▯Memórias felizes em um quadro▯

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...

-Entendo. -Começo a subir ainda admirando os quadros distintos. -Ela tem um bom olho para arte.

-Ela costuma ficar entediada facilmente por isso pinta quadros, e atazana seu pai de montão para dar as melhores tintas. -Ele diz erguendo os braços, expressivo.

-Mas ela disse que mandaria alguém pintar um quadro meu. -Lembro-me.

-Ela tem certa timidez em assumir que é uma artista, e que em seu tempo livre pinta gigantescos ou pequenos quadros com as pessoas que gosta.

-Uau. Ela deveria se vangloriar por ser boa assim. -Digo entrando em um corredor com algumas portas bonitas.

-O seu é a penúltima porta com uma placa escrito "Pedra vermelha" -Ele aponta, e caminho até o local.

-Vai dormir aqui também? Ou tem seu quarto? -Pergunto tirando-o de meu ombro.

-A dona do quarto não me deixa entrar, na verdade ela não deixa ninguém. -Ele coça o chifre meio confuso. -Boa sorte se ela descobrir. -Ele sai saltitante pelo corredor e logo some nas escadas.

Abro a porta e entro no recinto que está parcialmente escuro, se não fosse pela luz vermelha que adentra as janelas, acendo a luz. O quarto é grande, tem uma cama branca com detalhes pratas nos lençóis, o tapete preto e redondo toma quase todo o local, há uma cômoda cinza, e uma escrivaninha ao lado da cama, combinando com a mesma, a cabeceira da cama parece moderna e é repleta de livros, Whisky's, e pedras de energia. Olho para as paredes, são quatro ao total, duas brancas e duas pretas foscas, e então me deparo com o quadro que Naamah havia dito. Lindo e sentimental. Se trata de Elis, sentada sobre um balanço pequeno, atrás dela há um jardim vivo, bonito e detalhadamente pintado com cores fortes. Mas o mais interessante é sua expressão, que carrega um sorriso sincero, branco e exorbitante, de tirar o ar, seus olhos são vermelhos intensos, quase se fecham pelo sorriso grande, seus cabelos grandes e escuros dançam no vento paralisado da imagem, suas mãos seguram seus joelhos dobrados próximos ao corpo, como uma criança feliz. Seu vestido vermelho escuro não a deixa diabólica, muito pelo contrário, a faz parecer um ser de amor, algo como uma fada, cupido ou dona da natureza. Meus olhos se prendem na imagem, me pego perdido nos infinitos detalhes, cada pincelada que gravou algo tão raro vindo do demônio. Um sorriso grande e sincero, um momento feliz.

Há quanto tempo não me sinto assim? Feliz...

Depois de minutos longos observando a obra, me desfaço das roupas e caminho até o banheiro, notando por fim que o cheiro de Elis está presente em todos os cômodos. Sua essência transita por cada lacuna de parede, tudo lembra ela. Tudo me deixa aturdido nas lembranças. Eu preciso dela...

-Não seja tolo, Daenmon. -Dou risada. -Ela deve estar brava com você. -Sussurro para mim mesmo.

Termino o banho, me visto e sento sobre o banco em frente a grande janela, dava para ver a porta que entrei ao longe, a escada lamacenta, os pecadores se arrastando dentro do rio, os demônios transitando para dos cantos, tudo. Inclusive o céu estranhamente bonito e vermelho, parecia um grande véu repleto de nuvens cinzas claras desenhadas sobre ele. Decido por fim dormir, me deito na cama de forma acanhada, talvez Elis não goste que invadam seu quarto, e aqui estou eu, tomando banho em seu banheiro e deitando em sua cama. Acabo ignorando a sensação de desconforto e caio em sono profundo. E é estranho como não tenho tanta dificuldade para dormir, mesmo sendo um demônio.

Acordo durante a noite, com o mesmo pesadelo de sempre, meu rosto estava suado e minhas mãos trêmulas. Eu estou farto de sonhar que alguém morre, ou que tentam tirar Elis de mim. E eu nem sequer a tenho. 

Chasing The SecretOnde histórias criam vida. Descubra agora