andando em direção a cozinha, aonde o escutei berrando com alguns funcionários.

Não entendo porque tudo tinha que sair perfeito sendo que já estavam noivos. Anne e a família dela já nos encontraram diversas vezes, e toda vez que esses encontros acontecem, minha família quer que tudo seja impecável.

Acontece que ninguém é perfeito o tempo todo. Como Anne e Larry passariam o resto da vida juntos sendo que nem se conhecem direito? Ambos só conhecem a parte perfeita um do outro, pois é a única que fazem questão de mostrar. Como vão lidar com a parte imperfeita se nem a conhecem?

Eu não costumava acreditar muito no amor, pois se até o oxigênio, que é o que nos mantém vivos, nos mata e nos corrói aos poucos, por que o amor seria diferente?

O Amor para mim, é algo momentâneo e superficial. Pois uma hora você diz amar alguém, depois, diz sentir borboletas por uma outra pessoa, e mais tarde, acaba sendo magoado por quem jurou ser o amor da sua vida. Ou seja, não se pode confiar em um sentimento tão instável. Pois ao mesmo tempo que ele te leva as nuvens, te afunda em um tenebroso oceano em questão de segundos. E digamos que eu não tenha por perto os melhores exemplos de amor.

Quando terminei de me arrumar, encarei o meu reflexo no enorme espelho. Estava usando um vestido preto de alça, que era rodado da cintura até os joelhos e um tênis branco da Puma. Preenchi os meus dedos com diversos anéis, coloquei um brinco com uma pedrinha brilhante e um cordão que fazia par com os brincos. Respirei fundo e me preparei para a farsa perfeita que minha família fazia questão de continuar. Se bem que não posso criticá-los, eu também me forçava a ser perfeita o tempo inteiro.

— Está pronta Mya? Eles chegam em dez minutos! — Escutei Larry gritar do primeiro andar.

Abri a porta de meu quarto, me deparando com o menino com um semblante sério e ansioso.

— Como você subiu tão rápido assim? — Perguntei perplexa, enquanto ele analisava minha roupa.

— Tire os tênis. Prefiro que coloque um salto. — Ele ajeitou o meu cordão que estava torto e depois voltou sua atenção para o meu rosto.

— Sinto muito. — Declarei, saindo do quarto e batendo a porta. — Não vou trocar o meu tênis porque você prefere um salto. Estou perfeitamente confortável assim. — Passei pelo menino, ignorando o seu olhar desafiador.

— Vamos ver o que o papai acha disso. — Falou, me fazendo parar de andar no mesmo instante. Virei para o garoto contemplando o seu olhar vitorioso. — Acredito que ele perderá o pouco de respeito que tem por você.

— O que você ganha com isso? — Cruzei os meus braços, ainda encarando seu rosto, tentando não baixar a minha guarda.

— Continuo sendo o melhor. — Sorriu de canto, se aproximando aos poucos de mim.

— Só isso? Tenho a certeza que continuará sendo por muitos anos. — Descruzei os braços, caminhando em direção a sala de jantar novamente, ignorando todos os argumentos que ele tentava levantar no meio do caminho.

Por mais que eu não estivesse demonstrando o medo que Larry me fez sentir com aquela única frase, ele ainda estava dentro de mim.

Acho que uma das conquistas que mais desejo, é o sorriso orgulhoso do meu pai para mim. Eu ainda quero muito conquistar isso. Mas com o meu querido irmão tentando sempre estragar tudo, talvez eu nunca consiga.

Me lembro de uma vez que eu cheguei em casa com uma medalha de prata das olimpíadas de matemática. Eu era tão pequena, mas aquilo me abalou tanto pois quando meu pai estava prestes a me parabenizar, meu irmão que estava ao seu lado, declarou que havia ganhado uma de ouro por três anos consecutivos e que a minha não significava nada. Passei os anos seguintes me matando para conseguir superar ele.

Assim que eu entrei pelas portas da sala de jantar, pude ver meus pais em um total silêncio. Parecia até que eram totalmente desconhecidos.

— Boa noite. — Fiz uma rápida reverência com a cabeça e me sentei na primeira cadeira que vi.

O meu objetivo naquela noite era sentar, aproveitar a comida, segurar a minha língua e depois voltar para o meu quarto onde eu voltaria aos meus compromissos.

— Por que não coloca um salto, minha filha? — Minha mãe declarou, folheando um livro.

— Estou confortável assim, mamãe. — Respirei fundo quando notei o sorriso nos lábios de Larry.

— Mas às vezes a beleza requer um esforço. Vá trocar, por favor. — Por um momento, me perguntei se aquele estava sendo um dia para testar a minha paciência. Para testar até onde eu aguentaria de boca fechada.

Felizmente, eu estava sendo forte.

— Eu estou me sentindo bem assim. — Senti um arrepio subir pela minha espinha quando os meus pais focaram seus olhos em mim. Meu pai que estava concentrado em seu jornal, o colocou sobre a mesa e cruzou os braços, minha mãe fechou o livro e ajeitou os óculos.

— Está teimando? — Perguntou ela.

— Não mamãe, eu só... — Antes que eu pudesse terminar de falar, o homem mais velho me interrompeu.

— Sua mãe não pediu para que trocasse? — Assenti, abaixando a cabeça por ouvir aquela voz firme e ensurdecedora. — Faça conforme ela ordenou.

Sua voz costumava ser muito ensurdecedora para mim. Era como uma tempestade que afundava o meu pequeno barco. Como um grito tão alto que agitava cada vez mais as ondas e calava cada vez mais a minha alma.

Ele tinha o poder de me fazer calar. Ninguém deveria ter esse poder sobre o outro.

Ninguém deveria ter o direito de te fazer calar e temer com a presença dele.

— Tudo bem. — Ergui a minha cabeça, e me levantei da cadeira, sentindo as minhas mãos trêmulas, os meus pés bambos...

E o meu coração pesado.

A Maior Conquista: O AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora